Críticas de Cinema abrem o jogo sobre as reações hostis do público masculino

Por Nathan Nunes

A crítica de cinema sempre foi marcada por mulheres, como Susan Sontag, Pauline Kael e Maya Deren, por exemplo. No entanto, nenhuma dessas profissionais teve que lidar com a onda de ataques virtuais que as críticas e comunicadoras de cinema da atualidade enfrentam diariamente, como aconteceu com a influenciadora Carol Moreira. 

No mês passado, uma discussão tomou conta da comunidade cinéfila no X, antigo Twitter, quando viralizou o trecho de um vídeo de Carol falando sobre o filme Assassinos da Lua das Flores, dirigido por Martin Scorsese. No trecho, ela sugere que o filme poderia ter sido estendido no formato de uma minissérie, o que imediatamente gerou uma série de controvérsias, incluindo a maneira como a influenciadora foi tratada pelos internautas.

Para Raissa Ferreira, editora e crítica de Cinema da Revista Singular, não é de hoje que existe um desnível na maneira como a internet reage às opiniões de mulheres sobre a Sétima Arte. “As bobagens que um homem fala nem sempre sofrem as mesmas consequências que quando uma mulher erra.”

“Às vezes, basta não gostar de um filme ou discordar de um ponto específico que já chegam os ataques. Nem sempre a gente tem certeza absoluta que é por ser mulher, mas sempre sentimos que algo passou de um limite, ou nos perguntamos se essa pessoa faria o mesmo com um homem. É o clássico da vida, não muda muito no cinema,” complementa Raissa. 

Maitê Mendonça, jornalista de Cinema e dona do blog Final Girl, oferece um panorama parecido. “Se um crítico dá uma opinião negativa sobre um filme, o público masculino costuma aceitar melhor. Se uma crítica de cinema fala a mesma coisa, sempre aparecerá alguém para te contestar, muitas vezes até mesmo com um tom violento. E isso não acontece somente em relação aos filmes. Se mulheres emitem uma opinião sobre diretores muito amados pelo público masculino, mesmo que você ofereça fatos, a tendência é que você seja atacada.”

Para Maitê, as raízes desse problema são maiores. “Existe deliberadamente uma cultura de ódio na internet contra conteúdos produzidos sobre diretoras, atrizes, etc. Uma parcela do público vê esse tipo de conteúdo como uma ameaça ‘feminista’. Isso me deixa estarrecida, pois creio que diretoras, independente de seu gênero, merecem ter o mesmo espaço.”

Dois pesos, duas medidas

Fabiana Lima, dona do perfil Cinemafilia no Instagram e membra da Critic’s Choice Association (CCA), relata experiências na mesma linha de Maitê e Raissa. “Recentemente, me xingaram por eu ter falado sobre separar a obra do artista, uma opinião que não é tão impopular dentro de quem estuda a crítica [de Cinema]. Mas, por ter vindo de mim, fica mais fácil julgar, apontar, dizer que minha opinião não tem embasamento e terminar num tom muito misógino”. 

Fabiana também reconta as reações de homens a alguns de seus textos, em especial o do filme Blonde. “Lembro de terem falado que eu estava sendo muito moralista, sendo que minha análise partiu de um viés feminista. [O texto] Foi visto por alguns homens como se fosse uma outra coisa, como se eu não tivesse entendido a visão do diretor e coisas parecidas. Na verdade, quando esse assunto [a opinião de uma mulher] é posto em voga, eles acabam tendo uma opinião mais reativa.” 

“Acho isso muito triste. Se a gente estivesse mais acostumado a ler críticas vindas de mulheres, não tenho dúvidas de que estaríamos mais acostumados a vê-las como uma análise também técnica, e não só de achismo”, complementa Fabiana. 

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