A censura ao livro O avesso da pele, de Jeferson Tenório, evidencia comportamento conservador e recorrente com relação às obras literárias

Por Ana Gabriela Bezerra

Patrícia Nasralla, professora de literatura no ensino médio (Foto: arquivo pessoal)

Laureado com prêmio Jabuti em 2021, a obra O avesso da pele foi censurada no último mês de março em alguns estados brasileiros, como Paraná, Goiás e Mato Grosso do Sul. O fato ocorreu após uma diretora de escola pública do Rio Grande do Sul postar um vídeo em suas redes sociais em que alegava “vocabulário de tão baixo nível”, julgando o livro inadequado para estudantes do ensino médio. A repercussão gerada trouxe à luz o debate sobre a censura às obras literárias, mesmo em um país onde o hábito da leitura não é tão difundido.

Além da obra do escritor gaúcho, recentemente outros livros entraram na mira da censura moral como, por exemplo, os títulos Laranja Mecânica, de Anthony Burgess, A química entre nós, de Larry Young e Brian Alexander e Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios, de Marçal Aquino. Todos com a justificativa de inadequação das faixas etárias e incompatibilidade com o contexto educacional.

Para Patrícia Nasralla, professora de Literatura do ensino médio, “a questão da censura de algumas obras literárias fez, faz e fará parte do nosso contexto sempre, principalmente, na atualidade devido ao grande número de informações e a facilidade de divulgação e manipulação de notícias”.

Ela explica também que “a maior função da Literatura é fornecer leitura de mundo. Sem ela, somos analfabetos humanos. Por meio dela, conhecemos, analisamos e refletimos sobre o mundo em que vivemos, conhecemos a base histórica de nossa e de outras culturas, compreendemos, profundamente o ser humano e o espaço que ele vive”.

Para Henrique Rodrigues, autor de livros e doutor em Literatura pela PUC-RJ, não há dificuldade na abordagem de temas em suas obras “Como autor, eu não tenho nenhum problema em relação ao que escrevo. Naturalmente, se escrevo um livro para crianças vou me adequar a elas e ao seu universo. Para jovens e adultos já é outra coisa. Escritor não pode se autocensurar”.

A dificuldade em sala de aula para abordar determinados assuntos com os alunos já é diferente de temas relacionados à morte e sexualidade, por exemplo. “Imagine falar sobre suicidio numa sala de aula em que um aluno perdeu um membro da família dessa forma. Ainda assim, seria justo não abordar temáticas tão essenciais e polêmicas da vida?”, pergunta Patrícia Nasralla.

“A sexualidade, por exemplo, num contexto de sala de aula em que grande parte dos alunos pertence a religiões com características mais rígidas, torna-se algo extremamente desconfortável. Além dos questionamentos, muitos julgam como desnecessário aquele conteúdo por não colaborar com o pensamento religioso moral de cada um”, completa ela.

O escritor e doutor em Literatura pela PUC-RJ Henrique Rodrigues (Foto: Divulgação)

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