Apesar da venda online de livros superar a das lojas físicas, livrarias de rua, como os sebos, continuam a atrair a atenção dos leitores
Por: Carlos Martins
Pela primeira vez, o comércio digital de livros no Brasil superou as vendas em livrarias físicas. A pesquisa “Produção e Vendas do Setor Editorial Brasileiro”, fruto de uma parceria entre o Sindicato Nacional de Editores de Livros (SNEL), a Câmara Brasileira do Livro (CBL), e com apuração da empresa de mensuração de dados Nielsen BookData, aponta que, no ano passado, o meio virtual vendeu mais livros que o físico, sendo responsável por 35,2% do faturamento das editoras, porcentagem nunca antes maior do que o faturamento proporcionado pelas livrarias e lojas físicas.
Além disso, os processos de recuperação judicial em que se encontram grandes livrarias como a Saraiva e Cultura e a falência decretada em 2018 da Livraria Laselva, outra gigante do ramo, evidenciam uma tendência dos consumidores brasileiros de, cada vez mais, comprarem seus livros pela internet.
Em contrapartida, os sebos ainda se fazem presentes nas cidades brasileiras, e a própria existência deles contrasta com as tendências de consumo nesse mercado. Qual é o motivo deles resistirem? O que leva as pessoas até esses lugares, apesar da praticidade e da certeza que a compra pela internet proporciona? Como são esses espaços?
Aracéli Carvalho é uma frequentadora assídua dos sebos da cidade. Formada em Direito e Letras, ela dá aulas de inglês e se arrisca na escrita de poemas e crônicas em sua página no instagram (@garotachafe). Não é difícil concluir que ela é uma amante da literatura.

Correndo os olhos reflexivos pelas prateleiras de um dos sebos de Bauru, ela diz que o lugar tem uma energia diferente, como se os livros guardassem memórias.
Aracéli usa um livro qualquer, retirado das grandes pilhas em cima de uma mesa, como exemplo para explicar o que os sebos têm de diferente: “O que me traz a um sebo é saber que este livro tem vida. Ele já foi aberto, folheado. Eu sei que é uma lembrança viva, quase como se fosse uma entidade”.
A maioria dos sebos locais está próxima à região do Centro da cidade. Alguns existem há tempos, como o “Super Sebo Avenida” (ou “Sebo do Baú”), que funciona há cerca de 15 anos na quadra 6 da rua Treze de Maio, quase na esquina com a Av. Rodrigues Alves.
Quem passa despercebido pelo Centro pode nem notar a porta estreita do lugar. Porém, um olhar mais atento se encanta com a quantidade de prateleiras lotadas e montes intermináveis de livros que Roberto Bau, o dono do lugar, guarda.
Ele conta que herdou o negócio do pai, famoso proprietário de banca no centro de Bauru durante a década de 90. Sorrindo, Roberto lembra da história e das dificuldades já superadas. Dentre elas, o advento da tecnologia.
“Quando chegou isso (a internet) eu fiquei assustado. Pensei, ‘agora acabou o sebo’, deu medo”. Ele diz, ainda, que foi necessário uma adaptação à era digital para seu estabelecimento sobreviver, e admite: “se não fosse essa ajuda da tecnologia (para auxiliar na divulgação de seu trabalho), o sebo já tinha acabado.”
Roberto é perguntado sobre o motivo que ele acredita ainda levar as pessoas aos sebos. Convicto, ele responde: “eu acredito que aqui você volta no tempo, isso que torna uma coisa gostosa. Não é somente pelos livros (que as pessoas vêm aqui)”, ressaltando a sensação que esse tipo de lugar proporciona aos frequentadores.
Com amor equivalente pelos livros, Reginaldo Furtado abriu há quase três anos (em plena pandemia) “O Livreiro”, sebo localizado na rua Engenheiro Saint Martin, 15-07.

Montado numa garagem alugada, esse sebo é um ambiente singelo e confortável. O espaço se mantém, mais do que tudo, pelo apreço do dono. Segundo o próprio Reginaldo, “o sebo sobrevive porque eu gosto. Eu não tenho relação comercial com os livros. Não dá dinheiro”.
Surge, então, a pergunta: qual o real intuito do lugar se não o lucro? Reginaldo afirma que o objetivo do lugar “é mais para ter um ponto de encontro, fazermos lançamento de livros, se reunir, conversar sobre cultura e literatura”. Ele acredita que as pessoas precisam ler para ter “um mundo melhor”.
Se um chama a atenção pela quantidade e outro pelo aconchego, o “Sebo Espaço Literário” impressiona devido à organização. Localizado na rua Antônio Alves, 11-23, o espaço tem várias prateleiras, que são divididas de forma meticulosa pelo assunto dos livros e por ordem alfabética do sobrenome de seus autores.
A organização do Espaço Literário desfaz, assim, a ideia disseminada de que sebos são lugares que demandam, necessariamente, uma procura longa dos frequentadores para encontrar algum livro desejado. Para os apressados, basta uma rápida consulta no catálogo presente no computador de Mirian Figueiredo, funcionária do lugar há quase cinco anos, para saber se o título procurado encontra-se naqueles corredores.
Mesmo assim, há aqueles que ficam por mais tempo lá dentro. Mirian comenta o que ela acredita ser o motivo desse magnetismo. “Eu acho que é por conta do espaço em si. Porque querendo ou não, é um ambiente muito legal. Uma coisa é você pesquisar os títulos em um site, e outra é você ver tudo que tem na loja. Tem gente que passa horas aqui dentro. Ir ao sebo é uma experiência!”.
Mesmo com os fatos que apontam em escala nacional as inclinações dos consumidores de livros para cada vez mais preferirem a internet, os sebos não parecem perto do fim. Para muitos, representam além de um lugar com prateleiras e livros empilhados. Significam “uma volta no tempo”, um “sentir-se bem”, uma “energia diferente”, um espaço de procura e confraternização dificilmente substituível para os amantes da literatura em suas mais variadas formas.
Conheça os sebos de Bauru:
- O Livreiro, Rua Engenheiro Saint Martin, 15-07 – (14)98814-8195;
- Sebo Espaço Literário, R. Antônio Alves, 11-23 – (14) 3232-6111;
- Super Sebo Avenida (Sebo do Baú), R. Treze de Maio, 6-10 – (14) 99687-9195;
- Hesse Sebo e Livraria, R. Treze de Maio, 12-48, (14) 99905-4199;
- Sebo Online Higino Cultural, R. Minas Gerais, 13-40 – (14) 99667-5793.

Trabalho excelente,completo e educativo, parabéns pela reportagem.
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Parabéns pela reportagem, seu texto bem informativo, parabéns.
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