Batalha Skate Park, consolidada como refúgio e palco do hiphop em Bauru, recebe a decisão de vagas para a final da Semana do Hiphop.
Por: Kethlyn Gonzaga de Oliveira
Sábado, (15), ocorreu a batalha de rima da Bauru Skate Park (BSP) como parte da 13ª edição da Semana do Hiphop de Bauru. O evento foi organizado pela Secretaria de Cultura e Coletivos do município e reuniu diversos artistas, além da apresentação do MC Junin e do DJ RQNT na Praça do Skate, onde os participantes disputaram uma vaga na final da batalha de rimas desta edição.

O espaço destinado para este dia é uma das sedes mais tradicionais de batalhas de rima em Bauru. Este legado se iniciou pela Batalha MD, ao qual não existe mais, mas foi a partir dela que o local se consolidou como propulsor de batalhas e também deu origem a outras, como a BSP e a Batalha da Leste.
“Tudo começou, não foi na Batalha da BSP, foi em outra batalha, uma outra batalha que já não existe mais, mas que hoje em dia formou a Batalha da Leste. Era a Batalha do MD. Nossa, mas há muito tempo atrás, surgiu com outra organização, e aí sim eu conheci mais um pouco o meio da batalha e comecei a me intervir dentro de algumas organizações, começar a entender um pouco mais sobre as batalhas, sobre os MC´s” , explica uma das organizadoras da BSP, Letícia dos Santos Moreno, mais conhecida como Malandra Lê.
“O Lil Hatt foi o criador da Batalha da BSP, só que no decorrer dela já teve vários organizadores. Só que o que acontecia? Entrava e saía, entrava outro, saía, entrava outro, saía. Entendeu? no momento aí tá nós. Nós dois e o Shox” , complementa Luiz Aparecido Nicolau Gonçalves, conhecido como LHK, que compõe a organização da BSP.
Com esta instabilidade na organização a batalha foi deixando de acontecer e foi neste momento que LHK decidiu assumir direção da Bauru Skate Park.
“A BSP ela existia, acho que uns dois anos antes de eu assumir a organização. Mas é o que aconteceu, ela parou de acontecer. E aí foi quando eu e a minha parceira Prada assumimos a organização, tá ligado? Um pouco depois a Letícia entrou comigo e eu entrei com ela na Batalha da Leste. Então a gente organiza as duas juntas hoje, que são as duas pistas. Ano que vem faz três anos já”, explica LHK
A organização da BSP é formada atualmente por Malandra Lê, LHK e Shox. Para eles, é de suma importância que locais públicos, principalmente focados na Zona Sul, sejam preenchidos pela cultura do Hiphop de maneira acessível.
“A praça do skate é um local que, na minha concepção, não pode ficar sem batalha, entende? Por ser a Zona Sul, por ser um espaço que a gente não tem tanta vivência”, afirma LHK.
“A gente viu que dava certo fazer batalha nas pistas de skate, que chamam a atenção porque a gente consegue juntar tanto o skate com o rap, e isso é muito bom. E eu e o Luiz decidimos, já faz, eu acho que vai fazer um ano já, que a gente decidiu ficar tanto na BSP e tanto na Leste, porque são as duas pistas de skate que mais tem, vamos dizer, uma acessibilidade das pessoas irem”, complementa Malandra Lê.

Os organizadores da BSP enxergam o rap como um transformador social. Para eles, as batalhas são um local de acolhimento, identificação e pertencimento para as pessoas.
“Às vezes você nem conhece o cara, você nunca viu… Ou a mina, você nunca viu na sua vida e ela tá ali rimando e fala um bagulho que, tipo, te aconteceu, tá ligado? Ou aconteceu com alguém próximo que você já presenciou e, isso arrepia a pele de um jeito, mano, que você é louco.Na hora ali, você não quer saber de mais nada. Você só quer saber de hip hop, parça. Só quer saber disso”, afirma LHK.
“ É, essa fita aí. Porque assim, desde novo eu curto o rap. Eu vim de uma família que não curtia, então já é meio assim, entendeu? E quando eu comecei a colar, mano, eu me senti muito acolhido. E em batalha, ver os caras se matando, tipo, sem remuneração, tá ligado? Eles só vão ganhar uma folhinha e o respeito de quem tá presente. Mano, pra mim se isso não é Deus, eu não sei o que é. Então pra mim é isso”, continua.
“Eu me encontrei no rap. Eu me encontrei no meio do movimento, eu gosto muito de fazer poesias, eu sempre gostei muito de apresentar, sempre gostei de escutar o próximo também. E o que me fez isso foi ver que não é só eu que tô lutando por um sonho. Tem outras pessoas que estão lutando ali também. Então é isso que me mantém ali toda vez querendo fazer a batalha”, diz Malandra Lê.
Para manter a BSP em circulação de forma contínua e acessível, os organizadores encaixam a produção das batalhas de rima nos intervalos possíveis de suas rotinas pessoais, porém nem sempre conseguem equilibrar essas diferentes funções.
“Nós somos seres humanos também, então é trampo, tem a nossa família pra cuidar, entende? Às vezes levar um sustento. Então, equilibrar tudo isso é muito difícil. Surgir um tempo pra fazer um flyer, para postar uma foto, pra movimentar uma página, tá ligado? É muito difícil”, afirma LHK.
“Ainda mais quando está em três pessoas. É um pouco complicado. Às vezes a gente atrasa, a gente até pede desculpa às vezes no Instagram pelos atrasos de fotos, porque a semana às vezes passa tão corrida de trabalho, de foco, que você não consegue ligar na rede social“, complementa Malandra Lê.
A dificuldade em conciliar responsabilidades muitas vezes gera um sentimento de culpa pela falta de regularidade, porém essa pressão está longe de interromper o trabalho. Pelo contrário, o esforço coletivo acaba trazendo gratificação e fortalecendo os laços entre os envolvidos.
“A gente até às vezes se culpa, né? A gente fala, tipo, ‘nossa, a gente não postou pro pessoal quem foi o ganhador’. Mas é por conta, realmente, eu acho que a parte mais complicada é organizar em três pessoas. Mas, ao mesmo tempo, é uma parte gratificante, porque a gente sabe que os três sempre podem se contar”, diz Malandra Lê.
“A Prefeitura nunca apoiou…nunca vi ninguém vir aqui, nunca vi nem prefeito vir aqui perguntar alguma coisa, nem menos um vereador vir aqui perguntar alguma coisa para a batalha”- Malandra Lê.
Esses desafios e dificuldades não se limitam à organização da BSP. Segundo Malandra Lê, há falta de apoio e estímulo por parte da prefeitura não apenas ao rap, mas a todos os cinco elementos do hip-hop.
“A Prefeitura nunca apoiou. Infelizmente, é uma grande realidade e eu acho que nem só a Prefeitura, o governo total em si nunca apoiou, principalmente o movimento, principalmente os cinco elementos. Eles passam um pano, vamos dizer, uma taxada para fingir que apoiam. Mas eles nunca apoiaram, nunca vi ninguém vir aqui, nunca vi nem prefeito vir aqui perguntar alguma coisa, nem ao menos um vereador vir aqui perguntar alguma coisa para a batalha, se a batalha precisa de um som, se a batalha precisa de algum apoio da Prefeitura. Nunca vieram mesmo”, diz.
“Eu acho que, se vier um apoio, não vai ser um bagulho de coração, tá ligado? Porque eles não estão pelo rap”, complementa LHK
“Mano, um bagulho que eu sempre brisei fazer é nas favelas de Bauru. Levar em lugares onde não tem rap”- LHK.
Mesmo diante de obstáculos internos e externos, a Batalha Skate Park segue ativa. Para os organizadores, o rap produzido nas batalhas da BSP é uma forma direta de expressar a realidade do território, um espaço que, para muitos, se tornou um refúgio.
“O hip hop e a rima falam muito sobre verdades, né? Já começa por aí. Eu acho que tem essa sinceridade, essa realidade do mundo que as pessoas tentam muito esconder no dia a dia. Não é uma coisa de fachada, não é só felicidade, não é só alegria. A gente fala também das dores e da tristeza e respeita as dores e a tristeza do outro”, afirma Malandra Lê.
“Como eu posso dizer, é um lugar que, por exemplo, mesmo que a semana toda seja puxada, eu tô ligado que eu vou colar aqui e vai amenizar, entendeu? É o refúgio”, completa LHK.
Para o futuro, segundo os organizadores, a BSP tende a se expandir para locais periféricos de Bauru.
“Mano, um bagulho que eu sempre brisei fazer é nas favelas de Bauru. Levar em lugares onde não tem rap”, diz LHK.
Eles entendem que há dificuldade de alavancar este projeto, dado que até o momento esta iniciativa será feita sem nenhum apoio institucional, porém isto não os desanima.
“Só que até conseguir um bagulho desse, mano, vai muito tempo, vai muito planejamento. Porque é difícil, tanto para nós quanto para os MCs colarem, entende? Às vezes os caras moram lá na p*ta que pariu e tem que ir para o outro lado da cidade. É um bagulho louco, aperta. Só que o meu foco maior na batalha é isso. Levar para todo lado de Bauru, para Bauru inteira, tá ligado? Nem que seja uma vez por mês em cada bairro, mas é o que eu quero fazer um dia”, continua.
“É levar para os lugares que não têm mesmo edições. Lugares que as pessoas, às vezes, nem conseguem ter um acesso. Não conseguem vir até aqui. Às vezes não conseguem pegar um ônibus. A gente sabe o quanto isso faz uma diferença para uma criança escutar”, conclui Malandra Lê.
As batalhas acontecem na Praça do Skate na rua Araújo leite 37-17 no Mary Dota aos sábados a partir das 20:00.
