Modalidades adaptadas ampliam autonomia, fortalecem vínculos sociais e revelam desigualdades ainda presentes no acesso ao paradesporto no Brasil.
Por: Nina Conrado
A prática do esporte oferece inúmeros benefícios para a saúde mental e física, como redução do risco de contração de doenças, redução de estresse, melhora na aptidão física, liberação de hormônios de bem-estar e muitas outras vantagens para o corpo e a mente. Porém, mais do que um exercício físico, o esporte também é uma significativa ferramenta no que diz respeito à socialização, promoção de desenvolvimento de habilidades socioemocionais e trabalho em equipe. Ele representa um ambiente de convivência, superação dos obstáculos e reconhecimento das suas potencialidades.
Dessa forma, tem-se o esporte como uma poderosa arma para o processo de inclusão social, para populações marginalizadas ou que residem em áreas vulnerabilizadas e especialmente para pessoas que possuem algum tipo de deficiência. O Ministério do Esporte informa que o esporte é uma das “principais vertentes de investimento federal para a inclusão de pessoas com deficiência, com programas que vão desde a iniciação esportiva até o alto rendimento”. Isso porque, para elas, o esporte desempenha uma função transformadora, permitindo que sejam desenvolvidas maior autonomia, autoestima, autoconfiança e senso de correspondência com um grupo.
Segundo o censo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), 7,3% da população com 2 anos ou mais possuem algum tipo de deficiência, o que equivale a aproximadamente 14,4 milhões de pessoas. Mesmo havendo cada vez mais políticas públicas de inclusão como centros de treinamento e projetos comunitários, essa população ainda tem acesso limitado ao trabalho, à educação e ao lazer e, por isso, o esporte se caracteriza como um dos principais expoentes de inclusão social.
O atleta Claudio Massad (40), popularmente conhecido como Claudião, natural de Bauru no interior do estado de São Paulo e medalhista paralímpico na modalidade de tênis de mesa na classe 10, comenta sobre o sentimento de pertencimento que o esporte o proporcionou desde o seu primeiro contato com o tênis de mesa, quando ainda tinha apenas 12 anos de idade. “O esporte sempre me fez sentir parte da comunidade, de um meio. Isso porque o tênis de mesa especificamente acaba sendo um esporte muito democrático, qualquer pessoa pode aprender a jogar bem e ir se desenvolvendo, independente de seu biotipo ou de sua deficiência. Então, desde o começo, já me senti inserido: primeiro no tênis de mesa, mas depois no esporte e na sociedade, também”, relata ele.

Os atletas de paradesporto também enfrentam barreiras estruturais, sociais e econômicas, que afetam diretamente seu desempenho e desenvolvimento e, consequentemente, a possibilidade de continuidade da carreira e de rendimento competitivo. Algumas dessas dificuldades são falta de infraestrutura adequada, baixo investimento, dificuldade de patrocínio, preconceito e alto custo dos equipamentos adequados.
O campeão paralímpico também falou sobre a sua participação nos Jogos Pan-Americanos, nos Jogos Paralímpicos e como as conquistas de suas medalhas (ouro no primeiro e bronze no segundo) impactou em sua vida profissional: “Primeiro pelo aspecto financeiro, pela visibilidade e pelo apoio. Mas também porque a medalha paralímpica traz um grande poder e, consequentemente, uma grande responsabilidade. Responsabilidade de ser exemplo, de ter humildade e ajudar no desenvolvimento da modalidade e das futuras gerações. Essa medalha me deu a missão de alcançar um esporte mais justo”.
O treinador de musculação do Claudião, Fernando Lamonica (41), também deu seu depoimento sob sua perspectiva de profissional de saúde a respeito da importância que o esporte desempenha na vida das pessoas: “O esporte é uma ponte para que as pessoas alcancem seus limites para tentar superá-los. A interação e integração com outras pessoas fazem com que, a pessoa em si, se socialize e viva experiências diferentes”.
Para profissionais da área, o esporte adaptado também desempenha um papel fundamental na mudança de percepções sociais. Ao ocupar espaços públicos, competir em grandes eventos e conquistar resultados expressivos, atletas paralímpicos contribuem para combater o capacitismo. “Já vi pessoas que conseguiram feitos que sequer imaginavam que pudessem alcançar, devido a suas dificuldades e limitações”, explica Fernando.
Nesse sentido, a representatividade se torna um fator decisivo. Cada medalha, vitória e história de superação reverberam além das quadras e alcançam famílias, escolas e comunidades desfavorecidas. O impacto é ainda maior quando esses atletas se engajam em palestras e iniciativas voltadas ao esporte adaptado, como é o caso de Claudião que comenta que frequentemente ministra palestras sobre a sua história na intenção de incentivar e motivar possíveis atletas paralímpicos. “A gente tem que ter fé, resiliência, trabalhar duro e seguir em frente, porque só assim as coisas acontecem e eu sou exemplo disso”, conta o atleta.
A trajetória de atletas como Claudião evidencia como o esporte é capaz de transformar realidades individuais e, ao mesmo tempo, revelar desigualdades que ainda precisam ser enfrentadas.
Nos últimos anos, iniciativas governamentais e projetos independentes têm ampliado o alcance do esporte adaptado no país. O Centro de Treinamento Paralímpico, em São Paulo, tornou-se referência na formação de atletas de alto rendimento e programas comunitários espalhados pelo Brasil oferecem atividades esportivas adaptadas para crianças, jovens e adultos em situação de vulnerabilidade ou com diferentes tipos de deficiência.
Apesar dos avanços, entidades ligadas ao movimento paralímpico destacam que ainda é necessário ampliar o acesso às modalidades, especialmente em regiões periféricas e municípios de menor porte. A descentralização e desvalorização do paradesporto é apontada como um dos principais desafios para que mais pessoas tenham contato com modalidades esportivas como rugby em cadeira de rodas e o próprio tênis de mesa adaptado, por exemplo.
