A trigésima Conferência climática promovida pela ONU tem potencial de ser decisiva quanto a um futuro mais sustentável

Por Maria Clara Buchalla


Com a chegada do segundo semestre de 2025, a atenção dos ambientalistas se volta para o maior evento mundial de discussão sobre mudanças climáticas: a COP 30, que este ano acontecerá aqui no Brasil. 

A trigésima Conferência de Partes das Nações Unidas é, na prática, uma reunião de líderes de estado com pesquisadores e negociadores interessados no clima mundial. De 10 a 21 de novembro, a cidade de Belém será palco de grandes debates e acordos visando entender e controlar as ações humanas que causam as mudanças climáticas. 

A história das COPs teve como peça chave a cidade do Rio de Janeiro, no Brasil. A Rio 92, ou ECO 92, foi uma conferência organizada pela ONU com o objetivo de debater as mudanças climáticas. Baseada na Conferência de Estocolmo — em 1972,  a primeira reunião global de chefes de estado para debater as relações do homem com o meio ambiente —, a RIO 92 deu início a uma tradição de conferências anuais com o compromisso de debater o clima e o mundo. Três anos depois, em 1995, em Berlim, nasce o conceito de Conferência das Partes pelo clima. 

Todo ano, centenas de líderes de governo se reúnem em um local diferente para o evento. A importância singular da 30ª Conferência se dá pelo fato de ela acontecer no meio da Amazônia, levando a discussão climática para um dos principais territórios afetados pela ação antrópica. 

O presidente Luís Inácio Lula da Silva declarou, em seu mais recente discurso na 80ª Assembleia Geral da ONU, que “o ano de 2024 foi o mais quente já registrado. A COP 30, em Belém, será a COP da verdade. Será o momento de os líderes mundiais provarem a seriedade de seu compromisso com o planeta.”

Com isso, espera-se que tais governantes reconheçam as ameaças latentes aos biomas brasileiros, bem como à fauna e flora de todo o mundo, para que as ações humanas que causam esse perigo sejam revogadas, revistas ou adaptadas. As esperanças são de que reconheçam, ao ver na prática as populações residentes na Amazônia, a urgência de atenção ao processo vigente de destruição da natureza. 

“A Amazônia é floresta, mas é floresta com gente dentro: tem quem pesca, quem colhe castanha, quem planta açaí…”

Cristiane Prizibisczki, repórter ambiental do jornal O Eco.

Brasil nas COPs

Normalmente, o Brasil se localiza nas COPs como um dos maiores aliados à causa climática, mas será que as práticas do governo são condizentes? Segundo uma plataforma criada exatamente para isso, a Brasil na COP, “a diferença entre aquilo que nossos governantes falam e o que realmente fazem é abissal. Os governos parecem estar em total sincronia com os chamados urgentes dos cientistas, ativistas e comunidades — no entanto, a realidade é que o mundo continua avançando vertiginosamente para um aumento de temperatura, e tanto os governos quanto as corporações têm feito pouco para enfrentar a maior crise da humanidade”. 

O projeto Brasil na COP usa de exemplo o Fundo Amazônia, iniciativa do segundo mandato Lula em 2008, que visava obter financiamento para prevenir, monitorar e combater o desmatamento, bem como o uso sustentável da Amazônia Legal. Com recursos quase inteiramente noruegueses, o Fundo Amazônia foi citado como exemplo de ação bem-sucedida pela então ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, nas COP 16 (México, 2010), 17 (África do Sul, 2011) e 18 (Catar, 2012). 

Em 2019, porém, o Fundo Amazônia foi paralisado: um decreto do recém eleito Jair Bolsonaro extinguiu os órgãos gestores de recursos e dados. “Em meio à suspensão de pagamentos, a destruição da floresta na Amazônia Legal cresceu 72% apenas nos três primeiros anos do governo Bolsonaro”, diz o site Brasil na COP.

Em 2022, com o fim próximo do governo Bolsonaro, o STF determinou a reativação do Fundo Amazônia. Um dia após a posse de Lula, a Noruega anunciou que voltaria a financiar o projeto. Hoje em dia, ele conta com doações de, ao todo, 4,5 bilhões de reais. 

Exportação e exploração

A Conferência das Partes deste ano será, segundo ambientalistas, território de disputa política por um futuro ecológico. Afinal, vão ser abordados os impactos sociais, históricos e territoriais das mudanças climáticas. Para prever os possíveis debates, é preciso entender o que o Brasil procura e o que tem a oferecer. 

No âmbito das reivindicações, temos a luta por um país soberano, que tenha independência jurídica e econômica para firmar alianças estratégicas sem sofrer sanções internacionais. Já nossa vitrine ao mundo, historicamente, são nossos recursos naturais. Situado como importante engrenagem do sistema capitalista, o Brasil assume a posição de provedor de matérias primas para exportação em larga escala. No ranking das 10 commodities mais exportadas em 2025, a ordem é de:

Soja – 15%

Óleos brutos de petróleo ou minerais crus – 13%

Minério de ferro – 7,5%

Café não torrado – 4,6%

Carne bovina – 3,8%

Celulose – 3,3%

Açúcares e melaços – 3,3%

Óleos combustíveis de petróleo (não-brutos) – 3,3%

Carnes de aves – 2,8%

Farelo de soja e outras rações – 2,7%

Somados, esses dez tipos de produtos ocupam 59,3% das exportações de 2025. Dessas, aproximadamente 35,5% advêm da exploração da terra pela agropecuária. Levando em conta a tradição brasileira da exploração da terra para dar lugar à monocultura e pastagem, é importante investigar de que modo foi obtido o espaço físico no qual estão as grandes propriedades atuais. 

Segundo relatório do projeto MapBiomas, de 1987 a 2020, “mais de 90% das áreas desmatadas na Amazônia tiveram como primeiro uso a pastagem. Dessas, 12% das áreas em 2020 voltaram a ser vegetação nativa, e 8% se apresentaram hoje como agricultura”. 

Nesse sentido, a Empresa Jr. de Geografia da Faculdade de Ciências, Tecnologia e Educação da Unesp Ourinhos produziu alguns gráficos que denotam a supressão da vegetação:

Desde a RIO-92 até a RIO+20:

Gráfico: EMPGEO Unesp Ourinhos

Durante os 20 anos que marcaram a aplicação da agenda global de desenvolvimento sustentável, percebemos certa imobilidade na primeira década, seguida de grandes quedas no desmatamento. Segundo o site oficial da RIO+20, o objetivo do encontro foi “a renovação do compromisso político com o desenvolvimento sustentável, por meio da avaliação do progresso e das lacunas na implementação das decisões adotadas pelas principais cúpulas sobre o assunto e do tratamento de temas novos e emergentes.”

Desde a primeira COP das Nações Unidas, em 1995, até os dias de hoje: 

Gráfico: EMPGEO Unesp Ourinhos

Às vésperas da trigésima Conferência de Partes das Nações Unidas, pode-se notar que, historicamente, o desmatamento da vegetação primária diminuiu consideravelmente. Desde a primeira COP, em Berlim, em 1995, alguns momentos notáveis foram o pico de desmatamento em 2003 e uma grande queda nos anos de 2004-2010 e 2013-2019, tendo um aumento em 2019 — justamente quando o Fundo Amazônia, dentre muitas outras iniciativas de proteção ambiental, foi paralisado. 

É importante notar o detalhe de que, desde o período de colonização das terras brasileiras, o desmatamento é parte fundamental dos processos de ocupação do solo. Contudo, segundo o levantamento geral do desmatamento no país feito pela EMPGEO, os dados da supressão da vegetação começam a existir apenas em 1985, cerca de 480 anos após o início real da exploração da natureza. 

Gráfico: EMPGEO Unesp Ourinhos

A falta de apuração dos dados de desmatamento por tantos séculos pode ser um dos motivos pelos quais, no Brasil, quando se fala de política, a pauta ambiental raramente é posta em prioridade. Isto é, não havia informações o suficiente para interpretarmos o desmatamento como um perigo real, e a consequência disso é a recorrente banalização do assunto. 

O costume brasileiro de não priorizar a discussão ambiental na política é bem refletido na recepção de Marina Silva, historiadora ambientalista vinda do Acre, como candidata à presidência do Brasil. Aliada ao Partido Verde e fundadora do partido Rede Sustentabilidade, cuja maior reivindicação é a proteção de nossas riquezas naturais, Marina foi deixada de lado nas eleições de 2018, após ser fortemente considerada à presidência anos antes: foram mais de 19 milhões de votos em 2010, cerca de 22 milhões de votos em 2014, e apenas 1 milhão em 2018. 

Hoje, como ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima pelo governo federal, Marina Silva critica fortemente o projeto de lei 2.159/2021, chamado de “PL da Devastação”, que foi aprovado pelo Senado por 54 votos a favor e 13 contrários, e na Câmara dos Deputados por 267 votos a favor e 116 votos contra. 

O projeto de lei — chamado pela WWF de “o maior retrocesso na legislação ambiental brasileira dos últimos 40 anos”— modifica a política de licenciamento ambiental no Brasil, possibilitando a autodeclaração de empresas como poluidoras ou não. Assim, empresas de médio impacto podem conseguir uma licença para intervir em solos brasileiros sem passar por qualquer avaliação de órgãos competentes.

De acordo com o ANDES – Sindicato Nacional dos Docentes do Ensino Superior, o PL “abre caminho para o aumento do desmatamento da Mata Atlântica”. Outros veículos afirmam que a redação do Projeto de Lei é simplesmente inconstitucional, afinal, segundo o artigo 225 da Constituição Federal:

“Art. 225º: Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.” 

Mapa geral do desmatamento no Brasil, feito pela EMPGEO Unesp Ourinhos

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva vetou algumas partes do projeto antes que ele fosse completamente posto em prática. 

Segundo o Instituto Socioambiental, um dos importantes vetos de Lula foi sobre a Lei da Mata Atlântica: “a proposta abria brechas para que qualquer município, mesmo sem estrutura técnica, plano diretor ou conselho de meio ambiente, pudesse autorizar o corte de vegetação”. 

Apesar de ter tido partes modificadas pelo presidente, o PL ter sido aprovado já caracteriza uma grande ameaça à homeostase ecológica brasileira por si só. Na prática, essa lei afrouxa a fiscalização de empresas com impacto potencialmente poluidor no Brasil. 

Mineração e terras raras

É importante frisar que não só a agropecuária impacta o clima. Outra pauta relevante a ser abordada na COP 30 deste ano é a mineração brasileira, em especial as chamadas “terras raras”. As terras raras são elementos químicos muito usados na indústria da tecnologia, como na produção de catalisadores, condutores e até carros híbridos. 

Dentre os 17 minerais chamados de terras raras, estão: lantânio, cério, praseodímio, neodímio, promécio, samário, európio, gadolínio, térbio, disprósio, hólmio, érbio, túlio, itérbio, lutécio, escândio e ítrio (Y)

Atrás apenas da China, o Brasil possui a segunda maior reserva mundial de tais minérios, o que resultou no interesse por parte dos Estados Unidos: Donald Trump, atual presidente dos Estados Unidos, mencionou recentemente as terras raras brasileiras como moeda de troca, nas condições de diminuir as tarifas impostas ao Brasil. 

Vale lembrar que, no início do segundo semestre de 2025, Trump determinou a aplicação de impostos de 50% à importação de produtos brasileiros, atitude tomada em defesa de Jair Bolsonaro quanto ao seu julgamento no Supremo Tribunal Federal por tentativa de golpe de Estado em janeiro de 2023. 

A cobiça de Trump sobre os minérios brasileiros tem a ver com o fato de que a economia norte-americana cresce exponencialmente em torno de empresas focadas em tecnologia e informação, as big techs. São elas: Google, Amazon, Apple, Meta, Microsoft, Nvidia e Tesla. Segundo a CNN, “o valor de mercado atual das Sete Magníficas — US$ 18,25 trilhões em 10 de julho de 2025 — equivale a mais de oito vezes o PIB nominal do Brasil, estimado em cerca de US$ 2,2 trilhões em 2025”.

Sobre a exploração mineradora no Brasil, o regulamento da lei da Política Nacional do Meio Ambiente diz: 

“Art. 1°: Os empreendimentos que se destinam à exploração de recursos minerais deverão submeter à aprovação do órgão ambiental competente, plano de recuperação de área degradada”. 

Mas até agora, nas demonstrações de interesse, o presidente norte-americano não pareceu se preocupar muito com o planejamento de recuperação das terras brasileiras.

Essas e outras negociações serão pautadas em breve, na COP 30. Nos cabe, como cidadãos brasileiros, estar atentos às resoluções e às consequências ambientais das decisões tomadas nessa Conferência, sempre visando preservar nossa biodiversidade e nosso vasto território.

Deixe um comentário