Entenda a relevância da campanha e a importância do diagnóstico precoce

Por Mariana Bezerra

Caminhada sem fins lucrativos em prol da conscientização sobre o câncer de mama realizada em Santos, São Paulo, pelo Instituto Neomama em 2024 ( Fonte: Acervo Prefeitura de Santos )

O mês de Outubro é marcado pela campanha de conscientização sobre o câncer de mama. Essa é uma tradição que surgiu nos anos 90 nos Estados Unidos. Desde 2002, quando o Obelisco de São Paulo foi iluminado com a cor rosa, o Brasil também abraçou essa ideia.  Essa iniciativa já se tornou tão popular que é comum que ela comece a parecer ‘apenas mais uma’. Segundo o Ministério da Saúde, o câncer de mama acomete 73 mil brasileiras todos os anos. Diante dos números e do depoimento de pessoas envolvidas na causa, fica clara a importância dessa campanha no país. 

Diversas organizações  governamentais e não governamentais (ONGs) , figuras públicas e a comunidade de forma geral produzem mensagens, propagandas, além de eventos voltados tanto para conscientização da sociedade, quanto para o bem estar e a arrecadação de verba para as pacientes em tratamento. A Dra. Renata Puccini, ginecologista e mastologista comenta: “ Aumenta bastante a quantidade de procura [ por atendimento] e de informação em circulação quando temos essas campanhas. A gente vê com bons olhos, como uma época de oportunidade para tentar acessar mais gente que, às vezes, não está prestando tanta atenção nesse assunto”.

O Palácio da esplanada iluminado com a cor rosa durante o mês de outubro ( Fonte: Ministério da Casa Civil )

O grande objetivo da campanha é a conscientização sobre o diagnóstico precoce. O câncer de mama e de colo de útero são os únicos que têm a indicação para rastreamento periódico – independentemente de quaisquer sintomas.  A partir da descoberta da doença na chamada fase “ pré- clínica”, a paciente tem chances de um melhor prognóstico. Ou seja, uma previsão mais otimista em relação ao tratamento da doença. Isso significa dizer que há a possibilidade de um tratamento mais rápido e menos invasivo.

Nesse sentido, esse mês também se torna um momento crucial para combater as fake news em torno da mamografia, por exemplo. De acordo com a especialista, todos os anos, circula, nas redes sociais, muita desinformação quanto a esse exame. As ideias de que a mamografia faz mal, causa o câncer ou, ainda, que não é eficiente são falsas e contradizem os principais e mais recentes estudos sobre o tema. Ela ressalta que, apesar de ser um procedimento que envolve radiação, a dose é controlada e extremamente segura. “ Só enquanto vivemos, a gente recebe radiação equivalente a 10 mamografias por ano” – comenta. Além disso, como explica a médica, esse é o único método diagnóstico que reduz a mortalidade. 


“ A gente costuma falar que se combate o câncer com informação [ o Outubro Rosa] é o momento da gente desmistificar a doença, falar sobre ela para que as pessoas, de fato, procurem se cuidar, estar com os exames em dia, procurem cuidar da sua saúde como um todo”  comenta Marla Miranda Souto, voluntária do Instituto Neomama, uma instituição sem fins lucrativos, localizada em Santos, no estado de São Paulo, que presta assistência a pessoas que estão ou que já passaram pelo tratamento contra o câncer.

Ainda sobre a importância da disseminação de informações, tanto Marla, como Dra. Renata Puccini comentaram que, apesar dos avanços, ainda existem muitos tabus quanto ao tratamento. A segunda afirma que essa é uma problemática que se manifesta entre todos os grupos e classes sociais e que faz com que muitas mulheres que percebem alterações e sintomas não se manifestem, nem procurem ajuda. Diante dessa realidade, a médica afirma que também é necessário combater algumas crenças do imaginário social como “ quem procura, acha”,  “o que os olhos não veem o coração não sente”. Afinal, o câncer de mama, apesar de curável e com tratamento disponível na rede pública,  é o tipo de câncer que mais mata mulheres no Brasil.

Dra Renata Puccini, ginecologista e mastologista (Fonte: Renata Puccini)

Assim, a campanha também convida as mulheres a cuidarem de si mesmas ao longo da vida como forma de prevenção primária — o que inclui não apenas manter os exames em dia, mas também adotar hábitos que reduzam os riscos da doença no cotidiano. Segundo o Instituto Nacional do Câncer (Inca), embora tenham origem em mutações genéticas, cerca de 30% dos casos podem ser prevenidos com um estilo de vida saudável. Isso envolve, principalmente,  a prática regular de atividades físicas. Arethusa Matos Rocha, que tratou o câncer de mama há 16 anos, explica que seus hábitos precisaram ser modificados após o tratamento. Diante disso,  a qualidade da alimentação, a constância da atividade física e o controle de peso passaram a ser uma preocupação muito maior, tanto para melhoria de vida de forma geral, como para prevenção da recidiva.

Após o tratamento, é igualmente essencial manter ou adotar esses hábitos saudáveis. Sob essa perspectiva, a voluntária do Instituto Neomama explica que ele oferece gratuitamente serviços complementares ao tratamento principal, como atendimento nutricional e psicológico, aulas esportivas e sessões de fisioterapia, inclusive para pacientes já curados. 

A partir de qual idade e com qual frequência a mamografia é indicada? 

A Dra. Renata explica que há uma concordância entre  Sociedade Brasileira de Mastologia (SBM ), Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem ( CBR ) e a Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia Obstetrícia ( FEBRASGO ) de que a mamografia deve ser adotada como uma exame anual a partir dos 40 até os 74 anos de idade. Após essa idade, a necessidade do exame varia de acordo com a saúde e bem-estar da mulher.

No caso de mulheres com histórico de casos na família, é importante que o  médico seja informado sobre elas, e que o check up seja, também, regular. Assim , o profissional pode fazer as recomendações necessárias quanto a possíveis mudanças na faixa etária de rastreamento. 

Um mecanismo muito popularizado é o autoexame. Apesar de ser importante o “autoconhecimento” do próprio corpo, como destaca a médica, essa prática não é apontada, nos estudos, como uma forma de reduzir a mortalidade. Isso porque são casos muito específicos em que a mulher consegue identificar um nódulo, por exemplo, ainda em estágios iniciais. Ou seja, ele não substitui o rastreamento através da mamografia.

Como fazer rastreamento / diagnóstico no SUS?

Apenas em 2025, o acesso à mamografia nos Sistema Único de Saúde ( SUS ) foi ampliado, facilitando a realização do exame, mediante demanda, de mulheres de 40 a 49 anos, independente de sintomas ou de histórico de casos na família. A indicação oficial do Ministério da Saúde  para realização deste procedimento é dos 50 aos 74 anos a cada dois anos. Assim, a medida de ampliação significa uma aproximação da recomendação do Ministério com a dos órgãos citados anteriormente.

As pacientes devem recorrer a uma UBS e realizar as consultas de rotina, que envolvem o exame físico com o médico indicado — geralmente um ginecologista ou médico da família. Mediante um diagnóstico, torna-se necessário o acompanhamento com um mastologista, médico especialista em mamas.

É importante ressaltar que há uma grande variabilidade regional quanto a agilidade do encaminhamento na rede pública. No entanto, Renata comenta que o Estado de São Paulo apresenta uma logística muito efetiva, o que faz com que não demore muito até que uma paciente com um diagnóstico inicie o tratamento. Segundo dados do Ministério da Saúde, em 2020, 99,57% dos casos de carcinoma in situ – caso em estágio inicial em que a cirurgia é necessária –  o tempo entre o diagnóstico e o início do tratamento no SUS foi de até 30 dias. 

Proporção de mulheres de 50 a 69 anos de idade que nunca realizaram exame de mamografia. Brasil e Regiões. PNS, 2019 Nota: Intervalo de confiança de 95% indicado pela barra de erros ( Fonte: : IBGE, Pesquisa Nacional de Saúde 2019)

Ainda que diante de um diagnóstico precoce e de um tratamento viável e otimista, a palavra “ câncer “ carrega uma carga muito pesada e costuma assustar os pacientes.  “ A primeira coisa que vem à mente é o medo da morte”, comenta Arethusa Matos. Ela também afirma que essa é uma doença que afeta o emocional de toda a família e que é importante que os envolvidos, além do paciente, também busquem mais informações sobre o tema. “ Quando o médico chega junto e diz: vamos tentar, vamos fazer o possível é mais tranquilizante. Ele é muito presente, ele precisa ser”, acrescenta. 

“ É muito difícil de você suportar, então [ é preciso] ter fé, coragem e paciência, muita paciência. Jamais vou dizer para uma pessoa ´vai ser fácil`. Vai ser difícil, vai ser cansativo, mas tudo vai ter um fim e vai dar tudo certo” [ Arethusa Matos Rocha]

Nesse sentido, fica clara a importância do acolhimento e respeito a essas mulheres. No Instituto Neomama, o primeiro contato com as “atendidas”, como são chamadas, é feito por voluntárias que já passaram por esse processo e que podem usar sua experiência e olhar empático para acolher as que chegam e ensinar aos outros voluntários.

Ainda sobre o tratamento humanizado, Marla Miranda, comenta a importância da doação de perucas para as mulheres que sofrem com a queda de cabelo como um dos efeitos colaterais do tratamento, uma vez que isso afeta  Até hoje, uma das cenas mais marcantes da história da teledramaturgia brasileira é a da personagem Camila ( Carolina Dieckmmann), de Laços de Família raspando o cabelo após ser diagnosticada com leucemia, um outro tipo de câncer. Esse retrato foi tão relevante pois conseguiu representar a emoção de muitas pessoas que já passaram por isso. Enquanto algumas mulheres optam por mostrar a careca, outras pelo uso do lenço e outras pela peruca, é imprescindível a sensibilidade e a compreensão de que não é “só cabelo”. 

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