Entenda os motivos e as consequências desse fenômeno na educação brasileira

Por Isabela Cristina

A doutora em Educação Dinamara Pereira Machado. Foto: arquivo pessoal 

Segundo dados publicados em Setembro de 2025 pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), matrículas em universidades no modelo a distância superaram as matrículas no modelo presencial. Porém, mesmo com o crescimento do modelo EaD, muitas questões rondam a modalidade.

A Educação a Distância (EaD) é uma modalidade legalmente reconhecida, com planejamento pedagógico próprio e uso de ambientes virtuais de aprendizagem (AVA). No Brasil, tem sido marcada pela predominância da iniciativa privada, que responde por 95,8% das vagas ofertadas.

Buscando compreender a fundo os problemas que rondam a graduação a distância, o Jornal Contexto entrou em contato com Dinamara Pereira Machado, Doutora em educação e líder do Grupo de Pesquisa do Centro Universitário Internacional (Uninter) sobre o tema.

A ascensão do modelo EaD

Segundo Dinamara, a crescente preferência dos jovens pela modalidade EAD em detrimento do ensino presencial pode ser compreendida a partir de múltiplas dimensões: sociais, econômicas, tecnológicas e cognitivas.

A flexibilidade no quesito tempo e espaço é uma vantagem, principalmente para aqueles alunos que precisam conciliar estudo com trabalho. Além disso, existe o âmbito econômico, já que o formato semipresencial reduz custos com transporte, alimentação e moradia, apresentando também  mensalidades mais acessíveis. 

Um outro fator a ser analisado é a intimidade com as telas que a nova geração apresenta, já que com o avanço da tecnologia, o acesso ao ambiente digital se tornou cada vez mais precoce. Porém, essa familiaridade com a tecnologia pode ser vista com outros olhos.

“Acostumados a consumir conteúdos digitais de forma passiva — como vídeos curtos, redes sociais e jogos — esses estudantes muitas vezes associam o ambiente virtual de aprendizagem a uma experiência leve, rápida e pouco exigente. No entanto, ao se depararem com as exigências reais do ensino superior — que envolvem pesquisa, extensão, produção de conhecimento, leitura crítica e participação ativa — muitos jovens enfrentam uma ruptura entre expectativa e realidade. Essa frustração contribui para os altos índices de evasão observados nos cursos EaD”, afirma Dinamara.

O  período de pandemia também tem uma influência notória no aumento da procura do EaD, considerando que muitos jovens perceberam que é possível aprender fora da sala de aula tradicional, o que contribuiu para a normalização da aprendizagem digital.

Regulamentação da graduação a distância

Em 2025, o  Decreto nº 12.456/2025 marcou mais uma evolução para o modelo de graduação EaD. 

O  Decreto em questão tem como propósito a regulamentação e a fiscalização dos modelos digitais de educação, trazendo mudanças significativas para uma padronização de qualidade e democratização da educação superior.

Entre os avanços, o corpo docente que compõe cursos de graduação semipresenciais e à distância deve, obrigatoriamente, possuir pós-graduação. Já para os mediadores pedagógicos, profissionais que atuam como ponte de comunicação entre os professores e os alunos, a exigência é de formação em nível de graduação, preferencialmente com pós-graduação. Além disso, a quantidade de profissionais pertencentes ao corpo docente juntamente aos mediadores dos cursos deve ser compatível com o número de estudantes matriculados vinculados ao polo EAD.

A definição mais clara dos formatos de curso e a exigência de infraestrutura mínima nos polos EaD também são avanços consideráveis. Porém, para Dinamara, o Decreto não se resume a progressos.

“Embora o decreto represente um esforço de regulamentação, ele também explicita os contornos ideológicos e econômicos que moldam a educação superior brasileira. O desafio que se impõe é construir uma educação que seja inclusiva, crítica e comprometida com a formação integral, sem se submeter às lógicas de mercado e aos interesses corporativos”.

O Presidente Luiz Inácio Lula, ao lado do ministro de  Estado de Educação, Camilo Santana, após assinatura do Decreto nº 12.456/2025. Foto: Ricardo Stuckert/PR

 A iniciativa privada no Ensino à distância

No Brasil, o ensino superior no modelo EaD é marcado pela forte presença do setor privado, que teve uma expansão acelerada, principalmente após a flexibilização regulatória de 2017, responsável pelo crescimento desenfreado da modalidade.

Em 2006, o Estado promoveu uma iniciativa relevante nesse cenário com o projeto da Universidade Aberta do Brasil (UAB). O Decreto n° 5.800 instituiu o Sistema UAB, com objetivo de fomentar a modalidade de educação a distância nas instituições públicas de ensino superior, bem como apoiar pesquisas em metodologias inovadoras de ensino superior respaldadas em tecnologias de informação e comunicação. 

Porém, mesmo com essa iniciativa da rede pública de ensino, as instituições privadas são as responsáveis pela maior oferta de vagas e variedade de cursos na modalidade, além de propagarem a ideia da graduação virtual de maneira mercadológica, chegando ao público como um produto interessante e acessível. 

“Embora o Estado reconheça a importância da modalidade, ainda não consolidou uma política pública robusta e abrangente capaz de atender às necessidades educacionais da população em larga escala, pois não basta criar políticas públicas é necessário fiscalizar”, afirma Dinamara. Quanto ao fato da maior oferta de EaD vir da rede privada de ensino, Dinamara explica que “as instituições particulares têm papel estratégico na construção de uma EaD e semipresencial inclusiva e transformadora. Para isso, é essencial superar a lógica mercadológica e assumir um compromisso com a qualidade socialmente referenciada, que considera equidade, contexto social e formação integral. E é fundamental que o MEC/INEP realize fiscalização contínua, assegurando que a expansão da EaD ocorra com qualidade, compromisso social e respeito às trajetórias dos estudantes”. 

Por dentro do EaD 

Com a finalidade de compreender a realidade vivida por alunos do ensino superior à distância, o Jornal Contexto fez uma sondagem, tendo como resultados experiências variadas com a modalidade.

Brenda Moretto está no seu terceiro ano de graduação no modelo virtual, e afirma ter tido todo suporte da instituição, com uma experiência sem grandes dificuldades. A estudante contou que optou pela modalidade online pela flexibilidade dos horários, conseguindo conciliar seu trabalho com os estudos sem ficar sobrecarregada, além de já estar adaptada ao modelo de ensino por ter feito um curso técnico à distância no período da pandemia.

Já a experiência de Maria Eduarda Vieira contrasta com a de Brenda. A ausência física de um professor foi uma das dificuldades citadas pela estudante, principalmente pela falta de auxílio dos professores que devem ser contatados por email, porém raramente respondem, além das aulas gravadas que não surtem o mesmo efeito das aulas presenciais.

Porém, mesmo diante das dificuldades, Maria explica que permanecerá no modelo virtual, já que a grade horária do ensino presencial impede a sua inserção.

A falta de um contato direto com o professor também foi um problema para Luigi Barincon, que optou pelo modelo EaD buscando uma maior qualidade de vida, mas encontrou dificuldades com a autodisciplina e com a falta de auxílio dos professores.

Mesmo dividindo opiniões em meio a diversas experiências, com sua crescente evolução, a graduação EaD se consolidou como uma realidade inegável.

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