Torcedores reivindicam direito ao voto. Enquanto isso, ambiente de instabilidade já começa a afetar o desempenho da equipe alvinegra em campo
Por Gabriel Oliveira

O Corinthians enfrenta uma das maiores crises políticas de sua história recente. Investigações sobre lavagem de dinheiro, pedidos de impeachment contra o presidente e até invasões de torcidas organizadas à sede no Parque São Jorge expõem um ambiente de instabilidade que já começa a afetar diretamente o desempenho do time dentro de campo.
A crise se acentuou após a saída da chapa “Renovação e Transparência”, que comandou o clube por 16 anos. O que parecia ser um novo começo, capaz de estancar dívidas e reorganizar o Corinthians, acabou se transformando em mais um capítulo conturbado na vida do torcedor alvinegro. Para entender como o clube chegou a esse cenário, é preciso voltar no tempo e analisar os caminhos que levaram a essa turbulência.
Em novembro de 2023, o Corinthians realizou sua tradicional eleição presidencial, que marcaria o início de uma nova fase na história do clube. As intenções de voto eram lideradas por André “Negão” Luiz Oliveira, representante da chapa que comandava o clube há anos, e por Augusto Melo, candidato de oposição. A gestão vigente enfrentava altos índices de rejeição, inclusive entre os próprios sócios, em meio a sucessivas eliminações em competições e uma dívida que somava R$ 2,56 bilhões, sendo R$ 1,9 bilhão do clube e R$ 668 milhões da Neo Química Arena. Diante desse cenário, Augusto Melo venceu a eleição com 66,2% dos votos (2.771), contra 33,8% de André (1.413).
Já no início de seu mandato, o então presidente Augusto Melo anunciava o maior contrato de patrocínio da história do futebol brasileiro com a casa de apostas VaideBet. Os valores giravam em torno de R$370 Milhões em três anos de contrato. Muito elogiado e comemorado por Melo, o negócio acabou provocando muitas dores de cabeça ao torcedor.
Em maio de 2024, diversos portais começaram a noticiar a informação de um suposto envolvimento com um laranja na intermediação do contrato entre Corinthians e VaideBet. O assunto veio à tona a partir da reportagem do colunista Juca Kfouri do portal UOL, que afirmava que a empresa Rede social Media Design LTDA, que intermediou o acordo, repassou os valores recebidos em comissões para outra instituição.
A empresa Neoway Soluções Integradas em serviços LTDA, que recebeu o dinheiro, é comandada por Edna Oliveira dos Santos. Antes da rescisão do contrato, a casa de apostas notificou extrajudicialmente o clube devido ao suposto envolvimento com lavagem de dinheiro.
No dia 7 de junho do mesmo ano, em meio às polêmicas, a patrocinadora decidiu rescindir o contrato com o clube cinco meses após a assinatura. O movimento partiu da cláusula anticorrupção, podendo ser utilizada mediante abertura de investigações da polícia civil de São Paulo. Em meio a crise que começava a se instaurar diversos outros dirigentes começaram a pedir desligamento do clube, entre eles o diretor jurídico Yun Ki Lee.
Em agosto, cerca de 90 conselheiros decidiram protocolar um pedido de impeachment para Augusto Melo citando o caso VaideBet como um dos ganchos factuais da ação. Já no mês de dezembro, a votação tão aguardada foi adiada por uma liminar concedida pela justiça ao então presidente do Corinthians, atrasando os planos do conselho deliberativo.
Em abril último, Augusto Melo foi convocado a depor à justiça no caso VaideBet, desta vez na posição de investigado. Ao mesmo tempo, o conselho deliberativo do clube supostamente decidiu afastar do cargo seu presidente Romeu Tuma Júnior. Ele era o responsável por protocolar o pedido de impeachment, decisão essa que viria a ser importante no mês subsequente. Já no fim do mês, Augusto sofreria mais um revés: em sua maioria, o conselho do clube reprovou as contas do ano fiscal de 2024, o primeiro do mandatário. A essa altura, o clube apresentava um déficit de R$181 milhões.
Em 22 de maio, a polícia civil do estado de São Paulo decidiu indiciar Augusto Melo e mais três pessoas pelos crimes de lavagem de dinheiro, furto e associação criminosa por razão do caso VaideBet. Quatro dias depois, no dia 26, em meio a uma turbulenta votação, Augusto foi afastado do cargo de presidente do Corinthians após recomendação do Conselho de Orientação (CORI) do clube. Assumia então de forma Interina Osmar Stábile.
No dia 31 de maio, em um final de sábado até então tranquilo, Augusto Melo tenta retornar ao poder do clube juntamente de aliados por meio de uma manobra política nos bastidores. Maria Angela de Souza Ocampos, secretária do conselho, alegava que as ações de Romeu Tuma Júnior desde o dia 9 de abril em diante deveriam ser revogadas, incluindo o processo de impeachment, pois o mesmo havia sido supostamente afastado da presidência do conselho. Maria disse que assumiria a presidência do Conselho após o afastamento de Tuma, ainda que não fosse a primeira na linha de sucessão, posição essa que era do vice-presidente Roberson de Medeiros, afastado por licença médica.
Após a frustrada tentativa de reassumir o posto, Augusto Melo salientava ser o mandatário do clube alvinegro. Mas, em razão da manobra exercida, o presidente interino Osmar Stábile reiterou ser o mandatário do Corinthians.
Osmar começou a fazer diversas mudanças na diretoria do clube, demitindo funcionários e contratando novos membros, alguns desses são velhos conhecidos, que já tiveram passagens pelo clube e são ligados à Renovação e Transparência. Isso causou revolta no torcedor corinthiano.
Em entrevista ao Jornal Contexto, Givanildo Silva ou Giva (47), presidente da torcida organizada Fiel Macabra comentou sobre essa mudança de direção no clube: ‘‘Conversamos com o presidente. Essa pergunta foi feita pra ele: ‘Você trouxe dirigentes que estavam lá atrás, que roubaram o clube’. Aí ele veio, deu uma enrolada lá, tentou se explicar, dizendo que não pode colocar qualquer um, que tem que colocar pessoas que entendem de futebol. Ele fez algumas mudanças. Aparentemente, a mudança que ele fez foi na base. Ele falou que não entra mais empresário dentro da base. Pediu até pra gente formar uma comissão para acompanhar isso, pra fiscalizar. Na prática, ainda não começou. Mas, pelas mudanças que ele falou… Como ele mesmo disse, ele tem 70 dias para tentar administrar. Então a gente tá em cima, tá acompanhando, e vamos torcer pra dar certo’’, afirmou Giva.
Ainda no início de junho, seis torcidas organizadas do Corinthians (Gaviões da Fiel, Fiel Macabra, Coringão Chopp, Pavilhão Nove, Camisa 12 e Estopim da fiel), em um movimento coordenado, decidiram invadir a sede social do Parque São Jorge e ocupar o local. Em um protesto pacífico, os torcedores fecharam as portas do clube e exibiram uma faixa com os dizeres ‘Fechado por má administração’.
Os torcedores também buscavam reivindicar as seguintes pautas: Fiel torcedor com direito ao voto, mudança no estatuto do clube e punição aos responsáveis que deixaram dívidas em suas gestões. Giva também comentou sobre as reivindicações. Para ele, é inviável um clube de 30 milhões de torcedores ter um presidente eleito com cerca de 3000 votos. Sobre as mudanças no estatuto do clube, ele explica que “tem muita coisa dentro desse estatuto que está muito defasada, está muito blindada pelos antigos. Quem vota tem direito, são os conselheiros vitalícios. São pessoas antigas, ultrapassadas. A gente tem que mudar isso. Para mudar o clube, a única forma seria essa: uma reforma estatutária. O Fiel Torcedor ter direito a voto, pra gente tentar mudar essa política do clube”.
No último sábado (13), torcedores e associados do Corinthians, repetindo os atos das organizadas, realizaram um protesto no Parque São Jorge. Novamente vinha à tona a exigência na mudança do estatuto do clube, direito de voto ao fiel torcedor e maior transparência nos processos internos de administração.
Havia faixas com os dizeres: ‘‘Associados abram os olhos’’, ‘‘Fora ratazanas’’ e ‘‘Fiel torcedor com direito ao voto, já’’. O presidente Osmar Stábile e o presidente do conselho Tuma Júnior foram vistos conversando com manifestantes segundo apuração do portal de notícias Meu Timão.
Para o torcedor alvinegro, a esperança está no dia 9 de agosto, quando ocorrerá uma grande votação para ratificar ou não a votação do impeachment de Augusto Melo. Caso aprovado, se inicia um novo processo de eleição para decidir quem será o novo mandatário do Corinthians, mas ainda por meio de eleições indiretas no conselho deliberativo. A conquista do direito ao voto pelos torcedores do Corinthians ainda terá que esperar.
