Este é o nome dado ao processo de transformar coisas cotidianas em apostas, desenvolvido a partir do vício e agravado pela desenfreada criação de casas de aposta

Por Enzo Kato

Nos dias de hoje é visível como tudo se transformou em apostas, ultrapassando o nicho esportivo, se tornando um hábito cotidiano. Qualquer coisa vira motivo de aposta, como por exemplo, como no caso mais recente da sucessão papal, quando no dia da morte do Papa Francisco, o mercado de previsões polymarket apontou que 2,9 milhões de dólares (16,9 milhões de reais) foram apostados em nomes de possíveis pontífices candidatos ao cargo.

O que anteriormente entretenimento esportivo sobre qual equipe ganharia uma partida, passou a ser uma forma de epidemia compulsiva. Outro exemplo dessa compulsão epidêmica ocorreu no Super Bowl de 2025, quando o público apostava qual seria a cor do isotônico da equipe campeã ou quantas vezes uma celebridade apareceria na plateia. Isso movimentou aproximadamente 1,4 bilhões de dólares, de acordo com o Bloomberg.

No Brasil, o mercado de apostas tem recebido mensalmente cerca de R$ 30 bilhões, afirmou o secretário-executivo do Banco central, Rogério Lucca, durante a CPI das Bets. A quantidade é superior ao ano de 2024, que apresentava uma média de apenas R$ 20 bilhões por mês.

A democratização do acesso aos aparelhos eletrônicos tornou-se um agravante para essa questão do vício, uma vez que entrar nas plataformas de aposta se tornou muito mais simples.

A psicanalista Maria Célia Reinaldo, 55, formada pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU) com especialização em interface na assistência de álcool e drogas, afirma que a transformação de situações cotidianas em apostas é uma forma de “satisfação” que o risco traz.

“Nos anos 90 existiam os bingos, e a quantidade de pessoas que se endividaram por causa dele foi o motivo de sua proibição. Apesar da proibição, inúmeras casas clandestinas surgiram atraindo sobretudo um público de faixa etária mais velha que igualmente se viciaram e endividaram. Isso que permeia a subjetividade da época. Então hoje, as ‘bets’ são uma forma hereditária desse vício, que contém um discurso capitalista de ganho, induzindo o indivíduo a uma satisfação prazerosa, mas que ao longo prazo se torna destrutiva”, explica.

O mercado de bets se tornou uma tendência mundial, e no Brasil não foi diferente. Em maio de 2025, existiam mais de 150 casas regulamentadas operando em solo brasileiro, entre elas muitas patrocinadoras de times de futebol, eventos, influencers e atletas. Diversas figuras públicas de renome internacional, produzem publicidade para estas casas de apostas, incentivando cada vez mais a participação do público a apostarem nas plataformas.

Tais celebridades, utilizando da influência acabam persuadindo as pessoas com promessas messiânicas de como “ficar rico” ou “ganhar dinheiro fácil”, sendo isso uma armadilha, um caça níquel, contribuindo com o lucro da plataforma.

No Brasil foi registrado, segundo fonte do Banco Central (BC), que cerca de 5 milhões de beneficiários do bolsa família destinaram R$ 3 bilhões em apostas em apenas um mês. Para Maria Célia, a esperança dessas famílias em ganhar dinheiro facilmente se tornam um problema quando perdem a aposta pois na ânsia de recuperar o prejuízo voltam a apostar cada vez mais, passando a ser um processo cíclico de dependência.

Outro agravante para esse processo de “betização”, são as plataformas midiáticas que através das publicações frequentes de assuntos relacionados a “bets” inundam o público de informações de caráter duvidoso por meio de propagandas e matérias pagas.

Assim sendo, a junção temerária de vício em jogo mais promessa de ganho fácil agravados pela facilidade de acessar as plataformas junto com o bombardeamento midiático, criou um terreno vasto e fértil para a proliferação das casas de apostas levando à tenebrosa “betização”.

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