“Enquanto eu tiver um pedaço de papel e um lápis, eu vou escrever”.

A escritora Carolina Maria de Jesus, em colagem feita por alunos da Escola Laerte, em São Paulo. Foto: Bruna Arcanjo
Por Bruna Arcanjo
Carolina Maria de Jesus (1914–1977) enfrentou uma série de obstáculos imensos ao longo de sua vida. Mulher negra, mãe solo e com um nível muito limitado de escolaridade — frequentou a escola apenas até o segundo ano do ensino fundamental –, ela sobreviveu como catadora de papel e moradora de favela.
Desde o início, o destino parecia conspirar contra ela. Nascida em uma pequena comunidade rural localizada no município de Sacramento, no interior de Minas Gerais, Carolina acabou seguindo um caminho que a levou até a cidade de São Paulo. Lá, começou a trabalhar como empregada doméstica, mas sua trajetória tomou outro rumo quando engravidou, perdeu o emprego e, sem recursos, foi morar na região do Canindé, considerada a primeira grande favela da capital paulista.
Em meio à dura realidade da pobreza extrema, a luz que iluminava seus dias sombrios vinha da leitura dos livros que encontrava e dos registros que fazia em cadernos velhos recolhidos nas ruas durante seu trabalho como catadora.
Foram justamente essas anotações do cotidiano, feitas com olhar sensível e escrita potente, que mais tarde dariam origem à sua obra mais conhecida: Quarto de Despejo: diário de uma Favelada, publicada em 1960. O livro tornou-se um verdadeiro fenômeno literário, impactando profundamente o cenário cultural da época e projetando Carolina para além das fronteiras brasileiras, com reconhecimento internacional.
A publicação de seu diário foi possível graças à intervenção do jornalista Audálio Dantas, que, à época, trabalhava no jornal Folha da Noite. Enviado para fazer uma reportagem sobre a favela do Canindé, localizada às margens do rio Tietê, Dantas acabou se deparando com Carolina e seus inúmeros cadernos manuscritos. Ao folhear aqueles escritos crus e honestos, reconheceu de imediato a força literária e o valor documental daquele material. Percebeu que não precisava escrever uma matéria sobre a favela — ela já estava contada nas palavras de Carolina.
Impressionado, o jornalista decidiu publicar trechos do diário e a história da autora na edição de 9 de maio de 1958 da Folha da Noite, o que gerou grande repercussão entre os leitores. O sucesso foi tão grande que, no ano seguinte, os relatos de Carolina também passaram a figurar nas páginas da influente revista O Cruzeiro.
Em 1960, com edição organizada por Dantas, Quarto de Despejo foi finalmente lançado como livro. A obra rapidamente se tornou um best-seller, sendo traduzida para 13 línguas diferentes e adaptada tanto para o teatro quanto para a televisão, consolidando Carolina Maria de Jesus como uma das vozes mais marcantes da literatura brasileira do século XX.
Ao dedicar uma sala a ela, a escola promove um gesto simbólico: dar centralidade a quem foi historicamente silenciada e oferecer um espaço para que os alunos possam se expressar por meio da maior paixão de Carolina — os livros.
“Se ela conseguiu, com todas as suas precariedades, eu também posso conseguir. Nosso foco desde o começo era transmitir essa mensagem: a de que eles também podem — e vão — conseguir, assim como ela.”, finaliza o coordenador do projeto, Samuel Mascarenhas, ao Jornal Contexto.

Membros do grupo Intelectualidades Marginais e docentes da Escola Laerte com placa em homenagem à escritora. Foto: @menor011_
