A rotina do transporte público não é estressante apenas para os passageiros; entenda a perspectiva dos motoristas

Por Isabela Marquesi

Estudantes em frente à Unesp entram em ônibus da linha Falcão/ITE Foto: Isabela Marquesi

Depender do transporte público não é uma realidade fácil para a população bauruense: horários espaçados, atrasos, lotação e aumento do preço da tarifa transformam uma alternativa prática de locomoção em uma grande dor de cabeça. Porém, passa despercebido que os motoristas de ônibus também não se safam do estresse do transporte coletivo.

Segundo a Transurb, 332 motoristas trabalham para a Grande Bauru e a Sem Limites, operadoras de serviço de transporte público, enfrentando as adversidades de lidar com a população e dirigir um veículo grande.

A baixa rotatividade de motoristas torna o trajeto pelas linhas uma rotina familiar: os mesmos pontos, os mesmos passageiros, os mesmos horários e o mesmo desafio, o trânsito.

Para o motorista Bruno de Moura, que dirige há quatro anos pela linha Bauru Shopping, Via Dutra, o trânsito é a maior adversidade, e tem piorado com o passar do tempo. Segundo ele, o número crescente de novos habilitados representa aumento no risco de acidentes.

Bruno relata a dificuldade de dirigir um veículo grande, com muitos pontos cegos, em um trânsito perigoso: carros que entram na frente do ônibus, não dão seta e “roletam o Pare” dificultam o trabalho.

Luciano Henrique, que está há 11 anos no cargo, concorda com esse problema, afirmando ser o trânsito a principal causa do tão detestado atraso. Ele ainda comenta sobre o aumento do número de carros e o desrespeito das motocicletas. “Hoje as motos não respeitam mais nada”, protesta.

Mas se o movimento agitado do trânsito é um obstáculo, a calmaria é uma preocupação maior ainda. Nos anos de pandemia do COVID-19, as ruas vazias e a falta de passageiros abalaram os condutores com uma grande preocupação: o desemprego.

David de Oliveira, com 10 anos de experiência ao volante, comenta sobre as turbulências da época, relembrando um amigo que perdeu o emprego na condução por causa da paralisação global.

Para ele, acostumado com a correria do dia a dia, rodar um ônibus vazio trouxe também impactos pessoais: “eu gosto do movimento”, ri.

Passado o tempo, tudo voltou à normalidade, exceto por uma coisa: “o público, ao invés de aprender com a pandemia a ser mais humano, piorou”, diz David.

Na pressa do cotidiano, os motoristas acabam se tornando alvo do estresse da população. O desacato e reclamações sem soluções – atraso, lotação, calor – tornam difícil a relação com o povo. David gostaria que a população entendesse que a culpa dos atrasos e das possíveis complicações não é dos motoristas, que buscam sempre dar o seu melhor.

Motorista David de Oliveira no ponto do Bauru Shopping. Foto: Isabela Marquesi

Com uma década no emprego, ele aprendeu a lidar com a falta de educação. Diz que “desliga” ao chegar em casa, pois “se ficar nervoso […] vai ficar doente por bobeira”, como já aconteceu com muitos companheiros seus.

Abrir as portas para pessoas grosseiras e dirigir todo dia por um trânsito desregrado não é um trabalho fácil. “A gente precisa estar com o psicológico em dia para lidar”, comenta David. “Terminou seu turno, vira a chavinha e vai viver com a sua família, vai descansar pro outro dia. A batalha é de novo”.

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