“Restrição na emissão de cidadanias italianas pode antecipar a crise populacional e econômica do país”, diz especialista
Por Lorenzo Santos

No último mês, uma atualização na legislação italiana causou um grande alvoroço na comunidade internacional. Isso ocorreu após o anúncio das novas regras na emissão de títulos de cidadãos italianos para estrangeiros. Agora, o reconhecimento por direito de sangue (ius sanguinis) se limitará a apenas duas gerações, ou seja, se antes qualquer pessoa que pudesse comprovar ascendência italiana podia pleitear a dupla cidadania — independentemente do grau de parentesco —, agora, apenas filhos e netos de nascidos na Itália poderão requerer o título.

Além disso, os critérios se tornarão ainda mais rigorosos, pois será demandado do indivíduo manter os vínculos reais com o país, exercendo os direitos de cidadão ao menos uma vez a cada 25 anos. As restrições adotadas fazem parte de uma agenda mais ampla do governo de Giorgia Meloni voltada ao controle da imigração no país e tiveram o apoio da ala conservadora do parlamento. No entanto, a implementação por meio de um decreto-lei sem um amplo debate gerou críticas de opositores.

Segundo Antonio Tajani, chefe da diplomacia italiana, a medida é uma barreira para conter a “comercialização” de passaportes, uma prática que tem incomodado as autoridades do país. Com o título de cidadão italiano — e, consequentemente, europeu — facilita-se o acesso ao passaporte da União Europeia. Os títulos estariam, portanto, sendo emitidos para pessoas buscando uma “porta de entrada” para outros países, e não para aqueles que realmente desejam possuir e exercer os direitos de sua nacionalidade.

Problemas Demográficos

Entretanto, apesar das novas regras parecerem uma solução para um problema social no país, tais medidas podem acabar tendo um efeito agravante na demografia italiana. De acordo com novos dados do Instituto Nacional de Estatística Italiano (ISTAT), a Itália atingiu no último ano o menor índice de natalidade da sua história, e, segundo projeções, pode perder cerca de 20% da sua população em até 50 anos.

De acordo com Gabriel de Almeida Ramos, geógrafo formado pela Unesp, a Itália enfrenta, no momento, uma transição demográfica — um envelhecimento populacional e uma baixa taxa de natalidade —, que se soma a um aumento na emigração de jovens entre 18 e 34 anos.

O geógrafo Gabriel de Almeida Ramos. Foto: arquivo pessoal

Segundo ele, “a União Europeia possui uma integração política muito grande, todos conseguem entrar e sair dos países. O que faz com que os jovens busquem melhores oportunidades econômicas fora do país. Isso com certeza agrava ainda mais a crise demográfica que a Itália está enfrentando”.

Para Gabriel, com uma população em declínio e um saldo migratório negativo, limitar o acesso à cidadania significa reduzir a possibilidade de repor a força de trabalho e a base demográfica com descendentes de italianos espalhados pelo mundo.

“Se essas restrições não forem repensadas, o país pode enfrentar uma crise econômica. Taxas de fecundidade baixíssimas, população economicamente ativa chegando na terceira idade, emigração de jovens e restrições na emissão de títulos de cidadãos são fatores que certamente vão acelerar os problemas enfrentados pela transição demográfica italiana”, diz ele.

As novas diretrizes para a concessão de cidadania, somadas às tendências demográficas em curso, consolidam um cenário de transformações profundas para a Itália. A evolução desse quadro dependerá do impacto das medidas já em vigor e da capacidade de adaptação do país às mudanças populacionais projetadas para os próximos anos.

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