Papa Francisco morre aos 88 anos e deixa um legado de fé, inclusão e coragem pastoral
Por Rafael Fernandez

O mundo silenciou com a notícia da morte do Papa Francisco, um pontífice cuja voz ecoou muito além dos muros do Vaticano. Aos 88 anos, Jorge Mario Bergoglio partiu deixando não apenas uma cadeira vazia na Praça de São Pedro, mas uma presença viva nos corações de milhões. Primeiro papa latino-americano e o primeiro jesuíta a ocupar o trono de Pedro, seu pontificado foi marcado pela simplicidade, empatia e coragem.

Desde o início, sua escolha de nome — Francisco, em homenagem a São Francisco de Assis — já anunciava a direção que tomaria: uma Igreja voltada aos pobres, à paz e à criação. “Como eu gostaria de uma Igreja pobre e para os pobres”, disse ele em seus primeiros dias como pontífice, resumindo o espírito de sua missão. O padre Vanderlei Nunes, da Diocese de Santo André, destaca que esse desejo foi muito além das palavras. 

“Ele resgatou os valores da humildade, da simplicidade e da proximidade com o povo. Francisco foi um pastor que tocou os corações com a força da oração e da alegria cristã.”

Papa Francisco acolhendo os fiéis no Vaticano

Francisco não fugiu de temas espinhosos. Abriu diálogo com homossexuais, dizendo “se uma pessoa é gay e busca a Deus, quem sou eu para julgá-la?”. Além disso, promoveu reformas administrativas no Vaticano, enfrentou escândalos financeiros e combateu com firmeza os abusos sexuais dentro da Igreja, reconhecendo erros e pedindo perdão em nome da instituição.

Para o padre Vanderlei, Francisco deixou ensinamentos profundos que devem permanecer vivos. “Ele nos ensinou a superar preconceitos, acolher os divorciados, reconhecer o papel das mulheres e dar espaço às populações LGBTQIA +. Ele foi claro em dizer que todos devem ter seu lugar dentro da Igreja”.

Também se destacou por sua atuação global. Foi mediador no restabelecimento das relações diplomáticas entre Cuba e Estados Unidos, visitou zonas de guerra e refugiados, e fez duras críticas à “cultura do descarte” e ao consumismo.

Em sua encíclica Laudato Si’, lançou um dos mais importantes apelos papais em defesa do meio ambiente, pedindo uma “conversão ecológica” mundial. “Francisco nos deixou um legado pastoral e espiritual que inclui a ecologia integral como parte da missão evangelizadora”, reforça o padre Vanderlei. “Ele lembrava que cuidar da Casa Comum é uma forma concreta de viver o Evangelho”. Francisco acreditava na força do gesto. Recusou o trono e os aposentos luxuosos papais e optou por viver na Casa Santa Marta e sentar em uma simples cadeira de madeira. Lavou os pés de presos e refugiados, abraçou doentes e jamais escondeu suas fragilidades.

Para ele, o poder era serviço: “O verdadeiro poder é o serviço”, repetia. “Essa frase resume sua essência”, afirma Vanderlei. “Ele era o papa das periferias, aquele que foi ao encontro dos que estavam à margem. Em suas mais de 40 viagens apostólicas, tocou realidades dolorosas, sem medo de se expor”.

Ele foi incansável defensor da fraternidade entre religiões. Em 2019, assinou com o grande imã de Al-Azhar o “Documento sobre a Fraternidade Humana”, um marco no diálogo inter-religioso. “Construímos muros demais e pontes de menos”, advertia. “O diálogo com outras religiões e a cooperação em prol do bem comum marcaram profundamente seu pontificado”, diz o padre. “A Igreja precisa continuar esse caminho de parceria e escuta com outras tradições religiosas e com os mais marginalizados”.

Com sua partida, encerra-se um ciclo de diálogo, humildade e transformação. Mas, para o padre Vanderlei, a missão não se encerra aqui. “A Igreja precisa continuar sendo uma casa de portas abertas. Francisco nos ensinou que evangelizar é acolher, é caminhar com os pobres, com os que sofrem, com os esquecidos”.

Padre Vanderlei Nunes- Arquivo Pessoal

Sobre o futuro da Igreja, Vanderlei reconhece que o próximo conclave é um momento decisivo. Para ele, “mais de dois terços do colégio de cardeais foram nomeados por ele, então é provável que o novo papa siga seu perfil. Esperamos alguém que continue esse caminho de diálogo e missão, talvez com um pouco mais de ortodoxia doutrinal, mas ainda aberto às necessidades do povo”. Ele acrescenta que é possível que o novo pontífice venha de fora da Europa. “Pode ser um africano, asiático ou americano, como forma de reforçar a universalidade da Igreja”.

O silêncio que agora se impõe é cheio de ecos — ecos de um legado que continua a falar. Francisco mostrou, com gestos e palavras, que a misericórdia tem o poder de transformar o mundo. Antes de sua despedida, deixou uma mensagem que permanece como guia, “Não se deixem vencer, não se deixem enganar, não percam a alegria, não percam a esperança, não percam o sorriso, sigam assim!” Seu testemunho segue como um chamado constante à esperança, à fraternidade e ao amor, mantendo viva a luz que acendeu no coração da humanidade.

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