As infecções sexualmente transmissíveis na comunidade LGBTQIA+, ou ISTs, são consideradas um problema de saúde pública. Podem ser contraídas por relações íntimas sem a devida proteção e devem ser tratadas corretamente.

Por André Merli

Não é de hoje que a transmissão e contaminação de ISTs ocorre no Brasil, e com ela muitas vezes vem a falsa ligação com a comunidade LGBTQIA+, que até os dias atuais sofre com esse preconceito. Para a médica infectologista Márcia Lima essa generalização é um “exemplo claro de estigma e desinformação, e ela contribui para a discriminação e marginalização de grupos específicos, além de oferecer uma falsa sensação de segurança para outros.” Márcia completa afirmando que “as infecções sexualmente transmissíveis (ISTs), podem afetar qualquer pessoa, independentemente de sua orientação sexual, identidade de gênero, idade ou classe social.”

Algumas das infecções como o HPV e o HIV, por exemplo, não possuem cura mas podem ser evitadas por meio de preservativos, tanto masculinos quanto femininos, além do tratamento exclusivo para HIV, como a PrEP (Profilaxia Pré-Exposição) que é utilizada para pessoas que possuem risco de ter sido expostas ao vírus mas não estão contaminadas, e a PEP (Profilaxia Pós Exposição), que é um tratamento emergencial que dura 28 dias e deve ser iniciado o mais rápido possível. Esses tratamentos são oferecidos de forma universal e gratuita pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

foto: Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (febrasgo)

O uso de preservativos é essencial para evitar as infecções. A infectologista diz que “do ponto de vista médico e de saúde pública, a escolha de não utilizar métodos de proteção, especialmente entre pessoas sem um parceiro fixo, é uma preocupação significativa”.

A homofobia e o HIV no Brasil no fim do século XX

Em 1980, a AIDS chegou ao Brasil, tendo seu ápice na década de 90 quando mais de 6 mil casos foram registrados no país, ocasionando a morte de artistas como Cazuza e Renato Russo.

Junto à crescente do HIV nessa época, a população começou a responsabilizar e perseguir a comunidade LGBTQIA+, principalmente os homossexuais, chegando a apelidar pejorativamente a infecção de “peste-gay”, termo homofóbico que não está mais em uso atualmente.

Cartaz de jornal brasileiro da década de 1980 (foto: reprodução/O Globo)

Na época, a AIDS era fatal e não tinha cura, o que causou uma grande preocupação tanto na sociedade, que começou um movimento ativista, quanto no governo, que começou a distribuir gratuitamente remédios antivirais em 1991.

Fundado em 1988, o dia 1º de dezembro ficou conhecido como o Dia Mundial de Luta Contra a AIDS, dando início ao mês de conscientização da AIDS e de outras ISTs, o Dezembro Vermelho.

Apesar do HIV ainda existir e a luta contra o preconceito e a infecção permanecer ativa, hoje em dia uma pessoa soropositiva vive uma vida normal e sem grandes dificuldades por conta dos avanços na medicina.

As ISTs dentro da comunidade LGBTQIA+

O preconceito dentro da própria comunidade é algo pouco dito, e para o influenciador soropositivo Jon Diegues “muitas pessoas da comunidade não gostam desse assunto e o evitam”, muitas vezes por medo de contrair alguma infecção ou até mesmo por preconceito dentro da comunidade.

A ideia de que apenas o público LGBTQIA+ está em risco é precipitada e equivocada, e segundo a médica Márcia Lima essa visão “desvia a atenção e o cuidado que pessoas heterossexuais e outros grupos também precisam adotar para sua saúde sexual”. Além disso, o estigma “limita o acesso ao diagnóstico precoce e ao tratamento, pois muitas pessoas evitam fazer testes e buscar informações por medo de julgamentos”.

Apesar do estigma que ocorre na comunidade, cerca de 186,6 mil casos de HIV registrados no Brasil desde 1980 são de pessoas homossexuais ou bissexuais, e 406,2 mil casos são de pessoas heterossexuais, segundo o Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids (UNAIDS).

A banalização e fetichização das ISTs

Pouco se diz sobre a parcela da população, principalmente de homens, que preferem se relacionar sem o uso de qualquer prevenção, seja antes ou depois da relação, sem se importar com a possível contaminação das infecções. Segundo a UNAIDS, Homens são menos propensos a buscar tratamento para HIV e têm mais chances de morrer por causas relacionadas à AIDS.

A falta de informação é um fator que agrava o número de casos que ocorrem no Brasil e no mundo, pois apesar da divulgação sobre prevenção das infecções, já que em lugares com classe social menor o acesso à informação acaba sendo menor.

Além da banalização, outro problema é a fetichização da transmissão de ISTs por pessoas que sentem excitação em passar infecções, chamados popularmente de carimbadores, que usam dos aplicativos de relacionamento para intencionalmente transmitir o vírus e muitas vezes se identificando com emojis específicos, como o de um escorpião. A transmissão de Infecções Sexualmente Transmissíveis é crime perante a lei nº 2.848/1940.

É de extrema importância a educação nas escolas e o ensino à prevenção e os cuidados que devem ser tomados, não só a população LGBTQIA+ mas também para os jovens em geral, podendo diminuir gradualmente o número de casos de infecções sexualmente transmissíveis.

Direitos e proteções legais

Em 1989, foi aprovada a Declaração dos Direitos Fundamentais da Pessoa Portadora do Vírus da Aids, que garante que pessoas com AIDS possuam legalmente o direito à informação, assistência e distribuição gratuita do tratamento, garantindo uma melhor qualidade de vida.

A declaração também garante que todo portador do vírus da aids tem direito à participação em todos os aspectos da vida social. Toda ação que visar a recusar aos portadores do HIV/aids um emprego, um alojamento, uma assistência ou a privá-los disso, ou que tenda a restringi-los à participação em atividades coletivas, escolares e militares, deve ser considerada discriminatória e ser punida por lei.

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