Por Gustavo Rodrigues
O subgênero literário chamado de dark romance tem ganhado cada vez mais destaque na literatura contemporânea, atraindo leitores para as histórias sombrias e violentas que caracterizam o estilo e gerando debates acerca do público jovem que o consome e o que seria ou não prejudicial para o público.
O termo pode ser entendido como “romance sombrio” e compreende um subgênero da literatura de romance caracterizado por suas tramas sombrias e personagens com traumas profundos, muitas vezes utilizando da descrição de atos de sexo e violência, ao explorar temas como amor, obsessão e luta entre o bem e o mal.
“Eu definiria o dark romance como um ‘submundo’ dos gêneros literários, como um local de liberdade de expressão total, onde as escritoras podem escrever fantasias sexuais e mostrar sua liberdade sexual nos livros, com um toque meio fantasioso ou perturbador. Tem que ter essa coisa sombria, insana, errada”, diz Giovanna Custódio Marçal, estudante universitária e leitora de dark romance.
O dark romance ganhou destaque nos últimos anos. Basta procurar pela hashtag #darkromance na barra de busca de redes sociais como TikTok e X para se deparar com mais de um milhão de postagens sobre o gênero. Além disso, essa vertente dos livros de romance tem ganhado espaço no mercado editorial, com editoras especializadas em tais temas, como a editora Fruto Proibido, por exemplo.
Com uma rápida pesquisa no Reddit, rede social que permite discussões entre os usuários, é possível observar os diversos debates sobre o tema: alguns defendem, dizendo que é apenas literatura, enquanto outros fazem críticas e questionamentos. “É um gênero muito julgado, porém muito lido também”, conta Giovanna.
A literatura de dark romance se apresenta com alguns elementos que despertam o interesse do público – formado majoritariamente por mulheres jovens –, o principal apelo do gênero é a capacidade de gerar emoções intensas em quem os lê. A dualidade do bom e do ruim, do amor e da dor, gera uma espiral de sentimentos complexos nos leitores, que podem explorar desejos e medos profundos em um espaço seguro e sem consequências na vida real. “As mulheres jovens consumirem isso [dark romance] já começa porque são exatamente elas que precisam de algumas fugas, geralmente são elas que são mais oprimidas”, diz a psicóloga comportamental Júlia Sanchez Assunção.
Em entrevista, Giovanna falou um pouco sobre seu interesse no romance sombrio. “O que mais me atrai nestas histórias é essa coisa mais sombria e perigosa das relações. Me atraiu por ser algo como uma experimentação do errado na ficção, sem consequências na realidade”, ela explica.
Também é muito comum as autoras destes livros se basearem em histórias já conhecidas para criar uma adaptação e criar seu conteúdo autoral. O livro Meu Romeu Sombrio, de L.J. Shen e Parker S. Huntington, publicado pela HarperCollins por meio do selo de literatura feminina, Harlequin, é uma espécie de releitura de A Bela e a Fera. “As autoras utilizam muito inspirações de histórias épicas, como Hades e Perséfone”, diz Giovanna.
Um dos principais argumentos daqueles que se posicionam contra o subgênero do dark romance é que as histórias desses livros comumente degradam a imagem da mulher ao utilizar da descrição de violência e humilhação das personagens femininas e são uma mão contrária a todo o movimento feminista e suas conquistas.
“Eu acho isso [o consumo de dark romance] um pouco perigoso porque, de certa forma, é uma mão contrária em relação ao que estamos tentando fazer, deixar as mulheres preparadas para identificar o que é um abuso, o que é um desrespeito”, diz a psicóloga Júlia Sanchez Assunção.
Sobre essa crítica em relação à degradação das mulheres, Giovanna discorda. “Não são todos os livros que degradam as mulheres. Os que eu mais leio são aqueles que as mulheres sabem o que elas querem. Nos livros que eu leio, as mulheres são poderosas. Por exemplo, no livro Perseguindo Adeline, um dos meus favoritos, a personagem passa por muita coisa e mesmo assim ela sabe o que ela quer e luta para conseguir, ela que está no controle da situação”, explica ela.

A estudante ainda explica e complementa com sua opinião sobre o gênero ser uma mão contrária ao feminismo e deixa um adendo para evitar histórias realmente problemáticas. “Eu não acho que as histórias de dark romance estejam contra a corrente do feminismo, porque mostra que as mulheres também têm e podem ter desejos assim como os homens. E eu também sempre tomo muito cuidado ao escolher os livros para não acabar com leituras com temas muito pesados e até criminosos”.
Outro ponto de questionamento dos contrários ao consumo do dark romance é o perigo da leitura e as consequências que ela pode gerar na formação dos jovens, ao se depararem com descrições explícitas de violência, humilhação e relacionamentos abusivos.
Sobre isso, Juliana expressa sua opinião enquanto profissional da psicologia. “Acho que tudo bem ter literatura de todo tipo de tema. Eu acho que está tudo bem ler esses livros se você já tem consciência de si, se você sabe que aquilo é ficção, algo fora da realidade. Mas quando se fala de jovens e adolescentes, é uma fase complicada e não dá para saber o quanto eles têm consciência sobre o que estão consumindo. O fato de o público consumidor é majoritariamente feminino é muito interessante porque normalmente são as meninas mesmo que precisam de uma fuga, então eu acho que essas leituras são perigosas”.
A estudante Giovanna também fala um pouco sobre sua experiência com a leitura dos romances sombrios. “No meu caso, eu comecei a ler ainda menor de idade, mas eu fui criada com uma boa educação sexual e não queria recriar nenhuma cena ou situação desses livros que fogem da realidade. Porém, para as jovens que não são bem resolvidas e bem introduzidas aos conteúdos sexuais e que leem e fantasiam que as relações devem ser dessa forma, acho totalmente prejudicial”.
A literatura se modifica ao longo do tempo, ao passo que a sociedade também se transforma. Por muito tempo as pessoas, principalmente mulheres e meninas, se depararam com este lado romântico e, até mesmo irreal, da vida com os contos de fadas da Disney e das músicas de amor. Agora as jovens encontram um produto cultural que mostra outro lado da realidade, a violência e os relacionamentos abusivos, muito condizentes com a realidade atual em que as mulheres têm mais liberdade de explorar seus gostos e questionar as opressões.
