Entenda como o crime do garimpo ilegal destrói nosso bioma e as suas consequências à sociedade
Por Maria Paula Bertozzi
O Pantanal está presente nos estados do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul e se consagra como a maior planície alagável do mundo, sendo ponto de encontro de três biomas importantes para o Brasil: Amazônia, Cerrado e Mata Atlântica. Apresenta também uma rica fauna, abrigando grande parte dos animais no país, como a onça-pintada, a ariranha, o jacaré-do-pantanal e o tamanduá bandeira.
Mesmo sendo considerado o bioma mais preservado do Brasil, o garimpo ilegal o assombra, causando sua degradação e afetando diretamente a fauna, a flora e a população do país todo com suas consequências.
Um dos principais prejuízos do garimpo ilegal à sociedade são as questões trabalhistas. “A mineração ilegal possui a característica de um trabalho violento, forçado e explorado, sem a proteção trabalhista”, afirma Patrícia Marques, geógrafa formada pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp). “Por ser ilegal, acaba não seguindo toda segurança que deveria, então a exploração, pensando no trabalhador, é absurda”, complementa a geógrafa.
O garimpo ilegal promove as mais diversas degradações no meio ambiente, como o desmatamento, queimadas, contaminação da água e do solo por metais pesados, principalmente o mercúrio, e assoreamento dos rios que é o acumulo de sedimentos no leito dos rios, causando a perda da qualidade da água.
As consequências da degradação do Pantanal surgem a curto e longo prazo. Em um período pequeno ocorre a perda da vegetação nativa, que leva a péssimos resultados. “A perda de vegetação nativa é ruim em qualquer bioma que tenha uma considerável presença de cobertura vegetal”, expõe Luan Pasquetta, biólogo e mestrando em Conservação e Biodiversidade pela Universidade Estadual de Londrina (UEL).
“São três fatores (que acontecem com a perda da vegetação nativa): diminuição da superfície de transpiração, as plantas soltam água para a atmosfera, regulando a umidade. Diminuição da superfície de sequestro de carbono, as plantas convertem o carbono químico atmosférico em orgânico. Diminuição da absorção de água, uma vez que as plantas seguram o excedente de água da chuva no solo, possibilitando o abastecimento de água subterrânea, que mais tarde vão resultar na vazão das nascentes”, explica Pasquetta.
Marques foi além e explicou que o garimpo ilegal pode gerar impacto em todo mundo, não só no Brasil e nos países sul-americanos.“A longo prazo, o solo vai ficando cada vez pior, a qualidade das águas vai piorando cada vez mais e isso afeta o microclima, que afeta a massa de ar que está ali que vai ter uma consequência para o país e uma consequência global”, complementa Patrícia Marques.
Outra decorrência causada pela mineração ilegal é a contaminação por mercúrio que é altamente agressivo para os seres vivos. O metal é utilizado para realizar a amálgama, que é a junção do mercúrio com o ouro para realizar a separação do metal precioso dos sedimentos que foi extraído.

áREA DE GARIMPO ILEGAL (fOTO: rEPRODUÇÃO/CNN)
Após esse processo, a amálgama é aquecida e o mercúrio é lançado na atmosfera, caindo na água e no solo. “Na água, ele (mercúrio) se torna biodisponível. Os peixes e toda comunidade aquática vai se intoxicar”, ilustra Jakson Ferreira, biólogo e mestre em geografia pela Unesp. “Essa intoxicação vai para o fígado, sistema nervoso central e vai ocorrendo a bioacumulação, ou seja, um peixe menor está contaminado, um peixe maior o come e um agricultor come esse outro peixe. Com o tempo vai fazendo esse processo de bioacumulação do mercúrio”, detalha o biólogo.
Jakson também explica quais problemas o mercúrio pode causar no corpo humano. “Pode causar disfunções no sistema nervoso, alteração genética, sistema cardiovascular, sistema renal”, informa.
Além dos problemas ambientais causados pelo garimpo ilegal, existem adversidades sociais e econômicas. Essa atividade promove diversos crimes, como tráfico de armas, corrupção, lavagem de dinheiro, sonegação fiscal e uso de documentos falsos.
Em setembro de 2024, a Polícia Federal (PF) desativou um acampamento de garimpo ilegal no Pantanal, próximo à Reserva do Bananal, na área rural de Pontes e Lacerda. Durante a operação, foram apreendidos ouro, um veículo, frascos de mercúrio e o que mais chamou a atenção, explosivos e uma carabina de pressão.
Em 2023 o número de pessoas indiciadas pela PF cresceu 125% em comparação a 2022. Porém ao analisar a quantidade de indivíduos, nota-se que é um número baixo. No ano passado, 61 pessoas foram denunciadas pelo crime de executar pesquisa, lavra ou extração de recursos minerais sem permissão, já em 2022 foram 27 pessoas denunciadas.
A análise desses números demonstra como as fiscalizações do garimpo ilegal são fracas e ineficazes, mesmo existindo leis e punições. Patrícia Marques opinou sobre um dos motivos para que os criminosos continuem explorando as brechas na legislação brasileira. “Nossa legislação abre muita margem para que isso aconteça e o lucro é o que move o mundo hoje”.
Ela explica também que as fiscalizações não afetam os garimpeiros. “A multa que existe para os grandes empresários não vale a pena, porque o lucro é muito maior”, explica Patrícia, que vai além e expôs outro grande problema: além das multas de baixo valor e brechas na legislação existe a corrupção dos agentes responsáveis. “Existe uma corrupção muito grande, existe suborno por trás do sistema”, finaliza.
Na economia local, a mineração ilegal traz grandes malefícios. A destruição do bioma afeta diretamente os povos locais que se utilizam da fauna e da flora para sua renda e subsistência. Também é gerado empregos informais e de baixo salário. “Essa pessoa não ganha uma renda suficiente, não irá consumir, ficará presa naquele trabalho e perderá essa pessoa para movimentar a economia”, explicita Marques.
“Não promove desenvolvimento social e econômico. No garimpo ilegal o dinheiro vai para a pessoa que está ali tratando dessa mineração”, diz Patrícia. “Colaborando para a concentração de renda que a gente possui, levando a um país cada vez mais prejudicado economicamente e ambientalmente, com mais exploração de trabalho”, complementa a geógrafa.
