Após levantamento dos resultados das eleições municipais de 2024, percebe-se um maior crescimento de partidos políticos de direita e declínio da esquerda.
Por: Alice Burégio Portugal
Logo após cômputo do primeiro turno das eleições municipais no Brasil terem sido divulgados dia seis de outubro, foram feitos alguns levantamentos por jornais – como Globo e Folha de São Paulo – que comprovam a ascensão da direita, com partidos políticos como PL e União Brasil estando cada vez mais presentes na realidade brasileira, enquanto que a esquerda sofre um declínio de eleitores em potencial. De acordo com dados do jornal digital poder360, prefeitos de direita tiveram um aumento de 5% com relação a 2020, resultando em um total de 2.626 cidades com prefeitos que seguem essa ideologia, enquanto que de esquerda caiu 13%, com 742 atualmente.
Através destes dados, percebe-se que o Brasil, principalmente São Paulo, está cada vez mais sendo dividido, onde eleitores de um partido específico de direita ou esquerda divergem suas opiniões, contribuindo para o crescimento da polarização política e, consequentemente, dividindo o Estado em dois extremos.
Para poder entender os dois lados de alguém autodeclarado de direita e alguém de esquerda, o Jornal Contexto entrevistou um professor de história, militante filiado ao PSOL, de esquerda, um vereador do partido NOVO, de direita, e um profissional com experiência em Ciência Política para explicar o Brasil atual e as tendências para o futuro.
Renan Nobre, professor de história formado pela universidade UNIFAI (Centro Universitário Assunção) e militante filiado ao PSOL, após ser questionado sobre o porquê da direita ter crescido mais do que a esquerda, de ter uma maior aproximação com as pessoas, cita o sentimento dos cidadãos após governos passados. “Acho que tudo o que aconteceu nos governos anteriores de corrupção, principalmente do PT, em 2018, deu margem para que pessoas como Bolsonaro crescessem. Eu acredito que o principal motivo desse crescimento da direita é que eles exploram o desejo de mudança que a população tem”.
Ele emenda falando sobre a não reeleição do ex-presidente da República, Jair Bolsonaro, que aconteceu, de acordo com o historiador, por conta da percepção das pessoas dele ser mais do mesmo, mais do sistema, apesar do crescimento da direita. “A gente vê muito isso nas eleições municipais atuais com o Pablo Marçal. Eles viram esse sentimento de mudança com o sistema do Bolsonaro e agora com Marçal”.
Já para Eduardo Borgo, vereador do partido NOVO de Bauru, autodeclarado de direita e conservador, diz que o crescimento da direita aconteceu porque as pessoas queriam – e ainda querem – se aproximar dos valores cristãos novamente e se afastar da corrupção que, de acordo com o vereador, existia muito nos governos passados. “Nós vivemos num país onde a maioria é cristão e esses princípios de Deus, de pátria, de família, de liberdade, são valores cristãos. A maioria dos brasileiros se apoia nesses valores, já a esquerda luta contra a família, contra a instituição familiar, ela não apoia a instituição familiar e nem a propriedade privada”.
Para o vereador, a esquerda não cresce pois não prega aquilo que manifesta. “Como é que a esquerda vai defender, por exemplo, o combate ao crime organizado quando no seio desse grupo está a união com o crime organizado?”.
Em contraste, Glauco Peres, professor livre-docente do Departamento de Ciência Política da FFLCH/USP (Universidade de São Paulo), encaixa as duas colocações e explica o porquê do Brasil estar sofrendo essa polarização política, o porquê da direita ter crescido mais e como a divisão política atual no Brasil está afetando diretamente o modo das pessoas pensaram e, consequentemente, na liberdade de expressão.
“O que a gente está vendo no Brasil desde 2017, 2016, é uma organização, uma direita se organizando eleitoralmente. Parte do eleitorado também se decepcionou com a esquerda, se decepcionou com o PT, e por isso resolveram votar na direita, por não querer votar na esquerda. E, do ponto de vista dos políticos, eles estão se organizando. Eles entenderam que podem usar essa bandeira”, contextualiza. Ele destaca também a questão da afinidade, dos eleitores votarem em figuras como o Bolsonaro e Pablo Marçal por acreditarem nos mesmos ideais e pelas suas influências nas redes sociais.
Para ele “isso acontece pelo uso das redes sociais. Tem uma dinâmica de proliferação de temas e de discussões que acontecem ali ou ganham projeção, que repercutem no resto do mundo político. O Pablo Marçal é um exemplo disso”.

O professor da USP Glauco Peres (Foto: FFLCH/USP)
Apesar do comentário, o profissional explicita que Pablo Marçal teve, de fato, grande evidência nessa eleição, porém esse fenômeno não deve se repetir. Para ele, os políticos declarados de direita não irão deixar Marçal ficar em evidência. A divisão da direita que ocorreu em São Paulo, com a polêmica do Marçal não ganhando apoio do Bolsonaro e a divisão do Nunes e Marçal no primeiro turno, para Glauco, não irá trazer desavenças significativas para direita no futuro.
Em complemento à fala de Glauco, Renan Nobre diz que Pablo Marçal foi alguém inesperado e que, para ele que dá aula, o político possui grande influência nas crianças, principalmente por usar as redes sociais. “Ele tentou o apoio do Bolsonaro, que na verdade não veio, e mesmo assim, ele tornou-se uma pessoa muito grande, por conta da questão da comunicação. As pessoas o enxergam como um cara entrando na política para fazer o bem, já que ele já tem dinheiro e não precisava disso, diferente do Nunes que está muito envolvido com a política. E isso acabou dividindo o primeiro turno. Essa foi a grande questão”.
Porém, o professor frisa que, apesar da divisão do primeiro turno nas eleições municipais de São Paulo, no segundo turno, grande parte dos eleitores do Pablo Marçal estão inclinados a votar no Nunes, juntando novamente a direita. Isso se comprova após resultados de domingo, 27, com vitória do Nunes.
Com a vitória de Ricardo Nunes (MDB), percebe-se novamente a ascensão da direita. Apesar de o MDB ser considerado um partido de centro que abriga deputados de direita e esquerda, o atual prefeito teve grande apoio do Bolsonaro, declarado oficialmente de direita, e compactua com os mesmos ideais. Os partidos políticos no Brasil são associados, variadas vezes, a ideologias específicas.
Para o vereador do partido NOVO, “dificilmente você vai ter um partido que mais se aproxima da ideologia de direita, o mais próximo é o NOVO. O restante você tem filiados, deputados que têm ideologia, mas o partido total não tem como. São várias diferenças”.
Eduardo ainda complementa a sua fala citando como exemplo o PL, hoje por muitos considerado um partido de direita, para o vereador, apesar de ter vários deputados e senadores de direita, também tem dentro do partido deputados e senadores que apoiam a esquerda. O político diz que a direita vai continuar crescendo nos partidos políticos e que, de acordo com Eduardo, a esquerda irá ajudar. “Quando eles usam o judiciário, por exemplo, para perseguir a direita, só faz com que a direita cresça ainda mais. Eles estão querendo prender o Bolsonaro e vão transformar ele, agora sim, em um mito”.
Já para Glauco, a direita continuará a permanecer no poder por alguns mandatos se eles se organizarem e continuarem mantendo seus legados. Essa vantagem, em comparação com a esquerda, pode ser maior a depender de como o PT e a esquerda vão se organizar. Para ele “você pode ter de um lado a esquerda se desorganizando e do outro lado a direita tentando se organizar”. De acordo com o especialista, tudo vai depender do sucessor do Lula.
Renan complementa sua fala citando a tendência de crescimento da direita, isso por estarem na periferia de forma diferente, não com o trabalho sindical ou de base cultural, mas através de igrejas evangélicas, coisa que não acontece com a esquerda. “Acho que para a esquerda voltar a crescer, ela precisa entender o momento atual do Brasil e começar com um discurso mais forte, mais revolucionário. Que nem o Bolsonaro e o Marçal fizeram de contra o sistema”.
Para o historiador, o jovem quer mudança, quer revolucionar, quer sair da mesma, e a solução para isso é a esquerda se agitar por mudanças radicais, utilizar um discurso mais revolucionário para não continuar na mesma.
Os resultados do segundo turno das eleições municipais de São Paulo, no último dia 27, com a vitória de Ricardo Nunes, do MDB, que se relaciona com os ideais da direita, comprovam as colocações dos entrevistados.
