Por Ana Helena Masson Maiolino

Jornalista e co-fundador da Alma Preta, Pedro Borges (Foto: Fernanda Sampaio/ACI FAAC)

A diversidade e a inclusão mudaram profundamente a universidade brasileira. O ponto de partida foi a Lei de Cotas, sancionada em agosto de 2012, que garante a reserva de, no mínimo, 50% das vagas de cada universidade em cada curso. A partir dela, pessoas pretas, pardas, de baixa renda e vindas do ensino público conseguiram ocupar mais – ainda que seja pouco – esse espaço. Alvo de discussão, dentro e fora, das instituições de ensino, é fato incontestável que ela alterou a comunidade universitária.

A Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), foi massivamente alterada. O vice-diretor da Faculdade de Arquitetura, Artes, Comunicação e Design (FAAC), do campus de Bauru, Prof. Dr. Juarez Tadeu de Paula Xavier, conta, em entrevista, que, especialmente a FAAC mudou drasticamente. “Nossa faculdade não tinha alunos de escola pública, hoje nós temos mais de 50%. Nossa faculdade não tinha pretos e pardos, hoje são ⅓ da população da faculdade”, afirma. Ele complementa: “a diversidade e a inclusão mudaram a faculdade” e reitera que, hoje, a FAAC é uma outra instituição, com outras pessoas e outras necessidades.

Juarez foi muito importante para a consolidação de inúmeros movimentos sociais, dentro e fora do campus, e pode-se dizer que até na mudança de vida de alguns estudantes. Dentre eles, Pedro Borges, co-fundador da agência de notícias Alma Preta. Jornalista formado pela Unesp de Bauru, Pedro conta que sua vida mudou muito depois que conheceu o professor.


Quando criança, tinha o sonho de ser jogador de futebol, que, desde sempre, proporcionou momentos de muita felicidade, alegria e liberdade para ele. Entrou em jornalismo, com uma paixão inexplicável pela área esportiva. No entanto, sua carreira tomou outro rumo, em 2015, quando, a partir das provocações do professor Juarez, formou-se um coletivo de estudantes negros. Pedro conta que aquilo mudou a leitura dele do dia a dia e do jornalismo.

Mal sabia que, a partir daí, ele se tornaria um dos grandes nomes e referências do  jovem jornalismo brasileiro. Junto de mais três unespianos, ainda em 2015, ele fundou a Alma Preta, um dos maiores veículos da chamada “mídia alternativa” do Brasil. “Independente do que eu vou fazer, ou não, da minha vida, é a contribuição mais importante que eu dei para a sociedade e para o jornalismo, foi ter participado da criação da Alma Preta”, comenta orgulhoso e com carinho.

Os pais de Pedro foram peça chave dessa história. Quando criança, a família passava sérias dificuldades financeiras, na periferia da zona norte de São Paulo. Os pais eram organizadores políticos do bairro e o levavam para reuniões do Partido dos Trabalhadores (PT) e de movimentos sociais, o que contribuiu para a formação do menino.

Já adolescente, mudou-se para Bauru ao ingressar na faculdade, por uma questão geográfica, e teve que trabalhar para se sustentar. A ideia era ser jornalista esportivo, para não precisar se afastar do futebol. 

No entanto, os caminhos foram alterados. A princípio, um fator de muito incômodo para o jovem era a ausência de professores negros na universidade. A única referência que ele tinha era o Juarez. Possíveis políticas públicas que tornassem o ensino público superior mais equivalente e diverso foram fulcrais para que Pedro se envolvesse definitivamente.

A partir da criação do coletivo de estudantes negros da Unesp, Pedro Borges, Vinícius de Araújo, Vinicius Martins e Solon Neto, com o apoio da única referência que eles tinham, criaram a Alma Preta, agência de notícias que traz coberturas da realidade brasileira a partir do olhar de jornalistas negros. 

O veículo cresceu e diversificou a mídia. Pedro começou a se envolver com o lado político do jornalismo e a se interessar pela violência policial na capital paulista. Ele conta que tem sua identidade jornalística quase sempre questionada e já foi desrespeitado diversas vezes, por “não parecer jornalista”. No entanto, ele conta que as “desigualdades são aquilo que me move”, e é por isso que ele continua.

Segundo ele, a maior dificuldade do projeto é o dinheiro. Como um projeto independente, a agência não recebe apoio privado, como os grandes veículos, e enfrenta dificuldades para se manter, já que conta com uma equipe de mais de 30 pessoas distribuídas em cinco estados diferentes: São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia, Pernambuco e Pará. A Alma Preta conta com o apoio de instituições nacionais e internacionais, além dos assinantes.

Quando relembra os anos de faculdade, Pedro conta que não foi um aluno exemplar, mas que, mesmo assim, aproveitou bem os anos em Bauru. Algumas das atividades foram reuniões do centro acadêmico, papos com o coletivo de estudantes negros, treinos de futsal, interunesp (Ointer, atualmente) e festas. “Tem uma capacidade que a universidade pública desenvolve que é uma habilidade social e isso é muito importante para o jornalista”, explica. Ele reitera que é necessário ter “jogo de cintura” e “malandragem” para seguir na profissão. 

A partir disso, entende-se que Pedro Borges é um grande nome do jovem jornalismo negro e que é referência para inúmeros jovens pretos, pobres e periféricos. Símbolo de superação, evolução e progresso, Pedro carrega uma mala cheia de histórias, ensinamentos e experiências por onde passa. Pedro, então, cumpriu – e continua cumprindo- seu papel de ajudar seus pares e seus iguais.

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