Por Raíra Tiengo

É estranho. Eu não entendo porque ela está trancada no banheiro há tanto tempo. Sinto que estou ouvindo barulhos de choro vindo por detrás da porta do banheiro. Será que minha humana está bem? Eu, como seu gato, queria poder ajudá-la mais. E, por isso, quando ela finalmente deixa o cômodo, os olhos inchados juntamente do resto de seu rosto, que pipoca em vermelhidão, fungando vez ou outra e passando as costas da mão destra em seu nariz, não penso duas vezes em me aproximar dela e me atirar em seus pés. Fico de barriga para cima, implorando por carinho e atenção para que consiga distraí-la.
Porém, ela me ignora. Eu não estou acostumado com isso. Hoje faz quatro anos que estamos juntos e eu sou grato a ela por tudo, por que ela não é grata a mim também? Eu não faço o suficiente como seu gato?
Observo ela lentamente se jogando na cama, repleta de bichinhos de pelúcia ainda que ela esteja na faculdade, um ponto que não posso deixar de achar minimamente fofo. Eu tenho um favorito: o coelho rosa com olhos grandes e sorridentes. Sempre me deito ao lado dele quando quero estar ao lado de minha humana na cama. E assim eu o faço, acompanhando-a para garantir seu bem estar. Infelizmente, não possuo polegares opositores para lhe trazer um copo d’água, tampouco a capacidade de ter um diálogo e lhe dar conselhos, mas eu sempre posso ouví-la.
E eu sempre quero ouví-la. Amo o som da voz da minha humana. Toda vez que ela chega de suas aulas, eu faço questão de subir na bancada da cozinha para recebê-la apenas para que ela fale comigo e me pegue no colo.
Mas eu não posso fazer o mesmo com ela. Eu sou apenas o seu gato, e tudo o que posso fazer é lhe oferecer minha presença como uma bola de pelos fofinha em dias onde a chuva melancólica cai e, não apenas seu barulho, como também o seu cheiro, invade o quarto de paredes rosas e levemente manchadas pelo tempo. Ou quando eu me esfrego por elas estando totalmente sujo depois de uma tarde brincando na terra pela área do condomínio.
E, em instantes, assisto-a dormir, mais uma vez sem poder lhe perguntar como foi seu dia. Quando ela vai reconhecer que quero escutar sobre as menores coisinhas? Achei que a barata que levei-lhe de presente na semana passada havia deixado isso claro…
