GT “Comunicação e Decolonialidade” discutiu a disputa de espaços e os novos direcionamentos das narrativas jornalísticas

Trabalhos de Jeniffer Cavalcanti, Alan Tomaz e Letícia Ramalho apresentados no XVII Congresso da Alaic

Texto e foto de Giulia Morais 

Bauru, 21/08/2024. “É preciso disputar esse espaço para que no jornalismo caiba todos”. A frase que encerrou o segundo dia do GT 23 é de Vêronica Maria Alves Lima, jornalista e doutora em Comunicação pela Universidade Federal Fluminense (UFF), que coordenava a sessão das 14h às 17h, desta quarta-feira, 21. Tanto para ela, quanto para o grupo, é necessário que a Comunicação como um todo seja mais plural e traga novos olhares.

A sessão foi dividida em duas partes, contando com três projetos na primeira rodada e dois projetos na sequência. A primeira pesquisa apresentada foi sobre a “Desumanização no jornalismo hegemônico brasileiro: a histórica única no caso dos meninos de Belford Roxo” , exposta pela mestranda em Jornalismo da UFRJ Jeniffer dos Santos Cavalcanti e a doutora em Comunicação pela UFMG Pâmela Guimarães da Silva.

Ao dizer que “as histórias são definidas pelo poder”, a pesquisadora Jennifer explica que a colonialidade é uma “lógica da desumanização”, pois naturaliza as hierarquias e os preconceitos advindos dela. Para enfatizar esse pensamento e o quão prejudicial ele pode ser ao contar uma situação a partir de apenas um ponto de vista, a jornalista relembra o caso dos três meninos de Belford Roxo (2020-2021) e analisou como foi a cobertura feita pelos jornais “Globo” e “Folha de São Paulo”. 

Com o estudo foi possível perceber dois aspectos que influenciavam a narrativa: a localização geográfica da Baixada Fluminense e a racialidade dos garotos. Esses pontos foram decisivos para entender o enredo fortemente associado à pobreza e a violência que foi construído pelos veículos comunicativos. 

Por fim, para as expositoras o caso mostra o impacto dessas características terem mais visibilidade do que outras e no que isso interfere negativamente na narrativa e na compreensão dos leitores sobre esse cenário,além de reproduzir padrões de raça, gênero e classe. 

Na segunda apresentação, o doutorando no Programa de Pós-graduação em Mídia e Tecnologia, Alan Tomaz de Andrade, nos convidou a refletir sobre “Jornalismo, algoritmos e opressões contra população negra: como a automatização na produção e distribuição de notícias intensifica o racismo estrutural brasileiro”. O tema discute como esses elementos fornecem sentido, lógicas e tecnologia para reproduzir formas de desigualdade e violência que moldam a vida social contemporânea. 

Para Alan o epistemicídio é uma lógica de construção de uma informação com “produção e programação racista” que reforça estereótipos historicamente noticiados na midia que também “inviabilizam as contribuições da população negra” para resistir e reexistir nesses espaços.

O pesquisador acredita que “o algoritmo não é racista, mas as pessoas são racistas” e por esse motivo é essencial que sejam criados os “quilombos midiáticos”(termo que se refere à mídias negras alternativas), como forma de fortalecer as bases de dados das inteligências artificiais. Além disso, o doutorando afirma que a sociedade precisa “entender o que é e como é que funciona esse racismo algorítmico” para depois “educar o olhar das pessoas” sobre isso.

No encerramento da primeira sessão, o último trabalho foi da pesquisadora e professora  da Faculdade de Arquitetura, Artes, Comunicação e Design (FAAC) da Universidade Estadual Paulista (UNESP) Raquel Cabral e pela mestranda em comunicação pela Unesp, Letícia Ramalho da Silva. O tema da pesquisa é “Sumaúma: jornalismo do centro do mundo: contribuições para um jornalismo decolonial em tempos de desinformação e mudanças climáticas”.

O estudo analisa como as crises climáticas são noticiadas no jornalismo hegemônico e faz uma crítica ao modo difuso e de pouco aprofundamento que as mídias tradicionais apresentam a temática ambiental. Para além dessa discussão, elas apresentam o exemplo do portal jornalístico Sumaúma, feito por povos da Amazônia que rompem com essa mídia colonial, ao abordar com clareza e mais veracidade sobre as realidades vividas nesse cenário que em mídias famosas costumam ser ignoradas.

As estudiosas dizem que é “preciso mudar a linguagem para transformar as perspectivas” e desse modo, modificar também a forma como as notícias são veiculadas para o público, tratando o leitor não apenas como um sujeito consumidor, mas um sujeito cidadão, que se importa com as questões relacionadas ao meio ambiente.

Os pesquisadores Diuan Feltrin e Aline Lisboa durante apresentação

No segundo bloco do grupo temático, foi exposto a pesquisa da Doutora pelo Programa de Mídia e Tecnologia da UNESP, Aline Lisboa da Silva, que apresentou sobre a “Mídia Antirracista no Brasil: o caso da agência de notícias Alma Preta”.

Nesse trabalho a publicitária investiga o discurso antirracista implicado nas matérias produzidas por essa agência, quais são os critérios de noticiabilidade e como esse jornalismo independente traz um outro olhar que disputa com o jornalismo colonial e tradicional, além de suas contribuições para o processo decolonial.

A última apresentação, intitulada “Para Além dos Centros: vínculos Epistemológicos entre comunicação decolonial e comunicação para a paz”, foi de Diuan dos Santos Feltrin, doutorando em Comunicação pela Unesp. 

Ao abordar os estudos da paz de Johan Galtung, o pesquisador mostra como a violência direta, estrutural e cultural limita os processos de mudança e aponta sobre a comunicação para a paz como uma iniciativa contra esse jornalismo de guerra e violência . 

Para ele isso ocorre “por meio de novos direcionamentos nas narrativas jornalísticas, com maior  pluralidade de vozes historicamente silenciadas”. Ele finalizou dizendo que “esse novo fazer jornalístico representa maior humanização e  equilíbrio nas coberturas jornalísticas, em especial, as de violência”.

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