O projeto fala sobre despedidas, tanto em relações interpessoais, como do mundo que conhecemos.

João Zablonski, integrante do projeto, faz lives constantemente no Instagram, tocando desde Pink Floyd até Lupe de Lupe (Foto: João Zablonski)
João Victor Fortuna
O que acontece quando se faz uma conexão entre Paraná, São Paulo, Espírito Santo e Pará? Um projeto experimental e apocalíptico obviamente. Cada integrante de a terra vai se tornar um planeta inabitável está em uma parte do país, porém nem os milhares de quilômetros de distância foram incapazes de impedir o florescer da banda – o que é curioso, já que de acordo com os rapazes, em um futuro não tão distante, as flores deixarão de enfeitar o planeta terra.
João Zablonski (Paraná), Guilherme Oliveira (São Paulo), Carlos Eduardo (Pará) e Felipe Marré (Espírito Santo). Mesmo de longe, os quatro conseguem transmitir a energia e o ruído que habitam em seus peitos, através de um som melancólico. Instrumentais suaves que escalam a intensidade e transmitem sensações de sufoco e desespero, aliado aos vocais que flertam com os sussurros, trazendo memórias da geração de ouro do Shoegaze. É fácil ouvir e associar com Slowdive e My Bloody Valentine.

a terra vai se tornar um planeta inabitável nunca tocou em um show, devido à distância entre os integrantes (Foto: a terra vai se tornar um planeta inabitável)
O projeto teve suas raízes na rede social X (antigo Twitter) em 2022. Os integrantes mantinham uma amizade virtual e, entre os interesses que compartilhavam, a música estava presente. Eventualmente surgiu a ideia de criar um projeto musical. Um dos integrantes, João Zablonski é compositor, produtor, vocalista e guitarrista dessa aventura e, em entrevista, falou sobre o encaixe da banda em seus primórdios.
“Demorou um pouco para encontrarmos uma sonoridade legal, até que um dia um mostrei uma composição, um membro da banda arranjou e chegamos até a faixa Aiko Tanaka. A partir daí mantivemos a sonoridade parecida , quando a gente percebeu que deu certo, começamos a fazer de forma mais contínua, progredindo, lançando e aperfeiçoando nosso som cada vez mais e estamos aí até hoje”
João conta que tudo foi sempre muito planejado, com uma sonoridade que pudesse transparecer uma melancolia na vida das pessoas e letras com intuito de unir os empecilhos do dia a dia com problemas globais, sem menosprezar as batalhas que cada indivíduo trava todos os dias. A banda trata esses acontecimentos com extrema importância, com o objetivo de atentar as calamidades sociais e ambientais que inevitavelmente afetam a vida de cada ser humano.
Se Carlos decidisse visitar João, ele teria que percorrer mais de 3 mil quilômetros e levaria em torno de 44 horas de carro (Foto: a terra vai se tornar um planeta inabitável)
João explica que o objetivo sempre foi construir um instrumental mais baixo, suave, buscando trazer uma melancolia que ecoasse na vida das pessoas, desde problemas contínuos, do dia a dia, até as situações globais, climáticas e socioambientais. Ele ressalta essa busca em aliar as experiências de cada integrante da banda ao que estava acontecendo no momento, esse contraste define a identidade de a terra vai se tornar um planeta inabitável.
“Nosso último EP, o fim é um começo, aborda a situação climática do mundo, as devastações e o calor, percebemos que alguns jornais diziam que a terra se tornaria inabitável e sentimos que era nossa deixa. O nome da banda carrega esse peso e precisamos colidir a sonoridade com letras que representam temas atuais, dedicamos os nossos esforços para desenvolver um som que representa o choro do planeta terra”.
O processo de composição e produção da banda é feito em conjunto: todos os membros apresentam ideias e propostas para novos projetos, João salienta a importância dessa dinâmica e que esse processo é imensurável. Dessa forma, o desenrolar e o nascer das músicas é bem natural e claro, cada integrante apresenta sua visão, as suas ideias, suas experiências, suas paixões, claro sem receio de experimentar e descobrir novas possibilidades.
João Zablonski costumava ser uma celebridade do X, na rede social ele possuía quase 12 mil seguidores, todavia ele desativou a conta e se tornou low profile (Foto: a terra vai se tornar um planeta inabitável)
“Eu costumo trazer uma composição e todos arranjamos juntos, se a música fluir, incluímos no projeto, caso contrário, ela fica guardada, eventualmente acabamos por utilizá-la em outra oportunidade. Uma das músicas do novo disco estava guardada a um ano e agora vamos usá-la. Sempre nos juntamos e apresentamos as composições, tentamos realizar os arranjos e apenas deixamos fluir. Normalmente eu trago a maioria das composições, porém com a nova formação, todos vão cantar, dessa forma quem vai cantar apresenta a sua composição e assim fica bem legal”.
João conta que suas inspirações não se limitam à cena nacional ou internacional: por ser um apaixonado pela música, ele possui uma gama de referências. A lendária banda mineira Lupe de Lupe e seu vocalista Vitor Brauer estão no topo da lista, além do grupo de Minas Gerais, Zablonski aprecia projetos estrangeiros, como Mineral e Slowdive. Porém, ele prefere se desligar do mundo na hora de compor e não fazer alusões diretas.
“Quando eu vou compor, eu gosto de não me direcionar a um artista que me inspira ou um filme que assisti, gosto de me desligar do mundo na hora de compor e tirar algo da minha cabeça, tento trazer meus pensamentos à realidade. Claro que inevitavelmente eu transpareço algo que consumo nas músicas. No início relacionavam muito a banda ao mangá Oyasumi Punpun, o nome da banda foi inspirado na obra e no começo fazíamos referências, porém não nos prendemos a isso”, revelou.
Parte de Oyasumi Punpun, mangá japonês bastante popular que inspirou a banda, imagem do protagonista Onodera Punpun está presente em algumas capas do projeto (Foto: Oyasumi Punpun de Inio Asano)
A cena underground brasileira do rock está em ascensão e engloba diversos subgêneros distintos, desde o Rock triste, Emo Caipira até o Shoegaze. Apesar da sonoridade distinta, os artistas são muito unidos, interagem constantemente e estão sempre aptos a ajudar e contribuir uns com os outros. No seu EP mais recente, atvstupi (a terra vai se tornar um planeta inabitável), trouxe Caru do projeto musical Magnólia para colaborar no novo lançamento. Caru apresentou uma dinâmica interessante que casou muito bem com atvstupi, com a adição de seus característicos gritos e vocais rasgados, como é possível ouvir em Memórias Póstumas.
“Eu chamei o Caru e começamos a conversar um pouco antes de finalizar o EP, ele me mandava umas músicas e depois pedia que escrevesse umas letras e eu mandava, na faculdade mesmo, eu juntava as minhas ideias. Nossa conexão foi imediata, percebi que estávamos construindo algo especial. Fomos trabalhando, trabalhando e nesse processo entramos no Selo Quituts e dessa forma criamos uma amizade, pretendo trabalhar mais vezes com ele”.
Caru do grupo Magnólia, esteve presente no EP mais recente de atvstupi, o fim é um começo (Foto: Caru)
João conta com alegria sobre como é ser um dos precursores da cena no Brasil, atualmente o cenário é muito amplo, são muitas bandas surgindo das mais diversas vertentes, ser um dos pioneiros dentro da cena, é motivo de muito orgulho para ele. Zablonski reflete que quando o grupo lançou o primeiro disco, existiam poucas bandas, projetos foram nascendo e se inspirando, e eventualmente começaram a se enturmar. Hoje a união pode ser presenciada, através do Selo Quituts.
Selo Quituts é um conjunto do interior de São Paulo que incentiva e fomenta a cena cultural de música underground. Eles ajudam bandas independentes a produzirem seus projetos e lançarem as faixas e EPs, o selo reúne diversas bandas, entre elas Chococorn and the Sugarcanes, Magnólia e, é claro, a terra vai se tornar um planeta inabitável. Foi pelo selo que a amizade de João e Caru se estreitou e permitiu que ele se aproximasse de artistas dos mais variados tipos.
“No selo existem artistas do Emo Caipira, Shoegaze, Rock Triste, entre outros. A união trouxe mais força, mais bandas e agora conquistamos mais espaço, fazemos de tudo para expandir a cena, as coisas estão fluindo e eu me impressiono com a nossa evolução. Esse mês tive três oportunidades de entrevista e fico feliz de ver esse desenvolvimento, é importante ter essa iniciativa de fazer e lançar, grava do jeito que consegue, lança do jeito que pode, o importante é não parar”.
Selo Quituts, conjunto que a terra vai se tornar um planeta inabitável integra, responsável pela produção e lançamento de diversos projetos da cena do underground (Foto: @seloquituts)
O grupo promete introduzir seus fãs a uma nova era. Em suas palavras: “Se desde o fim vocês estavam conosco! Está na hora de iniciar um novo começo!”. João demonstra muita animação para o futuro, ele se abre sobre as expectativas em relação aos novos projetos e a sua relação com o seu público e a busca para encontrar o melhor, tanto para a banda, como para os fãs e o que se pode esperar para a atvstupi em 2024.
“O começo de agora será muito amplo, estamos explorando diversas sonoridades para lançar um trabalho legal, estamos estudando bastante o que o pessoal gosta de ouvir e o que gostamos de fazer, para unir o melhor dos dois mundos. Estamos analisando o cenário para entender o que leva a galera a nos ouvir, um cenário que nos agrade e que desperte cada vez mais o interesse de quem nos ouve, claro que não dá para agradar todo mundo, mas conseguimos conquistar nosso espaço e cativar muita gente”.
João finaliza dizendo estar entusiasmado para explorar novos sons e possibilidades inéditas. De acordo com ele, esse novo começo é sobre abranger sonoridades que nunca foram exploradas, estudar formas diferentes de marketing, de lançar um conteúdo, de produzir, de fazer shows. Essa nova fase seria como o começo, pois eles se despedem de um momento que foi importante para a banda, sem essa caminhada, eles não teriam chegado até esse patamar. Zablonski finaliza ao dizer que pretendem trazer, além de uma nova sonoridade, uma nova estética, pois o foco é inovar a cada lançamento, então no novo disco serão apresentadas coisas diferentes, basicamente esse é o começo.
