Para além das causas ambientais, a moda sustentável incentiva o consumo consciente, a fim de melhorar não apenas as condições de trabalho na indústria têxtil como a saúde financeira de seus consumidores
Por Maria Eduarda Rocha

O Brasil está entre os 10 maiores consumidores de roupas e acessórios do mundo. Com a popularização do fast-fashion (moda rápida) e das plataformas digitais de venda, o consumo da indústria de moda vem crescendo cada vez mais, ocasionando uma maior demanda, o que acaba sobrecarregando o setor, que tem produzido cada vez mais e, consequentemente, descartado mais resíduos. Esse consumismo tem como malefício não apenas a poluição ao meio ambiente, como também, consequências sociais.
Atualmente, o mundo tem ansiado viver em uma velocidade maior, onde a população quer tudo de maneira praticamente instantânea, e a moda não escapa dessa aceleração. As pessoas parecem buscar por novidades diariamente, sempre ansiosas para renovarem seu guarda-roupas, e é por isso que modelos de negócios que produzem peças em grande escala, como o fast-fashion, têm feito tanto sucesso.
Porém, é importante entender o reflexo dos hábitos consumistas na sociedade em que vivemos. Trabalhadores da indústria têxtil têm vivido em situações precárias com carga horária extensa e salários baixos, bem como muitos consumidores têm tido dificuldades em se manterem por dentro das tendências, causando a sensação de não pertencimento, ou, endividando aqueles que se entregam à tentação de comprar peças novas constantemente.
Mesmo para essas pessoas que adquirem peças novas com frequência, é difícil acompanhar todas as novidades, já que toda semana algo novo é lançado e o que foi comprado anteriormente acaba ficando parado no armário.
“Com certeza já gastei mais do que deveria, e me arrependo sim, porque compro por achar linda, mas sempre acho mais de uma peça linda e acabo não usando todas”, conta Thais Jesus, estudante de recursos humanos de 37 anos que consome produtos de moda constantemente.

Além de seguir as tendências do momento, outra vantagem da moda rápida é o preço, que muitas vezes chama a atenção e parece vantajoso. Thais diz que gosta de consumir desse tipo de mercado porque dá para estar sempre renovando o visual com custo baixo e facilidade. “Não gosto de repetir o mesmo tipo de roupa por muito tempo. Além do bom valor e facilidade de obter em plataformas digitais”, explica a estudante.
Fora as consequências financeiras, trabalhistas e, muitas vezes, psicológicas do consumismo, existem as ambientais, principalmente quando se trata da indústria da moda, que é a segunda maior poluidora do mundo, ficando atrás somente da indústria alimentícia. Não apenas pelos resíduos têxteis descartados de forma incorreta, mas acredita-se também, que esse mercado seja responsável por 10% do gás carbônico emitido por toda a humanidade e pelo consumo de cerca de 4% da captação mundial de água.
Nesse aspecto, muitos representantes do mundo da moda tornaram-se ativistas sustentáveis, como por exemplo Vivienne Westwood, que criou campanhas em prol da proteção da floresta Amazônica e incentivava seus clientes a comprarem pouco, porém com qualidade para que a peça durasse, já que roupa não é um bem descartável.
Vivienne é apenas um exemplo, dentre outros desse universo, que reconheceram o impacto da moda no meio ambiente e na sociedade e passaram a defender uma moda mais sustentável e um consumo mais consciente.
Claro, até hoje estilistas e marcas que realmente se preocupam com esses fatores estão mais para exceção do que regra. Mas têm-se criado grupos, principalmente nas redes sociais, que disseminam informações relevantes para fazer a população pensar e dão dicas úteis para aqueles que se interessam em consumir de forma mais consciente.
Um exemplo é o Crisálida, em Bauru, grupo de artesanato têxtil que utiliza matéria prima sustentável e técnicas de upcycling para reformar e criar peças. A co-fundadora do grupo, Julia Yuri, que é também designer e artesã, afirma que a melhor peça para se comprar é aquela que já existe.
“A meu ver, a melhor peça de roupa que eu posso comprar é uma que já existe. Independente da customização que possa ser feita ali”, diz Julia.

A artesã também explica que existem diversas formas de ser sustentável, não apenas comprar de empresas que se preocupam com questões ambientais e sociais, como slow-fashions por exemplo, não comprar já é uma alternativa para ser mais sustentável.
“Não se deve ficar preso a uma única definição do que é ou não ‘ser sustentável’. Eu como consumidora tenho várias opções para praticar isso. Inclusive não praticar. Eu posso não comprar e isso já seria sustentável”, afirma Julia Yuri.
Ser um consumidor consciente vai na contramão do consumismo, mas não quer dizer que um consumidor consciente não possa renovar seu guarda-roupas de vez em quando, além das opções de slow-fashion, existem brechós, bazares, ateliês e outras práticas sustentáveis como fazer a própria roupa ou mandar para costureiras do bairro. Muitas pessoas, principalmente de regiões periféricas já praticam a moda sustentável sem perceberem.
“Minhas alunas de baixa renda acabam se dividindo entre as que já tem um pensamento sustentável, praticam reciclagem e upcycling por necessidade e não sabem, só não têm a consciência que isso é sustentável para o meio ambiente, não só para o bolso delas. E ‘daí’ tem as alunas que não fazem isso, mas eu acabo dando exemplos”, conta a designer sobre suas alunas no Crisálida em Bauru.
A moda consciente, acima de tudo, visa a valorização do trabalho e da vida humana. Ao aderir a esse estilo de consumo a pessoa contribui para o meio ambiente em que vive e promove a valorização do trabalhador que está sendo pago de maneira justa, já que em modelos de negócio fast-fashion existe muito a desvalorização dos produtores dessa indústria, como explica Yuri: “são muitas pessoas envolvidas que não pensamos estarem envolvidas nessa cadeia toda, e a realidade é que todas elas são desvalorizadas dentro dessa indústria consumista que é incentivada a cada semana ter uma vitrine nova, por exemplo”, explica a artesã.
Nesse anseio diário por novas peças, não apenas aqueles que trabalham na indústria são desvalorizados, mas o consumidor acaba desvalorizando o próprio dinheiro, ao comprar peças que não usará porque logo a tendência será outra.
“Além de nós mesmo como consumidoras que somos guiadas a consumir desta maneira né? Então você perceber que você foi levada a comprar algo só porque está na moda e ter a consciência que você desperdiçou seu suado dinheiro em algo que você vai usar uma vez”, reflete Julia Yuri.
A moda sustentável, tem como objetivo não somente diminuir o impacto da indústria têxtil no meio ambiente, embora seja um ponto muito importante, mas também de promover um consumo mais consciente que beneficiará toda a população, não compactuando com situações de trabalho análogos a escravidão e, ao mesmo tempo, diminuindo gastos desnecessários das pessoas que se tornam reféns de tendências pontuais do mundo da moda, o que contribui para vida financeira, psicológica e emocional de toda uma sociedade.
