por leonardo caetano
No último sábado (18), a Divisão de Bibliotecas Municipais de Bauru realizou a 1ª edição da Festa Cigana no Teatro Municipal, que teve como foco a comemoração do Dia Nacional do Povo Cigano, além de possibilitar o encontro da comunidade cigana e de outras etnias presentes na região.
O evento, que reuniu dezenas de ciganos, cartomantes, oraculistas, dançarinos e expositores, visava também trazer a discussão sobre a visibilidade desses povos nos dias de hoje e suas lutas por direitos e pelo fim do preconceito. Diversos poetas e músicos se apresentaram no teatro, celebrando o orgulho do povo cigano.

Para Valquíria, cigana e poetisa que participou como uma das expositoras da Festa Cigana, essa iniciativa tem um papel fundamental de desconstruir estereótipos e dar mais visibilidade aos povos ciganos, que frequentemente tem suas lutas e demandas apagadas pelos estigmas impostos pela sociedade.
“Fazer um evento que traz pessoas ciganas para falar sobre dados históricos traz maior visibilidade para essa questão, e possibilita falarmos sobre nossas lutas, nossas pautas. Se não houvesse um espaço para falar sobre esse tipo de coisa, muitos bauruenses continuariam a agir com ignorância em relação aos povos ciganos”, diz Valquíria.
A entrevistada também explicou um pouco sobre a origem de seu povo, seus costumes e como a população cigana está estabelecida em meio as tradições familiares.
“As pessoas estão acostumadas com uma glamourização muito intensa sobre os povos ciganos, como por exemplo o costume de usar saias arredondadas e outros acessórios, o que acaba servindo como uma maneira de negligenciar muitas de nossas culturas, tradições e outras formas de expressão”, afirmou.

Valquíria complementou: “No total existem cerca de 250 povos ciganos divididos em clãs e subclãs, e dentre eles existe muita diversidade e luta por resistência”.
À respeito da situação vivida pelos povos ciganos no Brasil atualmente, Valquíria relata que o Brasil se tornou um dos países mais acolhedores para o povo cigano nos últimos anos, ainda que muitas violências severamente persistam contra os ciganos e outras minorias.
“No Brasil, se comparado com alguns países da Europa, existe um acolhimento muito grande para os ciganos de forma geral, devido à ancestralidade presente nas comunidades indígenas por exemplo, o que gera um maior respeito para com as comunidades ciganas”, explicou.
Segundo Valquíria, a mortalidade dos povos ciganos em alguns países do continente europeu ainda é maior do que a mortalidade de pessoas negras e periféricas, que sofrem constantemente com a violência policial.
Contudo, como filha de pai cigano e mãe Gadji (caracterizada como não-cigana), Valquíria enfatiza as dificuldades de ser mulher, cigana e periférica na sociedade brasileira, que é tão marcada pelo machismo e pela desigualdade. “Ser cigana é resistir todos os dias para que a gente não morra”, completou.

O Dia Nacional do Povo Cigano foi instituído no Brasil pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2006. Na mesma data, é comemorado também o Dia da Padroeira dos Povos Ciganos, Santa Sara Kali.
Vanessa Garcia, que é diretora da Divisão das Bibliotecas Municipais de Bauru, argumentou que o evento feito pela Secretaria de Cultura, assim como a criação do Dia Nacional do Povo Cigano, são essenciais para quebrar os paradigmas e barreiras preconceituosas existentes nos dias atuais.
“Os povos ciganos são muito mais do que cores, dança e misticismo. O motivo desta ação é fazer com o que o público do evento saia com uma visão mais respeitosa e que abracem a causa desses povos e os ajudem a serem verdadeiramente inseridos, respeitados e valorizados”, disse Vanessa.
Ainda sobre o intuito da 1a edição da Festa Cigana, Vanessa reitera o propósito de promover maior visibilidade às artes ciganas e suas tradições por parte da organização do evento.
“Nós queremos dar voz aos povos ciganos que vivem em Bauru e região e apoiá-los em suas lutas para que políticas sociais sejam criadas, onde eles possam de fato se intitularem como ciganos e ciganas sem sofrerem vetos”, detalhou a diretora.

Vanessa explica ainda que “infelizmente o preconceito ainda é latente para essa população devido a séculos de histórias distorcidas sobre suas origens e modo de vida”, afirmando o desejo de mudar esse cenário por meio de medidas socio-interativas.
