Com queda na produção, cidade corre o risco de perder o título de capital paulista da fruta
Por Camila Possente

Abacaxi já foi o símbolo de Guaracaí (foto: Camila Possente)
Agricultores de Guaraçaí, no noroeste paulista, estão preocupados com o futuro do cultivo de abacaxi na região. O município de pouco mais de 7400 habitantes se destacou, nos anos 80 e 90, pelo cultivo de abacaxis havaiano e pérola.
A partir daí, moldou sua economia em torno do cultivo da fruta e se popularizou como “a cidade do abacaxi”. Em 2008, segundo dados da Associação de Produtores de Abacaxi do Município de Guaraçaí (APAMG), a produção chegou a ultrapassar 57 mil toneladas. Atualmente, entretanto, esse número caiu 60%, com o ano de 2023 registrando apenas 23 mil toneladas.
Shoji Korin, presidente da APAMG, indica o ano de 2012 como início do declínio da cultura de abacaxi guaraçaiense. Para ele, a principal causa para essa queda foi o aumento da concorrência externa e a dificuldade do agricultor local em manter um padrão de qualidade. “No início da década de 80 se comercializava abacaxi por meio da Cooperativa Agrícola de Cotia, e ela só aceitava a fruta se estivesse no ponto: madura e de qualidade. Com o decorrer do tempo, a produção aumentou e a comissão passou a ser por quilo. O produtor passou a não se preocupar mais com a qualidade, e a concorrência passou na frente”, explica.

Shoji Korin, presidente da APAMG (foto: Camila Possente)
Entretanto, os motivos que levam a essa queda significativa na produção são muitos. Antônio Fiumari, produtor de abacaxi desde 1992, diz que a falta de mão de obra, as mudanças climáticas e a falta de políticas públicas voltadas à agricultura familiar fizeram com que muitos pequenos agricultores abandonassem o cultivo da fruta.
“Usaram as mesmas políticas pra nós, que somos agricultura familiar, e pros grandões do latifúndio. Ao invés de o Ministério do Trabalho nos ajudar a nos adequar às normas, chegaram nos multando. As políticas públicas só prejudicam a gente, que é pequeno”.

Antônio Fiumari, um dos agricultores mais bem-sucedidos de Guaraçaí (foto: Camila Possente)
Reinaldo Viana Lima, atual motorista de caminhões de uma usina, foi produtor de abacaxi por 25 anos. A informalidade na compra e venda das frutas e a insegurança quanto ao pagamento foram fatores decisivos para que ele deixasse a lavoura. Além desses, Reinaldo também cita a alta nos preços de insumos agrícolas – adubos, venenos e defensivos, por exemplo –, que não foi acompanhada por um aumento do preço do abacaxi e tornou o cultivo da fruta mais difícil para os pequenos produtores.
A secretária da agricultura, Vivian Fiumari, concorda: “eu trabalho muito com o pequeno produtor, e ali, o abacaxi quase não chega. Cultivar abacaxi é caro demais para um assentado, é muito difícil. Eles são totalmente desassistidos”.
Outro fator é a ascensão da cana. “O que mais complicou o cultivo de abacaxi aqui é que os agricultores eram em maioria arrendatários, e a cana tomou as áreas todinhas. A cana é mais segura, mais rentável e mais produtiva para um arrendante”, conta Idalino Possente, que plantou abacaxi de 1992 até se aposentar, em 2010.
Atualmente, ele arrenda as terras de seu sítio para a produção de cana, e acredita que o alto custo de produção e o esgotamento das terras da região tornam impossível que a produção guaraçaiense compita com a de estados do norte e do nordeste.

Idalino Possente (foto: Camila Possente)
Mas nem tudo está perdido para o abacaxi de Guaraçaí. Vivian Fiumari conta que a prefeitura, em parceria com a APAMG, planeja instaurar um projeto de registro de Indicação Geográfica para atribuir reputação e agregar valor à fruta produzida na cidade.
Os agricultores que aceitarem participar do projeto, já implantado com sucesso nas fábricas de calçados em Birigui e no queijo da Serra da Canastra em Minas, terão seus produtos submetidos a um controle de qualidade para que recebam um selo de autenticidade. “Isso é para ajudar o produtor, é uma forma de agregar valor ao produto e deixar a cidade mais conhecida”, diz Vivian. “O projeto de Indicação Geográfica vai além do produtor: é também um trabalho de educação com os munícipes. Todo mundo precisa saber que Guaraçaí planta abacaxi e que o nosso abacaxi é diferenciado. Nós queremos que fique eternizado, ‘a terra do abacaxi’, e que não nos tirem esse título”.

Vivian Fiumari, secretária da agricultura (foto: Camila Possente)
