Proibição em escolas do romance de Jeferson Tenório, repercute nas redes sociais e faz aumentar vendas da obra
Por Mayara Brito do Nascimento

Jeferson Tenório, autor de O Avesso da Pele. Foto: Divulgação
Muito se fala sobre a censura de O Avesso da Pele, de Jeferson Tenório. O livro foi retirado das prateleiras de escolas dos estados do Rio Grande do Sul, Paraná e Goiás no começo de março deste ano.
Vencedora do Prêmio Jabuti de 2021, a obra denuncia a violência policial no contexto brasileiro e a sexualização de corpos negros, além de outros temas. É importante destacar também a relevância das redes sociais no impacto da notícia e no aumento das vendas, que subiram em mais de 1400%, tornando o romance o mais vendido do Brasil no mês de março.
A princípio, o livro tem sido perseguido pela censura desde sua publicação, em 2020. Porém, naquela época não houve uma campanha tão gritante como essa.
“O Avesso da Pele” ganhou destaque principalmente através da ação de jornalistas pretos no mercado editorial, como afirma Dayhara Martins, mestranda em Estudos Literários pela UEM, redatora publicitária e criadora de conteúdo sobre narrativas do horror negro, há mais de 14 anos trabalhando com a internet.
“Este movimento de falar especificamente sobre a censura nasceu de um grupo de pessoas que têm consciência do problema de censurar um livro e, principalmente, uma ciência do problema de silenciar pessoas pretas”, diz ela, que também fez uma análise das masculinidades negras e a simbologia da raça na própria obra de Tenório em sua tese de TCC.

Dayhara Martins, criadora de conteúdo literário (@dayharabooks). Foto: Divulgação/Mayara Brito.
Juliana Santini, professora do curso de Letras da Unesp de Araraquara e atuante na área de pesquisa sobre a narrativa brasileira contemporânea, afirma também que existe um discurso que supervaloriza temas como sexo e sexualidade, mas de forma que o distorce e apaga outras questões mais importantes.
“A tentativa de censura do livro está fundamentada na recusa da grande parte conservadora da sociedade brasileira em debater o modo como o racismo se constituiu, se constitui e se espraia nos diferentes níveis do cotidiano”, explica.

Juliana Santini, docente do curso de Letras da Unesp Araraquara. Foto: Divulgação/Leitores Vivos – UFMS
O impacto nas redes
Segundo informações da loja virtual Amazon, o romance se tornou o mais vendido do país em março de 2024, e muito disso se deu na divulgação em massa de criadores de conteúdo literário.
“Felizmente a gente chegou num período em que quando um livro é tirado ou censurado, chama muito mais a atenção e aí as buscas aumentam. [Antes] A gente não tinha uma comunicação tão rápida, e não tinha veículos de notícias que se preocupassem com uma apuração tão direta”, conta Dayhara.
Como criadora de conteúdo, Dayhara fala sobre o papel do influencer na divulgação da notícia. “Foi uma das poucas vezes que vi uma junção de pessoas trabalhando em coletivo de uma forma muito bonita”, afirma ela.

Dayhara em vídeo sobre a capa de O Avesso da Pele, que já conta com mais de 135 mil visualizações. Foto: Dayhara Martins/@dayharabooks.
A redatora acredita que a censura contribui para o apagamento social de pautas e obras como O Avesso da Pele, mas também argumenta que atualmente existem ainda outras formas de invisibilizar as narrativas de pessoas negras. “Nos tirando toda a humanidade e deixando apenas a raça”, aponta.
Dayhara enfatiza ainda a cobrança e o comprometimento por mais diversidade e por mais publicações de autores nacionais e não brancos. “[Esquecemos que] Editoras ainda são empresas, o objeto livro faz parte de um mercado e ainda é uma mercadoria”, destaca.
