Grupo composto por sambistas da cidade desenvolve repertório de músicas que valorizam cultura ancestral e negritude 

Por Isabela Paulino Assis

 Prestes a completar dez anos de atuação no cenário de Bauru, o Coletivo Samba trabalha com o objetivo de manter vivo o samba raiz, sua cultura ancestral e negritude. O “Encontro dos Sambistas” é o principal evento promovido pelo grupo. Nele, 15 sambistas tocam por 4 horas instrumentos de percussão e cantam, simultaneamente, músicas que marcam a história do ritmo e recuperam o ideal do grupo de manter a ancestralidade por meio da música. 

“Essa forma de respeitar o que veio antes, respeitar os mais velhos, respeitar as tradições e valorizar a nossa negritude é o que permeia nosso trabalho”, afirma Ivo Fernandes, presidente do coletivo.

 O grupo foi criado em março de 2014, com a proposta de trazer para a cidade esse reconhecimento cultural do samba e o protagonismo preto em espaços culturais. “A ancestralidade nesse tipo de samba está totalmente ligada no discurso que é colocado dentro das rodas de samba. Músicas que falam da nossa autoestima, da nossa negritude, da nossa comunhão como povo preto, tudo isso está inserido em muitas dessas músicas que são cantadas na roda de samba” diz Ivo. “O samba sempre foi um ato de dizer ‘olha, nós existimos e nós estamos aqui’”, ressalta o sambista. 

 Ainda que os ritmos de origem afro-brasileira já estivessem sendo popularizados no final do século XIX, os historiadores marcam o surgimento do samba em 1916, com a canção “Pelo Telefone” de Donga e Mauro de Almeida. O ritmo ganhou ainda mais espaço com a criação das escolas de samba na década de 1920. Os encontros de sambistas, que aconteciam nos terreiros onde os negros moravam no Rio de Janeiro, marcaram o nascimento do samba. 

 Ivo comenta como ao longo da história deste gênero, e ainda hoje, a influência do mercado tenta “afastar essa matriz cultural”. “Sambas com temas ligados mais a casais, ao romantismo… eu sinto que há uma tentativa de afastar o samba dessas religiões de matriz africana”.

  Muitas rodas de samba eram realizadas em terreiros de religiões de matriz africana. A Casa da Tia Ciata, no Rio de Janeiro, marca a história do samba quando abria suas portas para o encontro dos sambistas, mas também para o culto dos orixás. 

  “As células rítmicas do samba, muitas delas são ligadas às religiões de matriz africana, como o Ijexá” , comenta Ivo. 

Música e religião

 Os instrumentos de percussão utilizados para as rodas de samba também são reflexos dessa ligação com as religiões afro-brasileiras, além do vínculo histórico com a presença dos povos escravizados no país. “O atabaque, esses instrumentos mais africanos vieram para o Brasil. Os negros que vieram para o país usavam muito, tanto quando eles estavam tristes ou quando estavam alegres”, diz Janaína Lima, professora de música e participante da religião de matriz africana.

 Atabaque e Agogô são os mais comuns tanto em roda de samba quanto em terreiros. São instrumentos utilizados em casas de religiões de matriz africana e há toques musicais em comum com o samba. Ivo Fernandes fala sobre um dos sambistas que faz uso das percussões em seus enredos. “Almir Guineto comunga muito com as batidas que são feitas nos terreiros de umbanda, de candomblé e bebe muito dessa água de ancestralidade”.

  Janaína comenta ainda sobre como as artes ancestrais são trabalhadas dentro dessas casas de religiões afro-brasileiras. “Das religiosidades que temos, como a umbanda, o candomblé, quimbanda, são trabalhadas dentro da sua originalidade. Mas ainda com presença da sincretização, dos orixás com os santos, que há no Brasil”.

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