Por Samara Meneses
Os limites da liberdade de imprensa para jornalistas mulheres
Ainda em 2022, de acordo com a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), as agressões contra jornalistas – principalmente mulheres – cresceram 23%. O Brasil, que ocupa o 92° lugar, entre 180 países, no Ranking Mundial de Liberdade de Imprensa do RSF (Repórteres sem Fronteiras) não é considerado seguro por muitos jornalistas.
A jornalista Agnes Sofia Guimarães, acredita que os profissionais que tendem a abordar temas sensíveis com recorte de gênero, raça e segurança pública são mais propensos a sofrerem algum tipo de ataque que desmereça a profissão. “São casos em que você vê mais perseguição, tanto à imprensa quanto aos defensores. Nós tivemos uma guinada conservadora nos últimos anos, que foi muito acelerada pelo modo que a extrema direita se apropriou das redes sociais, nós ficamos quatro anos em um governo que oficialmente descredibilizava o trabalho do jornalista”, explica.
Recentemente a jornalista Schirlei Alves, foi sentenciada a cerca de um ano de reclusão em regime aberto e R$400 mil de indenizações por difamação, após a publicação da matéria sobre o julgamento da influencer Mariana Ferrer, pelo The Intercept Brasil. No material publicado a jornalista fez uso do termo inédito, “estupro culposo”, que gerou grande repercussão nas redes sociais.
De acordo com o advogado e consultor jurídico Arthur Biscotto, a decisão judicial não representa um ataque direto aos jornalistas, mas sim se houve ou não um desvio ético da jornalista quanto à imagem dos profissionais envolvidos no caso. Ele compreende que “cabe ao judiciário interpretar as questões éticas envolvendo a profissão”.
Em nota, a Abraji destacou ser “incompreensível que Schirlei seja condenada à prisão e a pagar uma vultosa indenização, incompatível com sua renda e patrimônio – num montante que nem mesmo grandes veículos de comunicação suportariam”. Ainda ressaltou a esperança de que o Poder Judiciário reverta as decisões tomadas, e reconheça a importância das mulheres jornalistas e da liberdade de imprensa.
“Acredito que a questão de gênero, no caso, é a pauta trabalhada por Schirlei, que mexe com pessoas poderosas”, afirma Agnes. Ela frisa também questões de gênero e raça que envolvem a jornalista. “Mesmo que ela não seja lida como tal, em muitos espaços, não podemos deixar de racializar o ponto, pensando que quando uma condenação dessas é acatada outras pessoas negras, principalmente mulheres, vão ser penalizadas em dobro”, explica.
Segundo uma pesquisa, de 2022, realizada pela Gênero e Número em parceria com os Repórteres sem Fronteiras, 92,5% dos jornalistas – em sua maioria mulheres – afirmaram que o fenômeno da desinformação é “muito grave” e que afeta o trabalho que realizam. Em 55% dos casos, afeta o trabalho diariamente, a vida profissional (55%) e a vida pessoal (45%).
“Temos jornalistas lésbicas, que são ameaçadas de estupro corretivo. Há uma questão moral, em que colocam as mulheres, que mexem diretamente com a figura pessoal delas”, afirma Agnes. Ela ainda ressalta que os jornalistas investigativos “já estão sob risco há muito tempo”, principalmente quando trabalham com pautas mais conservadoras.
Muitos profissionais continuam afirmando enfrentar, cada vez, mais um mercado precarizado, onde não se sentem protegidos. “A única coisa que a classe jornalística pode fazer agora é fortalecer seus direitos trabalhistas. A Schirlei, por exemplo, só está nessa situação porque não teve direitos sobre isso”, aponta Agnes.
