Sophia Coleta e Vinicius Moraes, da Associação Bauruense de Desportes Aquáticos (ABDA), são nomes de destaque da nova geração de atletas brasileiros
Por Carlos Staff
“O que eu quero é conseguir ir o mais longe que eu puder como atleta e saber que fiz tudo o que podia para alcançar aquilo, mesmo que um dia eu não seja olímpica”. A fala é de Sophia Ferreira Coleta, de 18 anos, atleta que já carrega em sua bagagem experiências marcantes nas águas. Bronze no Mundial Júnior de Natação, ela é natural de Bauru e viveu na cidade até o começo desse ano, quando se mudou para Michigan, nos Estados Unidos, para estudar e competir. Mas seus vínculos com a sua cidade natal permanecem: Sophia ainda representa a ABDA, lugar onde iniciou sua jornada como atleta.
Ela começou a nadar desde muito pequena, com o objetivo inicial de aprender natação e tratar suas crises respiratórias frequentes. Aos 9 anos, o pai de Sophia sugeriu que ela começasse a participar de competições, por meio de um projeto novo da ABDA. A nadadora conta que, no início, não estava muito convencida com a proposta, mas mudou de ideia ao saber que os atletas participantes receberiam lanche de graça – revelou aos risos.
Logo no seu primeiro treino, já se enturmou com as outras crianças, e entrou de vez para o mundo das águas.

Além de Sophia, outro nome de destaque na ABDA é Vinícius Moraes Costa, de 17 anos. No atletismo, tem um currículo recheado de conquistas nas pistas e é o número 1 no ranking brasileiro sub-18 nos 800m. Campeão mundial escolar em setembro no Rio de Janeiro, com um tempo de 1min57seg, ele também é natural de Bauru e conheceu a ABDA através de um projeto social. Dentro das várias opções de esportes oferecidas por esse projeto, o atletismo foi o que mais o encantou. “O atletismo entrou na minha vida na forma de um projeto social que tem perto aqui da minha casa, que é o Sítio Santa Cândida. Todo ano eles escolhiam um esporte: judô, atletismo, natação, essas coisas, sabe? Aí veio o atletismo e eu quis entrar. ”, contou Vinicius. Ele destaca que, depois de alguns meses na associação e bastante treino, decidiu competir, primeiro em corridas de rua e depois nas pistas.

Marcas
Vinícius já foi campeão brasileiro em duas categorias (sub-16 e sub-18), campeão ibero-americano e mais recentemente, campeão mundial escolar, além de outros excelentes resultados. Mas para as medalhas estarem em seu peito, muitos obstáculos precisaram ser superados. Algumas provas, especialmente, ficarão marcadas em sua memória.
A primeira é o Brasileiro Sub-16 de 2021 em Cascavel (PR). Em meio a um temporal, Vinícius se sagrou campeão e ficou com a medalha de ouro nos 300m com barreiras com uma marca de 38seg17. Não bastasse o tempo fechado, qualquer resultado diferente de medalha poderia colocar o atletismo em risco para ele. “Antes de ir para lá, eu tinha colocado na minha cabeça que se eu não fosse medalhista, não fosse bolsista nesse campeonato – que daria uma bolsa em dinheiro – eu teria que parar com o atletismo por conta de muita cobrança em casa. A mãe pedindo para ajudar, tinha tudo para dar errado, mas chegou na hora e deu tudo certo”, explicou o atleta.
Já no Sul-Americano Sub-18 de 2022, realizado em São Paulo, Vinicius ficou com a medalha de prata nos 800m, com um tempo de 1min52seg91. Um dia antes da prova, ele passou mal e teve que ir “no sacrifício” para a corrida. Com muita febre e dores no corpo, chegou a conversar com um médico e a tomar medicações, mas o diagnóstico é de que demoraria alguns dias até que ficasse melhor. “[Na hora da prova] melhorei e consegui dar o meu melhor na pista e me sagrei vice-campeão brasileiro no sul-americano, e isso pra mim foi o auge. Sensação incrível“, relatou o corredor.
Já para Sophia, dentre todas as suas medalhas nos diversos campeonatos de categorias de base que disputou, a mais especial foi a de bronze conquistada no revezamento 4×100 livre no Mundial Júnior de Natação em 2022, em Lima, no Peru. Com um tempo de 3min50s13, essa foi a primeira medalha do Brasil nesse tipo de nado, além também de representar a primeira medalha mundial conquistada por um atleta da ABDA.
“Foi uma experiência muito diferente de tudo que eu já participei. […] Era outro nível de natação, atletas do mundo todo. Você aprende tanto, porque vai com os técnicos da seleção. Então você conversa com eles, você conversa com atletas de outros países e é muito legal” , explicou a nadadora.
Formação
Atual treinador de paranatação da equipe da ABDA, Cadu Lanças já foi atleta da associação. Ele destaca que o trabalho como treinador vai além do acompanhamento técnico. “A gente tem muito esse lado humano no trabalho. A gente fala que antes do atleta, da criança, da pessoa, enfim, ser um atleta existe um ser humano. O atleta vai ser consequência de um bom ser humano. Se ele vai ser ou não um atleta de alto rendimento, se vai pegar uma medalha em um campeonato brasileiro, se vai para uma seleção brasileira, isso é uma consequência do trabalho educacional que a gente faz aqui dentro”, disse Cadu.
Sophia comenta como a natação tem sido um lugar de ensinamento em sua vida, para além das piscinas. “Eu acho que o esporte pede da gente muita dedicação e compromisso. Sem o esporte na minha vida, especialmente a natação – que é o que eu pratico mesmo – não acho que, por exemplo, eu seria a mesma aluna que eu sou, não teria a mesma responsabilidade que tenho com as minhas coisas. Eu acho que seria uma pessoa completamente diferente se não tivesse a natação na minha vida”, afirma.
Desafios
Vinícius e Sophia destacam alguns desafios enfrentados por atletas no Brasil, como a falta de visibilidade e investimento em esportes como atletismo e natação, comparado especialmente ao futebol. “É complicado. Não tem muita visibilidade. Porque às vezes tem lá uma pessoa que já ganhou muito título e chega uma pessoa do futebol e ganha um campeonato, que é de um nível mais baixo, e o pessoal dá mais credibilidade por conta de ser o futebol e não o atletismo. Mas eu não ligo muito pra isso. Eu cada vez mais treino pra colocar meu nome na história, mesmo sendo o país do futebol”, afirmou Vinícius.
Neto Gonçalves, ex-atleta e atualmente treinador de atletismo na ABDA, destaca que o Brasil poderia avançar na configuração do esporte priorizando a formação de jovens atletas. “O esporte no Brasil atua muito em clubes, acho que teria que estar dentro das escolas e ter mais competições escolares porque a gente tem uma população muito grande, tem muitos talentos. Muitas crianças poderiam se aproveitar do esporte para mudar de vida, não somente financeiramente, mas pegando os valores que agregam às pessoas”, comentou Neto.
Inspiração
Após a conquista no Mundial em Lima, Sophia foi recepcionada com festa pelas crianças na ABDA e recebeu diversas homenagens, tendo sua pegada eternizada na Calçada da Fama da associação. Ela conta que esse foi um momento muito especial. “Eu acho que as crianças terem feito vários cartazes e terem me recepcionado quando eu cheguei foi muito gratificante, foi muito gostoso. Porque eu lembro que, quando eu entrei na ABDA, ainda não tinha tanta gente. Não é igual hoje, que tem 5 mil atletas. Eu lembro que eu via os mais velhos, independente do resultado deles, eu olhava para eles. Então um dia eu fui as crianças que olhavam os mais velhos. ”, relatou.
Vinícius também é muito querido pelos mais jovens e busca sempre ajudá-los com dicas, assim como é inspirado por atletas de categorias adultas da ABDA no dia a dia. Ele comenta como é receber esse carinho e também compreende as responsabilidades envolvidas, ao ser exemplo para as crianças. “Eu fico ligeiro no que eu vou falar, nas atitudes que eu tenho, no que eu vou fazer dentro da ABDA. Porque qualquer coisa que eu faça, as crianças mais novas vão querer fazer também. Se eu tiver fazendo uma coisa errada, vão querer fazer também. Então eu presto muita atenção nisso”, afirmou.
