Cibercultura mudou as formas de relacionamento e também as maneiras de articulação política entre os indivíduos
Por Letícia Hasman
Legenda: As tecnologias vêm avançando para além dos limites da internet, redefinindo relações interpessoais.
Com a ascensão da cibercultura, pudemos perceber o quanto as mídias digitais fazem parte do cotidiano das pessoas, oferecendo possibilidades ilimitadas de comunicação. Elas mudaram as formas de relacionamento, como também as maneiras de articulação política entre os indivíduos, em função dos meios que democratizaram a produção e a propagação de conteúdo, possibilitando ao ser-cibernético atingir incisivamente alguns grupos sociais. Para além do uso despretensioso da Internet, as novas mídias, por vezes, permitem dominar esse coletivo de forma impositiva e tirana, principalmente quando se utiliza de artifícios ilusórios.
As eleições presidenciais brasileiras de 2018 tornaram nítido que não é apenas em regimes autoritários que o Estado atua diretamente no mundo virtual. Em governos democráticos, como no Brasil, há atores políticos que tentam, e conseguem, produzir sua própria bolha de seguidores dentro das redes sociais, seja financiando influenciadores, seja construindo plataformas de inserção social, cuja narrativa atende ao desejo ideológico desse oficial político. O ex-presidente Jair Bolsonaro, eleito em 2018, é exemplo da potencialidade das redes de desempenharem um papel significativo no rumo das eleições.
Desde de 2016, Bolsonaro vêm atuando massivamente em suas redes sociais digitais. Beneficiando-se da onda de pessimismo da sociedade perante a política, ele utilizou da capacidade da Inteligência Artificial de influenciar a sociedade civil e a opinião pública. O chamado “discurso de 140 caracteres” e o uso das fake news como estratégia de reafirmação ideológica foram fundamentais para a estratégia de Bolsonaro na tentativa de manipulação do debate.
Danosa para a democracia enquanto distorcer o debate democrático, a I.A. passou a ser usada com viés partidário por autocratas, demagogos e populistas a fim de automatizar o processo de tomada de decisão política, podendo acarretar em resultados tendenciosos e no abuso de poder.
Na ausência proposital de conscientização da população, muitos têm sido seduzidos pelos algoritmos, passando a aceitar como verdade aquilo que disseminam. Todavia é incoerente não considerar que quando as pessoas buscam informação política, frequentemente não estão procurando a verdade ou o esclarecimento mútuo, muito menos a cooperação de terceiros para entender a complexidade do mundo real. Na verdade, elas buscam confirmar os estereótipos das quais são responsáveis e reforçar os seus pré-conceitos.
É, portanto, chegada a hora de refletir sobre o futuro da democracia, bem como da tecnologia digital, que está prestes a dar mais um novo e radical salto. A fábrica de debates políticos democráticos precisa assegurar que a natural liberdade de expressão se sobreponha e molde a inteligência artificial, e não o inverso. Para isso, se mostra necessário impor limites e, sobretudo, responsabilidades aos que comandam a geração de conteúdo na Internet, de modo a garantir a livre decisão de um eleitor autêntico.
Ao invés de nos deleitar com a facilidade de autenticar juízos de valores por meio das redes sociais, temos de nos movimentar para usar a inteligência natural a favor da democracia com o intuito de enfrentar o obscurantismo artificial movido pelas novas formas de autoritarismo.
