Será que é realmente essa minha numeração? Será que eu preciso emagrecer?
Por Letícia Rocha
(Comprar roupas deixou de ser um momento prazeroso. Reprodução: Vestindo Autoestima)
Prêt-à-porter é uma expressão histórica que significa “pronto para vestir”. Desenvolvido pelo estilista francês J.C. Well, no final de 1949, após o final da Segunda Guerra Mundial, o novo conceito foi responsável pela difusão da moda e a adequação dela aos consumidores. O termo se refere àquelas roupas confeccionadas a partir de tamanhos e moldes personalizados, facilitando e barateando a produção, já que possibilita o consumo logo após o final do processo produtivo.
Com a ascensão do mercado da moda, o “pronto para vestir” segue sendo a principal tendência quando o assunto são as lojas de departamento e fast fashions, o que cada vez mais se torna uma preocupação para diversas mulheres, afinal, os tamanhos escolhidos para os moldes padrão em meados da década de 1950 já não se enquadra mais aos obtidos hoje em dia, contribuindo para que a indústria têxtil torne-se uma grande causadora de transtornos de imagem, falta de autoestima e casos depressivos.
“Eu sempre pego três ou quatro tamanhos diferentes de uma mesma calça para provar e geralmente nunca levo o que realmente visto para casa, são sempre um ou dois números a mais”, afirmou a jornalista e especialista em moda e beleza, Júlia Ribeiro.
Apesar da falta de padronização dos modelos de roupa ser um tema antigo, o debate sobre a modelagem sempre está à tona na sociedade, já que ela é o principal obstáculo no momento de compras, principalmente na vida de mulheres Mid e Plus Size. Camila Oliveira conta que sempre enfrenta dificuldades quando deseja adquirir novas peças. Ela afirma ser uma missão “desgastante e cansativa”, já que nunca encontra em uma única loja algo que realmente lhe sirva, sempre há a necessidade de visitar vários estabelecimentos para obter resultados que “nem sempre agradam, somente servem”.
Apesar de haver um esforço realizado por instituições privadas, tais como ABNT e Senai/Cetiqt – Associação Brasileira de Normas Técnicas e Escola Profissionalizante/Centro de desenvolvimento profissional para a indústria têxtil, respectivamente – para a criação de uma padronização nacional, seguindo como base o corpo curvilíneo brasileiro, o impasse criado impossibilita tal desenvolvimento, devido à multiplicidade étnica da população.
Em um levantamento feito pela própria ABNT contou com a participação de cerca de 7 mil mulheres do Brasil. Obteve-se a partir dele que 76% delas têm um corpo, cujo ombros, cintura e quadril estão alinhados. Porém, o formato mais vendido atualmente pelas lojas é o ideal para vestir um corpo com a cintura fina e quadris mais largos, popularmente conhecido como “violão”, destacando uma despreocupação para atender de fato às necessidades das brasileiras.
“Acho que temos um problema muito grande no mercado atual que é a numeração, porque muitas vezes fica justo no quadril/bumbum e largo na cintura. Eu tenho duas calças idênticas (de mesmo modelo) da Zara nos números 42 e 46 e ambas servem da mesma forma, então não dá para entender o que acontece com as roupas atualmente”, destaca Júlia.
A jornalista ainda afirma que, devido essas oscilações que acontecem com os tamanhos do setor feminino, muitas de suas amigas passaram a comprar calças, especificamente nas lojas da Zara, no espaço destinado aos homens.
Uma simples etiqueta é capaz de mudar totalmente a visão de uma mulher sobre seu próprio corpo, despertando inúmeros sentimentos de angústias, problemas relacionados à aceitação e até a submissão das mulheres aos procedimentos mais improváveis na tentativa de “emagrecer para caber em determinada roupa de determinada marca”, como, por exemplo, a saia de cintura baixa para mulheres magras da Miu Miu.
“Acredito que tudo aquilo que está ligado ao nosso corpo afeta muito a nossa autoestima e não seria diferente com roupas. É um saco você ir em lojas de departamento, tipo Renner e C & A, e experimentar uma calça da numeração que você geralmente usa, jurando que é 54, e ela simplesmente não te servir, sendo que deveria ser sua numeração. Geralmente só encontro minhas roupas em sessão plus size, que é uma partezinha que, primeiramente, não é encontrada em todas as lojas de departamento. Mas também, quando a localizamos, são geralmente três araras com umas roupas que quase ninguém tem coragem de usar”, relata Jordana Bento.
A jornalista Júlia Ribeiro se considera totalmente contra essas divisões existentes nas lojas, para ela “todas as peças deveriam funcionar para todos os corpos e acho ainda que elas deveriam estar expostas juntas sempre, sem esse espírito de divisão”. Ela ainda destaca com relevância a alternativa adotada por Khloe Kardashian em sua marca, a Good American, que busca produzir todos os tamanhos possíveis e impossíveis, atendendo a todos os tipos de corpos. O destaque para a marca norte-americana se dá pelo fato de que ela não é repassada a qualquer revendedor, Khloe comercializa seus produtos somente aos que irão adquirir a grade inteira dos produtos em todos os tamanhos e os exibirão em um único lugar, sem a categorização por setores.
Para que esse sistema seja mudado, existe um longo caminho a ser percorrido, mas cabe ao público alterar a forma como se consome moda, além de dar voz de fato ao problema, utilizando grandes fontes de influência, como portais, revistas e criadoras de conteúdo para abordar a importância de se incluir todas as mulheres e seus vários corpos, conforme o sugerido pela jornalista e criadora de conteúdos Júlia Ribeiro.
