O jornalismo precisa construir novos imaginários sobre os povos indígenas

Por Amanda de Oliveira

A construção de narrativas sobre os povos através da mídia. Foto: Conselho Indígena Missionário/ Divulgação.

Nós jornalistas temos uma grande força em mãos, o nosso trabalho até é chamado de o “quarto poder”. É realmente muito poderoso você apresentar algo à alguém. Imagine como é para os pais com seus filhos pequenos, tudo é novidade. Os filhos são marcados pelos ensinamentos dos seus pais. O que é certo ou errado não foi descoberto, foi apresentado e aceito, até que se construa suas próprias opiniões de acordo com suas vivências – o que pode nem vir a acontecer.

Mas o que tem a ver criar filhos com o trabalho jornalístico? Na minha opinião um ponto bem específico. Somos nós quem levamos para casa das pessoas informações sobre quaisquer assuntos, de quaisquer lugares, que eles podem nem conhecer. E é a partir das nossas informações que as pessoas descobrem sobre novas coisas muita das vezes – não quero ser pretensiosa achando que todo mundo descobre tudo somente por jornais, porque não é verdade.

Pouco antes, falei que noticiamos sobre quaisquer assuntos. Mas eu mesma discordo dessa sentença. Não noticiamos sobre quaisquer assuntos, e isso é perigoso. Há um monte de pautas invisibilizadas, onde a realidade das pessoas não é mostrada para o resto do mundo. Noticiamos aquilo que está na agenda, o que parece ser “o mais importante” para todo público. Mas a agenda falha em deixar de fora muitas questões. Aqui, neste ensaio, falo especificamente da questão indígena. O que e como se fala sobre os povos do Brasil?

Primeiro, não se fala. Segundo, se fala erroneamente. Eu me aproximei da questão indígena através de um projeto em que eu participei e fiz pesquisas, falo deste lugar. Mas meu lugar poderia ser outro, poderia desconhecer a pauta, saber que existe e não muito mais. O jornalismo sobre os povos indígenas está mudando, é verdade, mas ainda há uma gama de erros que são cometidos.

Precisamos entender que durante séculos os povos indígenas sofreram com diversas mazelas projetadas pelo próprio Estado. Não vou me prolongar e citar todas porque começam lá atrás, quando suas terras foram invadidas e exploradas. Aqui tratarei um pouco da comunicação sobre os povos, que é influenciada pela história. Durante os anos foi construída uma visão errônea sobre os indígenas. Nos livros didáticos, por exemplo, lemos somente os nomes dos povos “Guarani e Tupi”, como se todos os outros não existissem, quando, na verdade, hoje no Brasil, são mais de 305 povos indígenas.

E o jornalismo por vezes reforça esta ideia. Na faculdade foram apresentados vários erros cometidos em jornais, que acabam por reforçar estereótipos e retroceder os conhecimentos sobre os povos.

O jornalismo, por vezes, constrói a ideia que todos os povos são iguais, que possuem as mesmas tradições e opiniões. O jornalismo, por vezes, reforça a ideia de “pessoas atrasadas”. O jornalismo, por vezes, não busca como fonte uma liderança indígena, busca um antropólogo branco. O jornalismo, por vezes, fala da questão indígena somente quando acontece uma violência. O jornalismo, por vezes, se posiciona contrário a pautas de retomada de território e garantem que é uma invasão. O jornalismo, por muitas vezes, usa termos errados, como índio.

Tudo isso poderia construir em mim um imaginário bastante pejorativo sobre os indígenas. Me pego imaginando como deve ser para os povos se verem representados de uma maneira tão errada, com sua realidade distorcida de tal forma que você nem a reconhece, não conseguindo ver a sua luta e a beleza do seu povo retratados na mídia.

Por fim, para concluir meus pensamentos e trazer uma visão mais esperançosa, acredito que o jornalismo está se transformando sobre esta pauta, e poderemos construir novos imaginários (mais respeitosos e reais) sobre os povos indígenas. Ajudá-los (não como tutelagem, mas sim, parceria) a reivindicar suas pautas. Acredito sim no papel transformador do jornalismo, em seu ato de apresentar as realidades e cobrar mudanças. Acredito no poder do jornalismo. Agora é hora de aprendermos cada dia mais a usá-lo.

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