Por Flávia Gracinda

Uma vez tentei correr com o tempo, esqueci que ele tem o próprio ritmo e que eu tenho o meu, ainda que utilize do tempo do relógio para fazer as marcações diárias, e o do calendário para as temporais.

Nessa de correr, lembro de uma vez que decidi desacelerar e foi quando a avistei em meio ao que considerei como um grande nada. Nesse dia, quando desviei os olhos do automático, avistei uma árvore em um terreno, ela era gigante, um pouco inclinada para o chão, uma das mais bonitas que já vi, apesar de não estar totalmente coberta com suas folhas, seus galhos ainda a deixavam bela e não havia dúvidas que estava saudável.

Depois disso, quando passava por aquele caminho, a observava. Cheguei a acreditar que logo a tirariam dali, porque o tempo continuava correndo e não havia folhas nela, e as que tinham era possível contar nos dedos.

Tempos depois, abraçada pelo automático novamente, parei para respirar e ao olhar para frente, se não fosse por ainda estar no meio de uma grande nada, não a reconheceria. As folhas, que eram pouquíssimas, se tornaram milhares espalhadas por tudo quanto é canto a ponto de cobrir quase que por completo o tronco da árvore.

Se eu fosse falar de estações, diria que ela viveu duas, ainda que saiba da existência das quatro e que por um descuido não tenha visto ela vivendo todas elas. Todavia, quem me dera o tempo das estações do ano ser o mesmo tempo das estações da vida, digo pelo modo em que seria possível saber o começo e o fim delas, mas isso também seria ilusório, visto que esse desejo parte da ideia de só pular algumas estações.

Ilusão achar que essa árvore viveu apenas duas estações, uma vez que apenas elas não seriam suficientes para mantê-la em pé. É no outono que começam as mudanças, é o momento em que elas se despedem das folhas que não podem mais carregar. 

Maverick, personagem de Uma Rosa no Concreto, de Angie Thomas, certamente diria que o outono é o tempo da poda: “Podar quer dizer tirar tudo de que ela não precisa: galhos muito finos, mortos ou podres”.

No inverno, tempo de quietude para muitos, elas se mantêm vivas retirando água do subsolo através de suas raízes mais profundas. Quando chega a primavera, é tempo de deixar as folhas crescerem e na chegada do verão nascerem os frutos.

Da mesma forma que a árvore e a natureza num todo, a vida tem suas estações que por vezes é difícil compreender por não seguir o tempo do calendário. Contudo, é no outono que começam as mudanças, é o momento em que elas deixam ir o que precisam. No inverno, é o tempo da quietude, de se recolher, ficar perto daqueles que nos lembram do que é realmente necessário, é o período em que nos recolhemos para ver os próximos passos. Na primavera, é quando vemos o resultado do momento de introspecção do inverno, depois de olhar para dentro, é possível escolher qual semente será plantada e até o verão vê-la crescer e dar frutos.

Quem me dera que no tempo do calendário, ao mudar de estação, as minhas mudassem também. Ou que ao mudar o tempo do relógio, o meu mudasse também, menos os mais felizes – esses poderiam durar a eternidade.

Entretanto, não é assim. Tem o cronos – a rotina do dia a dia -, o kairós – o tempo oportuno, aquilo que diriam de “lugar certo, na hora certa” – e o nosso próprio tempo, o tempo de todas as coisas. Viver cada estação é o que traz o equilíbrio necessário, essencial para a vida.

Mas ainda sabendo disso tudo, às vezes, ainda penso: quem me dera poder correr com o tempo.

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