A segregação é frequentemente feita através da violência e isso foi trazido a tona no dia 28 de maio durante a Virada Cultural da Cidade de São Paulo quando o professor e palestrante, Thiago Torres, conhecido como Chavoso da USP foi mais uma vítima de violência policial. No ocorrido, o jovem de periferia, junto de seu amigo, foi vítima de socos, chutes e xingamentos em uma ação que repercutiu nas redes sociais sendo que até mesmo o artista Emicida se pronunciou. Ao mesmo tempo o governador da cidade de São Paulo, criticado por Thiago, clamou pela ação da segurança no evento.
A segregação pela violência
Por Pedro Santos

Além da construção da infraestrutura urbana, a violência policial também desempenha um papel significativo na segregação socioespacial. A segurança é feita para as classes dominantes que ditam os valores que instruem as forças policiais. Estas, por sua vez, mostram-se cada vez mais militarizadas mantendo sua tradição de isolar as elites em seus palacetes enquanto expulsam a população mais pobre das áreas de interesse.
Para exemplificar isso podemos ver mostras da violência cometida pelas organizações policiais. Sejam as 225 milhões de abordagens feitas pela Polícia militar no Estado de São Paulo nos últimos 17 anos em que as pessoas negras foram abordadas 4,5 vezes mais, como sugere o Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD). Dado que ressalta a ideia de que o fluxo de certas pessoas é limitado.
Um caso que demonstra a dinâmica é o ocorrido com o professor e palestrante Thiago Torres, conhecido como Chavoso da USP. No ocorrido o jovem negro de periferia abordado de forma violenta junto de seu colega sendo alvo de insultos, socos e chutes sendo que não é vítima de maiores violências pois gravou parte do ocorrido e pessoas ao redor trouxeram a tona sua visibilidade. O militante ainda relata como o evento é causado por descriminação e que o motivo de sua abordagem, uso de maconha, não gerou enquadros para pessoas de classes mais altas e com perfis étnicos diferentes. Ainda afirmando em suas redes sociais “Estado democrático de direito”, minha lenda urbana preferida,” fazendo referência à descriminação e como o acesso à cultura e lazer é restrito para muitos.
Há, ainda, as operações violentas e discriminatórias deferidas contra a população em situação de rua no Centro de São Paulo no mês de Abril de 2023 que mostram o pouco desinteresse do Estado nas pessoas em situação de extrema pobreza e na população usuária de drogas. Grupos que estão nos níveis mais baixos de poder sobre como a cidade se organiza e sobre como eles se desenvolvem mudando a cidade, exercendo seu direito à cidade, termo do sociólogo David Harvey.
Neste meio conflituoso, existem diferentes forças com diferentes intenções em transformar o espaço público, buscando torná-lo mais lucrativo ou mais acessível, mais exclusivo ou mais inclusivo.
Há de se destacar o papel do Estado como um organizador, a ação do capital privado que contribui para a especulação imobiliária e para a segregação socioespacial tendo forças para coagir o Estado a contribuir com seus objetivos, como afirma o especialista.
Além destes, existe a importância dos movimentos sociais e lutas, que reivindicam o direito à cidade e o acesso à ela. Grupos como o MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) que lutam para a utilização do espaço urbano para a população, em especial os lugares já existentes e sem função social, circundados de infraestrutura já construída.
Estes diversos grupos não operam de forma unida e concisa em grande parte do tempo. Há conflitos de interesses e diferentes objetivos que se estabelecem entre eles. São estes conflitos que formam as cidades, os embates entre as diferentes forças e suas resistências.
Uma localidade que frequentemente entra em pauta entre estas forças é a região do Centro de São Paulo. Esta região é hoje marcada a ferro quente por apresentar extrema pobreza e problemas sociais que se alastram pelas ruas. Todavia, essa área também concentra alta infraestrutura, concentração de comércio e de empregos e não apresenta uma vacância imobiliária extremamente ruim.
Há o interesse de se higienizar as ruas limpando-as do que é dito sujo pelos agentes privados para assim lucrar através da especulação imobiliária. Existem forças de resistência que advogam que o acesso ao Centro deve ser de todos de forma democrática. Enquanto isso, há o Estado que se submete às forças do capital privado como afirma o artigo “Drogas, urbanismo militar e gentrificação: o caso da “Cracolândia” paulistana”” de Augusto Jobim do Amaral Andrey Henrique Andreolla.
O governo tenta regular estas questões através dos planos diretores e outros métodos que buscam definir através de um acordo entre as diferentes vozes no conflito como a cidade deve se desenvolver. Esforço que é frequentemente frustrado como visto pelos debates a respeito da definição do novo plano diretor da cidade de São Paulo.
Assim, os problemas permanecem e as pessoas mais pobres são as mais afetadas. Com o aumento dos aluguéis e, por exemplo, com a não valorização dos salários mediante a crescente inflação, as pessoas de menor renda são forçadas a viverem nas regiões das periferias. Assim surgem as favelas que apresentam os menores custos de vida por também serem as áreas que apresentam menos recursos.
Este é um processo que não cessa, tanto que, o termo hiperperiferia tem sido usado para designar as regiões com as características das favelas, só que construídas em períodos mais recentes indicando a continuidade do processo de inacessibilidade à cidade. Ainda, essas regiões mostram-se mais distantes dos centros do que as mais antigas favelas e apresentam os problemas das comunidades muitas vezes mais acentuados.
Assim, com a segregação a céu aberto, as cidades crescem cada vez mais. Com a expulsão das pessoas dos centros, das zonas de interesse até as extremidades da cidade de forma irregular, descontrolada sem seguir planos, construindo um espaço sem integração adequada e sem acesso à cidade e sua infraestrutura. Desta forma, se desenvolve a negação à vida, ao direito à cidade e o acesso a ela.
