
Convidada como imprensa para a 76ª edição do Festival de Cannes, Fabiana Lima é fã de carteirinha da sétima arte e tudo que a engloba (Foto: arquivo pessoal)
Por Guilherme Machado Leal
A popularização do streaming, a partir do investimento da Netflix em produções originais no ano de 2013, contribuiu para o crescimento da discussão acerca do declínio do cinema. Após 10 anos, o embate entre essas duas frentes tornou-se ainda mais acirrado: com a pandemia do Coronavírus, a situação em que o cinema se encontrava antes do período se mostrou ainda mais agravante, já que os streamings oferecem a possibilidade de ter no conforto da casa do espectador um vasto número de filmes e séries.
Além disso, no ano de 2020, serviços de streaming, como o Disney+, ofereceram aos seus usuários a opção do Premier Acess, que consistia na compra do filme dentro da própria plataforma na semana do seu lançamento nos cinemas. Para diretores renomados, como Christopher Nolan (trilogia Batman), a ascensão do streaming é um problema: o público, ao ter a opção de ver uma obra de uma forma mais acessível, opta por não ir ao cinema, o que atrapalha o trabalho do diretor.
Nessa perspectiva, a crítica de cinema Fabia Lima valida o sentimento de Nolan em relação a essa questão. “Os diretores têm o pensamento de que o filme é voltado para o cinema. O idealizador geralmente tem uma ideia do que ele quer com aquele filme. A tela de cinema é o lugar que mais transmite a qualidade do trabalho do diretor”.
No entanto, há um motivo para que tal preferência exista, visto que o ato de ir ao cinema é algo destinado aos mais afortunados. Pelo alto preço dos ingressos e dos alimentos encontrados no local, as pessoas tendem a selecionar criteriosamente os filmes que elas verão no cinema.
Para Fabiana, a falta de acesso à democratização do cinema é um empecilho. “O cinema no Brasil é muito caro. Não só o cinema, como tudo relacionado a ele. É uma arte muito complicada de acessar”. Analisando a história pela qual o cinema passou, ela ainda vai mais a fundo: “o cinema já morreu várias vezes e essa questão do streaming é mais uma morte do cinema”.
A princípio, não é definitivo o atestado dado ao cinema, uma vez que essa arte já se adaptou às diferentes mudanças da indústria, como o surgimento da televisão e do rádio. Nessa lógica, a criadora do portal de notícias sobre cultura pop Cinemafilia diz que não acredita que o cinema enquanto local vá acabar por causa dos streamings. “Acho que vai mudar a forma como se faz cinema”. Para ela, o streaming tem um valor significativo, mas que é equitativo quando comparado ao cinema. “Eu acredito que o streaming veio para democratizar a arte, mas isso não anula o fato de que nós precisamos que o público vá ao cinema”.
Ainda que o confronto entre o streaming e o cinema seja reconhecido por todos, existe a possibilidade de ambos coexistirem, caso se adaptem aos moldes da indústria e da forma como o público recebe e consome esses conteúdos.
Para Fabiana, a combinação entre eles é o combo perfeito. “Se a pessoa não conseguir ir ao cinema, depois o filme vai para o streaming. Isso é uma forma de equilibrar [a relação entre cinema e streaming]”. E não só para o público geral, como também para os críticos culturais, a escolha de ver um filme no cinema ou em casa é previamente pensada. “Como o cinema é muito caro, eu tenho que fazer uma seleção e pensar nos filmes que eu quero ver”, afirma Fabiana.
É inegável que o cinema é uma arte que precisa ser mantida. Entretanto, seguindo a lógica mercadológica do sistema capitalista, é perceptível que o capital é colocado acima da produção cinematográfica, como aponta Fabiana: “A gente acaba vendo [o cinema] como um produto do entretenimento e esquece que existe uma arte por trás daquilo [a arte de fazer cinema]”.
Além do mais, essa lógica não é exclusiva do cinema, dado que as empresas que comandam os serviços de streaming também possuem o lucro como o seu principal objetivo. Mas, o que diferencia a relação desses dois meios com a indústria é a novidade: o streaming é recente e flexível aos gostos do seu público-alvo, algo que para Fabiana é positivo.
“O streaming vem para mudar a nossa percepção em relação ao consumo”. A discussão formada a partir desse embate não está longe de acabar, mas espera-se que, em breve, o cinema e o streaming consigam extrair de melhor o que ambos podem oferecer ao espectador.
