Os recentes ataques armados e ameaças de agressão nas escolas brasileiras em março e abril de 2023 abrem o ano letivo com o alarme da população acerca da violência escolar. Nas últimas semanas, alunos de todo o país faltaram às aulas devido ao medo constante de atentados. Dos 23 ataques mapeados desde o ano de 2002, mais da metade ocorreu apenas nos últimos dois anos. Devido a esse aumento, professores e estudiosos da área de ciências sociais questionam quanto à relação entre a violência e a flexibilização das políticas armamentistas.

Por Isabela Giro e Livia Ruela

Jair Bolsonaro no desfile cívico-militar do 7 de Setembro de 2022 (Reprodução: Antonio Cruz/Agência Brasil)

“Políticas do governo anterior mobilizaram a flexibilização da posse de armas, promovendo uma crescente demanda de armamento nas mãos de ‘marginais’. Portanto, o crescente ataque às escolas, possui, sim, relação com as políticas armamentistas”, afirma Ariana Segantin, pós-graduada em Direito Penal e professora de língua portuguesa em Americana.

Em janeiro deste ano, o programa Fantástico levou ao ar uma reportagem mostrando de que modo armas registradas como CACs eram desviadas para o crime organizado no Rio de Janeiro. Isso foi viabilizado devido ao aumento do limite de armas permitido por registro. Segundo dados apurados pelo site de notícias G1, nos quatro anos de governo Bolsonaro foram realizados 901.858 novos cadastros para a aquisição de armas no país. Cerca de 47% desses ocorreram apenas em 2022, ano eleitoral.

CACs é a sigla utilizada para designar caçadores, atiradores e colecionadores, cuja atividade é regulamentada pelo Exército e não pela polícia federal, como em demais casos de posse.

A advogada explica também que “todo o ódio lançado pelo antigo governo contra o sistema educacional, mais precisamente ao corpo docente, está presente nesses ataques cruéis e nefastos de violência da atualidade”.

Advogada Ariana Segantin, entrevistada sobre a flexibilização da posse de armas.

O crescimento da procura de armas foi impulsionado pelo discurso armamentista do ex-presidente Bolsonaro, cujos mais de 40 decretos assinados desde 2019 foram responsáveis por flexibilizar a posse, venda e circulação de armas no país.

Entre as mudanças realizadas pelo seu governo, destaca-se o aumento do prazo para a entrega de documentos como antecedentes criminais e testes de tiro e psicológico, que agora podem se estender em até 10 anos. O então presidente também reduziu o orçamento do Exército para a fiscalização de compra e venda de armas.

Além disso, foi permitido a CACs o deslocamento de armas com munição durante o trajeto entre o local de guarda e o de uso, viabilizando, na prática, o porte legal para essa modalidade.

Por esse motivo, observou-se um salto vertiginoso no número de pessoas com registro de CACs no Brasil: 117,5 mil em 2018, durante o governo Temer, tornaram-se 673,8 mil até o fim do mandato de Bolsonaro.

Atualmente, a legislação brasileira permite a posse de armas por civis mediante a uma licença, a qual necessita, entre outras condições, da justificativa de posse para defesa pessoal ou fins colecionáveis. O porte, por outro lado, é proibido em todo o território nacional para o cidadão comum, sendo restrito apenas a agentes de segurança pública, policiais, membros das Forças Armadas e agentes de segurança privada.

Enquanto a posse possibilita somente a aquisição legal de armas de fogo, o porte autoriza o deslocamento dessas do seu local de armazenamento.

Para Ariana Segantin, a solução é restringir e fiscalizar as armas que estão em circulação. Assim como, dificultar a aquisição de novas. “Apesar de muitos advogados brasileiros serem a favor da posse de armas, eu, como advogada, não adiro à posse e a flexibilização”.

Em seu primeiro dia no cargo, o presidente Lula assinou decretos que revogam a política armamentista de Bolsonaro, de forma a suspender novos registros de armas no país e exigir um prazo de 60 dias para o recadastramento de CACs. A medida busca ampliar o rastreamento das armas no território brasileiro.

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