As novas tendências da moda não binária 

Por Samara Meneses

Homens de terno, mulheres de vestido, meninas de rosa e meninos de azul. Desde quando as peças que vestimos performam nossos gêneros?  A binaridade de gênero dita quais são os elementos, atitudes e posturas que podem determinar e separar a sociedade entre o “masculino” e o “feminino”. Os desafios à moda de gênero são uma pauta antiga, sendo inicialmente, levantados pelo movimento feminista no final do século XIX, e a partir disso por diversos movimentos de direitos sociais LGBTQIAP+. 

A moda nunca foi reclusa e inadaptável. Mesmo que inserida em um sistema, predominantemente, branco, hétero e cisgênero, o setor é conhecido por quebrar e ultrapassar padrões, como Jean Paul Gaultier –  estilistisa francês conhecido por seu tom crítico as normas de gênero –  apresentando pela primeira vez homens de saias nas passarelas, em 1985. Segundo ele, “um homem não leva a masculinidade na roupa, sua virilidade está na mente, não acredito que tecidos tenham gênero”. 

Leticia Yonashiro, artista de gênero fluído de 19 anos, acredita que “A moda sem gênero é o caminho. Roupas, acessórios, maquiagens são apenas objetos que complementam a nossa individualidade. Usar uma saia não me faz mais mulher, usar uma calça não me faz mais homem”. 

As normas de gênero dividem opiniões e afetam, inclusive, o segmento infantil, predeterminando cores, detalhes e estilos que são considerados “apropriados”. De acordo  com a criadora de conteúdo digital  Alex Silva – também conhecida por Kisha Kota – “ o uso das cores é muito relativo e cultural, mas seguindo essa premissa de cor de menino e de menina, há o impedimento da criança de ser livre para experimentar, limitando-a à coisas muito específicas”.

Kisha é uma pessoa não-binária de 26 anos, ilustradora, diretora criativa e social media. Acredita que a distinção de gênero é algo limitante que prejudica o autoconhecimento dos indivíduos na moda, “toda roupa é não-binária para uma pessoa não-binária, seja ela dita feminina ou masculina, eu vou dar o cunho dessa roupa. Eu gosto de mesclar muito essas estéticas, por exemplo, passar muita maquiagem mas manter meu bigode e minha barba, transparecendo essa dualidade de gêneros.”

Kisha Kota via seu Instagram

Os principais desafios sobre a moda para a comunidade LGBTQIAP+

“Os empecilhos encontrados pelas pessoas LGBTQIAP+ na moda não destoam de problemas que nos cercam em outras áreas da vida. Somos negligenciades, ignorades e silenciades.”, afirma Letícia. 

O influencer LGBT Nick Nagari disse em entrevista para a Revista Capricho, que  associar a moda não binária exclusivamente a “neutralidade” é uma visão totalmente errônea e estigmatizada, que acaba sendo repassada dentro da própria comunidade. “É como se a gente reivindicasse aquilo e não permitisse que outras pessoas usassem”, ressalta Kisha.

Recentemente Sam Smith, artista musical não binário, sofreu ataques de ódio por suas roupas extravagantes e fluidas. Kisha Kota destaca que “sendo uma pessoa preta periférica, não binária, sinto pavor de limitar alguém. Acho que o melhor da moda é você usar algo que se sinta bonito e bem”.

YouTube/ Sam Smith

A moda e a maquiagem como uma ferramenta de expressão social

“Através da sensação de pertencimento, a moda consegue empoderar qualquer grupo social e político”, diz Letícia Yonashiro. 

Já para Kisha a moda e a maquiagem são meios importantes para que as pessoas ao seu redor  enxerguem sua própria individualidade, “por elas você consegue expressar mudanças, que começam devagar, seja usando um blush, uma peruca ou um lápis de olho. Quando você está do jeito que é e gosta, as pessoas percebem e começam a mudar seu próprio imaginário.”

“Aqui onde moro, em Campo Limpo,  faço questão de me verem, pois é muito bom conhecer o lugar que você mora, mas é melhor ainda quando esse lugar te reconhece, mostrando para as  pessoas como é ter um modo de vida diferente, não melhor ou pior, mas diferente”, completa Kisha. 

O impacto da Moda 

Como pessoa preta, LGBT, e periférica Kisha descreve seu processo de estilo próprio, que a fez perceber como a moda estava mais presente em sua vida do que jamais imaginou, “eu sempre usei o desenho para me expressar, conforme fui crescendo e me entendendo como uma pessoa não binária, comecei a perceber que eu mesma poderia ser a minha expressão visual”. 

Para Letícia, a moda é um caminho que exige paciência. “Respeitar o seu tempo é necessário, e acho que isso é o que nós precisamos compreender no geral. Se você apenas respeitar a sua individualidade, as coisas virão com mais fluidez e na sua hora certa.”. 

Possuir referências e se manter atualizado quanto ao que gosta, é na visão de Kisha essencial para se conhecer e entender como se expressar, “seja no cabelo, maquiagem ou roupa, tudo isso te leva para um lugar em que se sinta bem com você mesmo, visualmente e mentalmente”, finaliza a influencer. 

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