Por Juliana Allevato
Em 2022, o Brasil ouviu pela primeira vez na sua história um jogo de futebol narrado
por uma mulher. A jornalista que concretizou esse feito foi Renata Silveira.
A primeira edição da Copa do Mundo foi em 1930. Apesar disso, as mulheres ficaram
excluídas de praticamente todas as funções que tinham relação com o esporte. De jogadoras a
jornalistas, a figura feminina foi sempre ignorada no esporte. Mais recentemente, de forma
silenciosa, a mulher tem conquistado lugares importantes nesse meio.
A primeira aparição de uma mulher na condição de jornalista aconteceu em 1947 e
quem marcou presença foi a jornalista Maria Helena Rangel. Ela foi contratada pelo jornal
Gazeta Esportiva naquele ano e seguiu na profissão por cerca de cinco anos. Mas vale
ressaltar que Mary Zilda Grassia Sereno, em 1934, já tirava fotos de esporte.
A Federação Paulista de Futebol reconhece Germana Garilli como a primeira repórter
feminina profissional a cobrir futebol no campo – ela chegou a ter a sua própria coluna, “A
Bola é Dela”. Germana participou da iniciativa da Rádio Mulher, que, durante um período,
teve uma equipe esportiva formada exclusivamente por mulheres.
A partir dos anos 1990, surgem alguns nomes mais conhecidos atualmente, como
Mylena, Ciribelli, Glenda Kozlowski e Renata Fan, que foram pioneiras também. Apesar
disso, é muito recente a ampliação de figuras femininas no jornalismo esportivo.
Mesmo depois dessas conquistas, as mulheres que desejam se especializar em
jornalismo esportivo ainda enfrentam muitos desafios.
De acordo com Érika Alfaro de Araújo, jornalista e doutoranda no Programa no
Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Unesp, que atualmente realiza pesquisa
com foco no jornalismo esportivo e suas relações com a questão de gênero, eles são
provenientes de barreiras sociais, culturais e históricas.
“Os tratamentos, as oportunidades e as vivências de homens e mulheres foram e ainda
são assimétricos, tanto em aspectos econômicos quanto midiáticos, estruturais e simbólicos
quando o assunto é o futebol”, explica.
Os desafios também são enfrentados pela receptividade dos telespectadores. Se de um
lado, a narração de Renata Silveira foi muito elogiada, inclusive pelos próprios colegas de
trabalho, por outro, ela foi bastante criticada pelos telespectadores que acompanham o
futebol.
Para Érika, essa resistência está relacionada ao cenário de dominação masculina, que
foi construído historicamente no campo esportivo. “No decorrer do tempo, diversos discursos
e atitudes machistas e misóginas foram reproduzidos para afastar a mulher do esporte – o
futebol feminino foi proibido por lei no Brasil, médicos afirmaram que a modalidade seria
prejudicial à saúde da mulher. Além disso, retratos sexualizados estamparam jornais e
revistas, entre outras tantas questões”.
Um protesto notável em relação a isso aconteceu em 2018, quando aproximadamente
50 mulheres jornalistas iniciaram um manifesto nas redes sociais – #DeixaElaTrabalhar” – que denunciaram episódios de assédio e desrespeito que foram sofridos por profissionais que
trabalhavam em coberturas esportivas.
De lá pra cá, jornalistas desse meio ainda são alvo de episódios semelhantes e ainda
não são a maioria no jornalismo esportivo. Entre outras coisas, a presença feminina no
jornalismo esportivo é muito importante para a representatividade. “A representatividade é
essencial para que o esporte se torne um campo mais justo e igual”, comenta a doutoranda em
comunicação.
Ela ainda acrescenta que “a representatividade é capaz de oferecer inspirações e criar
modelos, é capaz de incentivar crianças e adolescentes a buscarem carreiras no esporte pela
identificação. Podemos dizer também que colabora com a naturalização da associação entre
ideias”.
