BRUNO SILVA
Como o Home Office passou de peça essencial para as empresas e empregados durante a pandemia, para uma polêmica que envolve o mundo dos Bilionários
Uma polêmica que envolve opiniões distintas entre os homens mais ricos do mundo sobre o Home Office tem intrigado muitos sobre até onde pode ser viável o uso de tal tecnologia para um mundo que carrega as sequelas de uma pandemia devastadora.
Bill Gates já previa uma nova pandemia logo após o mundo ter evitado uma epidemia em escala global do Ebola em 2014. Para Gates, essa pandemia seria apenas uma questão de tempo e poderia ser causada, seja por um desenvolvimento natural de novas pestes ou mesmo por terroristas fazendo uso de armas biológicas para provocar o caos no planeta. Foi o que disse o fundador da Microsoft no Ted Talks do Youtube em pleno 2015.
Já este ano, após passarmos pelos grandes males deste vírus que se mostrou ser mais traiçoeiro que um simples Cavalo de Tróia, Gates afirma que podemos fazer da Covid-19 a última pandemia, e como uma das armas mais efetivas desenvolvidas pelos seres humanos está o trabalhar de casa ou trabalho remoto, mais conhecido no país como Home Office.
É mais do que óbvio que durante este fatídico episódio que a raça humana enfrentou se fez necessário o uso da tecnologia por razões de segurança como aglomerações em locais de trabalho.
Mas a grande questão do momento é: em um mundo onde não está acontecendo a pandemia, o trabalho remoto pode vir a ser empregado em quais setores? Isso sem que haja diminuição da produção ou que não traga efeitos colaterais para uma sociedade há muito sedentária ou desconectada de si mesma.
Elon Musk, homem mais rico do mundo, fundador da SpaceX, tratou de jogar mais lenha nessa fogueira, enviando um e-mail – que tem como título “Para ser bem claro”– para colaboradores de outra propriedade que lhe pertence, a Tesla. No conteúdo está “Todos na Tesla são obrigados a passar um mínimo de 40 horas no escritório por semana. Além disso, o escritório deve ser onde seus colegas reais estão localizados, não algum pseudo escritório remoto. Se você não aparecer, vamos supor que você renunciou”.
Então, o que de fato deve-se escolher? A visão do homem que tornou possível a democratização do computador com seu sistema operacional não tão primoroso, mas eficiente, ou, do homem que tem por ambição conquistar algumas “peças” do universo interplanetário?
Pesquisa realizada pela Pulses em 2020 no auge da pandemia relata que 78% dos que trabalham via remoto se sentem mais produtivos, e a previsão é de que neste fim de pandemia o trabalho remoto cresça cerca de 30%, segundo estudo do professor André Miceli da FGV, em 2020.
Conversamos com profissionais de áreas distintas para saber como eles vêem esta relação entre tecnologia e produtividade.
A professora e pedagoga Josiane Amaral explica que “alunos de escolas particulares que foram alfabetizados na pandemia, via remoto, não foram bem letrados. Eles fazem aulas particulares comigo para repor esta lacuna de aprendizado que herdaram das aulas on-line”.
Quando perguntada sobre quais os pontos negativos e positivos que obteve desta experiência inédita na sua carreira, Josiane responde que “o impacto negativo foi que me tornei uma pessoa mais ansiosa devido ao distanciamento das pessoas, e o positivo foi a descoberta da ferramenta Classroom que é muito eficaz, não apenas para uma situação de pandemia”.
Ela explica também que uma aula presencial nunca pode ser substituída pela aula a distância. “O ensino é totalmente diferenciado, é possível acompanhar as habilidades e dificuldades dos alunos de perto. No formato a distância são familiares que respondem muitas vezes no lugar do aluno, quando não são respostas de Internet,” continua. Ela diz tam bém que “no remoto, os pais querem entrar em contato com os professores a qualquer momento, até de madrugada. Com a volta do presencial agora temos as reuniões para podermos passar o feedback para eles”.
Conversando com um programador de computadores, Joás Alves, que atua de forma remota para uma empresa sediada na cidade de São Paulo, morando em Uberlândia, Minas Gerais, tem-se um outro ponto de vista quanto às mudanças causadas entre pandemia e um mundo mais normal do que o de outrora.
“Na minha área de atuação já existia essa condição de trabalhar via remoto, então foi uma felicidade quando consegui este trabalho até mesmo antes da pandemia”, diz Joás Alves. Ele conta que pôde viajar para o Nordeste e outras regiões do país que sempre teve vontade de visitar e compara as diferenças financeiras entre o remoto e o in loco.
“Tem muito mais benefício do que malefício, só o gasto diário de ir e voltar para o trabalho e o próprio estresse que o trânsito proporciona é uma prova disso”. Embora julgue ver uma maior qualidade de vida, ele pondera quanto à diminuição do trabalho por si só.
“Muitas vezes, ao saberem que você está de Home Office, os clientes acabam por querer ajuda em um horário fora do expediente, logo você acaba vez ou outra, trabalhando muito mais do que seria em um expediente in loco”.
Quanto ao entendimento de qual dos bilionários pode estar de fato com a razão, Joás concorda com ambos. “Tenho muita admiração pelo Elon Musk, um visionário que tem projetos que vão trazer benefícios para a humanidade, e concordo com sua idéia, pois dependendo das atribuições do colaborador que estiver via remoto, porque algumas funções não possuem as melhores ferramentas para desempenhar o seu trabalho da melhor forma possível, dos próprios colaboradores, alguns podem ter uma maior produtividade dentro da empresa do que no seu próprio lar”.
E concorda também com Bill Gates quando o assunto é sobre a substituição do tempo de vida social do trabalho para uma vida de com mais tempo de se passar com seus pares e comunidade. “Sem dúvida que o tempo que você deixar de passar socializando no ambiente de trabalho, você irá compensar fora dele, pois é como dizem: o homem não é uma ilha”.
O contato e o calor humano para uns pode ser mais essencial nas suas atividades do que para outros. Ferramentas são necessárias para execução de tarefas, muitas vezes não existirão ferramentas que se adequem com o trabalho remoto, já em outros casos será necessário.
O que se esquece nessa polêmica não é que Bill Gates ou Elon Musk pensam sobre esta modalidade de trabalho, mas é esquecido talvez a grande questão que não foi sequer mencionada por ambos os bilionários e que deveria definir de fato os rumos dessa polêmica: qual o interesse do público? Se o cliente concordar todos podem ter razão e o “homem da casa” será apenas mais uma polêmica vazia.
